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Agrobiodiversidade, artigo de Roberto Naime

 

 

[EcoDebate] FERNANDES et al (2014) asseveram que rápidas mudanças sociais e os processos de aculturação econômica e social afetam fortemente a agrobiodiversidade de propriedades.

A fim de identificar a agrobiodiversidade presente em propriedades em processos de transição agroecológica, investigam as plantas alimentícias, medicinais e condimentares presentes nos sistemas de produção familiares utilizando questionários semiestruturados.

Observam ainda que plantas alimentícias são as mais consumidas quando comparadas com medicinais e condimentares. E que espécies convencionais de fácil acesso no mercado são as mais consumidas pela população rural, sendo esse um reflexo do consumo de mercado da população urbana. Sendo que produtores rurais preferem produzir espécies que possuem um maior valor de mercado em uma pequena área de produção.

Agrobiodiversidade é definida pela diversidade de espécies cultivadas em sistemas de cultivo e de criação de animais presentes em um sistema agrícola segundo WOOD & LENNÈ 1999. O termo “agrobiodiversidade” está normalmente associado ao discurso sobre agricultura alternativa quer seja biológica, ecológica, orgânica ou natural, e com o resgate de espécies nativas da agricultura tradicional, ou a diversificação de renda e segurança econômica da agricultura familiar, conforme MARZALL,2007.

Mesmo com o amplo uso de diversas espécies de plantas feito por caçadores desde os primórdios da humanidade, o ser humano domesticou menos de mil e quinhentas espécies, na dimensão da agricultura formal.

Cerca de 95% das necessidades alimentares globais derivam de só 30 espécies de plantas e a dieta humana, se baseia em tão somente oito cultivos, sendo estes responsáveis por três quartos da nossa alimentação conforme HOBBELINK, 1990. Estes dados fornecem uma dimensão do quanto a diversidade alimentar pode e deve ser incrementada, fazendo com que mais substâncias e mais vitaminas, princípios ativos e constituintes alimentares, possam atuar na promoção da saúde, interferindo beneficamente na qualidade de vida da civilização humana, segundo se infere de DELWING, 2007.

FERNANDES et al (2014) asseveram que com a revolução verde, a agricultura mundial passou por diversos processos de modernização, fazendo com que