No dia 5 de abril, a empresa Gastrading Comercializadora de Energia S.A protocolou o Estudo de Impacto Ambiental na Cetesb, órgão responsável pelo licenciamento ambiental. O empreendimento poderá impactar Terras Indígenas e Unidades de Conservação localizadas no litoral de São Paulo, em região da Mata atlântica.
Por Bianca Pyl, CPI-SP
O licenciamento ambiental do Projeto Atlântico Energia avança e preocupa os índios, organizações indigenistas e ambientalistas. “Fomos pegos de surpresa, essa bomba estourou agora, a gente não sabe ao certo o que está acontecendo. Estamos muito preocupados”, afirma Lilian Gomes, liderança da Terra Indígena Piaçaguera, localizada no Município de Peruíbe, a quatro quilômetros da área onde a Gastrading pretende construir uma usina termelétrica.
O Projeto Atlântico Energia da Gastrading Comercializadora de Energia S.A prevê a implantação de uma usina termelétrica e de um terminal marítimo para recebimento de gás natural ambos em Peruíbe. Está planejada também a construção de gasodutos e linha de transmissão que cortarão o litoral sul de São Paulo, chegando até a região de Santos e Cubatão.
Dados obtidos junto aos órgãos de licenciamento ambiental indicam que o empreendimento terá impactos sobre terras indígenas e unidades de conservação federais e estaduais. O coordenador da regional Litoral Sudeste da Funai, Cristiano Hutter, confirma os riscos “o estrago vai ser de São Vicente até Peruíbe, pegando todas as terras indígenas da região”.
Os ambientalistas também se preocupam. “Trata-se de um empreendimento gigantesco em uma área ambiental extremamente sensível” afirma Plínio Melo, presidente da organização Mongue Proteção ao Sistema Costeiro.
Imagem aérea dos limites da Terra Indígena Piaçaguera (Foto: Carlos Penteado/CPI-SP)
Falta de informação preocupa os índios
O processo de licenciamento ambiental foi aberto em 2016 e a Funai em Brasília já foi comunicada sobre o empreendimento. No entanto, até o momento, para os índios não houve comunicação oficial, como alerta Lilian Gomes da TI Piaçaguera. “Nunca fomos oficialmente informados de nada, só soubemos via imprensa, tem várias ONGs alertando sobre os problemas e o impacto. Não sabíamos dessa dimensão toda de uma termelétrica, aí vimos que é bem preocupante pelo impacto ambiental, estamos apreensivos pelas nossas comunidades e terras”.
Para Otávio Penteado, assessor de programas da Comissão Pró-Índio de São Paulo a falta de esclarecimentos é preocupante. “O diálogo com os índios já deveria ter sido iniciado. Esperamos que agora, com a protocolização do EIA/Rima, a Funai proceda à avaliação dos impactos para as terras indígenas e que os índios sejam propriamente informados e consultados sobre o prosseguimento do processo, seguindo as regras da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho”.
Catarina Delfina, cacique da aldeia Piaçaguera expressa sua preocupação com os possíveis impactos. “A gente está preocupada, todo mundo está, porque a tubulação vai passar por baixo, dá doença, é um perigo com a saúde de todo mundo. Estamos pedindo para Nhandareu que não aconteça, mas não dá para saber”.
Segundo avaliação de Cristiano Hutter da Funai, o complexo deverá impactar as Terras Indígenas Piaçaguera e Bananal (Peruíbe), Paranapuã (São Vicente), Tekóa Mirim (Praia Grande), Itaóca e Aguapeú (Mongaguá), Rio Branco e Tanguará (Itanhaém). O Ibama também cita possíveis impactos à TI Tenondé Porã (São Paulo, São Bernardo do Campo, São Vicente e Mongaguá).
Ambientalistas alertam para os impactos socioambientais
A área de impacto do empreendimento também abarca diversas unidades de conservação municipais, estaduais e federais: Parque Municipal Piaçabuçu; Parque Estadual da Serra do Mar, Parque Estadual Xixová-Japuí; Área de Proteção Ambiental Marinha do Litoral Centro; Estação Ecológica Juréia Itatins, Estação Ecológica do Tupiniquins; Refúgio de Vida Silvestre das Ilhas Abrigo e Guararitama, Área de Relevante Interesse Ecológico das Ilhas Queimada Grande e Queimada Pequena; e Área de Proteção Ambiental Cananéia-Iguape-Peruíbe.
Ambientalistas da região alertam para os impactos do empreendimento. Plínio Melo avalia que “a emissão de gases formadores do efeito estufa em uma atividade contínua com previsão de funcionamento de 24 horas diárias trará efeitos nocivos ao meio ambiente e às populações indígenas que vivem na área diretamente afetada”. E ressalta o presidente da ONG “que os dois bairros mais populosos e carentes de Peruíbe (Caraguava e Vila Erminda) sofrerão danos irreversíveis com a poluição aumentando”.
O diretor executivo da Ong Ecosurf, João Malavolta, complementa: “avaliamos empreendimentos dessa natureza como involutivos. Os principais cientistas da comunidade internacional já manifestam que o modelo de desenvolvimento energético deve ser substituído imediatamente por fontes de energia limpa, sobretudo renováveis”.
A sociedade civil da região está se mobilizando para pressionar que o projeto não seja implementado. “Cerca de 40 organizações ambientalistas, coletivos e movimentos sociais de atuação local e nacional, subscrevem uma carta que pede o cancelamento imediato do empreendimento”.
O projeto não trará desenvolvimento para a região, de acordo com a avaliação de João Malavolta. “Exemplos não faltam no Brasil de projetos que são anunciados como oportunidade de desenvolvimento e que na verdade levam estragos muitas vezes irremediáveis para os locais onde são implantados. Basta analisar o caso de Belo Monte, a cidade de Cubatão, que tem um dos maiores PIB do país devido ao seu pólo industrial e ainda possui inúmeros bolsões de pobreza”.
Licenciamento Ambiental iniciado
O processo de licenciamento ambiental está sob a responsabilidade da Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb), vinculada à Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo. O Ibama firmou termo de compromisso com o órgão estadual e delegou a ele a responsabilidade pelo licenciamento.
Com a protocolização do EIA/Rima, a Cetesb deverá avaliar os impactos detalhados no relatório e marcar audiência pública para discussão do empreendimento com a população.
Já a Funai deverá emitir parecer favorável ou contrário à instalação de todo o complexo na região além de realizar a consulta livre, prévia e informada. A sede do órgão indigenista confirmou à CPI-SP que que aguardava o acesso ao EIA/RIMA para dar encaminhamento a avaliação. “No que diz respeito à atuação da Funai, há o receio de que o recente corte nos quadros do seu setor de licenciamento comprometa as possibilidades do órgão acompanhar adequadamente o processo ”, pontua Otavio Penteado, se referindo ao decreto de Michel Temer que extinguiu diversos cargos na Funai, principalmente, na área de análise de licenciamentos ambientais de obras que afetam Terras Indígenas.
O Ministério Público Estadual de São Paulo, por meio do Grupo de Atuação Especial de Defesa do Meio Ambiente (Gaema) da Baixada Santista, em março de 2017, abriu Inquérito Civil para acompanhar o processo de licenciamento do empreendimento.
O empreendimento
O empreendimento da empresa Gastrading Comercializadora de Energia S.A., do Grupo Leros conhecido como “Projeto Atlântico Energias” é composto por diversas estruturas. A usina termelétrica, com capacidade de produzir 1.700 MW, é a principal instalação do complexo. Localizada em Peruíbe, a usina será abastecida por gás natural que ficará estocado em um terminal marítimo a cerca de 10 quilômetros da costa do mesmo município.
O gás será transportado à usina através de um gasoduto marítimo e terrestre. A energia produzida será escoada por uma linha de transmissão até a Subestação Baixada Santista e ligará a termelétrica ao Sistema Interligado Nacional. Com 90 quilômetros de extensão, a linha atravessará sete municípios da Baixada Santista: Peruíbe, Itanhaém, Mongaguá, Praia Grande, São Vicente, Santos e Cubatão. Segundo informações do Relatório de Impacto Ambiental do empreendimento, a energia produzida será fornecida para as nove cidades da região da Baixada Santista.
Além de abastecer a termelétrica, o gás natural estocado no terminal marítimo também será comercializado pela empresa. Está prevista a construção de um gasoduto com o traçado utilizando as faixas de domínio das rodovias BR 101 (Rio-Santos) e SP-055 (Rodovia Padre Manoel da Nóbrega) que ligará o terminal a uma instalação da COMGÁS situada em Cubatão.
Área de impacto do Projeto Atlântico Energias (Fonte: RIMA)
O diretor presidente da Gastrading, Alexandre Chiofetti, através de sua assessoria de imprensa, informou à Comissão Pró-Índio que o empreendimento só será instalado após o leilão de energia, previsto para acontecer em 2018, “como é previsto no mercado de geração de energia“.
A prefeitura de Peruíbe não retornou a solicitação de entrevista até o fechamento desta matéria.
Matéria: Bianca Pyl, assessora de comunicação, CPI-SP
Informe da Comissão Pró-Índio de São Paulo, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 24/04/2017
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2 thoughts on “Protocolado EIA/RIMA do Projeto Atlântico Energia que afetará terras indígenas e UCs na Mata Atlântica”
Tecnologia de baixo impacto. Oportunidade boa para compensações com comunidades do entornocem termos de saúde pública, lazer e desencolvimento humano.
Necessita de scompanhamento pelas comunidades afetadas!
Em resumo: uma ideia imbecil, que trará benefícios a poucos e a destruição de toda uma área ainda preservada do litoral paulista, bem como o êxodo dos bons cidadãos trazendo para Peruíbe em específico um monte de trabalhadores temporários, que depois vão se estabelecer ali. É o final da história, não preciso nem dizer, é o retrato do Brasil…
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Tecnologia de baixo impacto. Oportunidade boa para compensações com comunidades do entornocem termos de saúde pública, lazer e desencolvimento humano.
Necessita de scompanhamento pelas comunidades afetadas!
Em resumo: uma ideia imbecil, que trará benefícios a poucos e a destruição de toda uma área ainda preservada do litoral paulista, bem como o êxodo dos bons cidadãos trazendo para Peruíbe em específico um monte de trabalhadores temporários, que depois vão se estabelecer ali. É o final da história, não preciso nem dizer, é o retrato do Brasil…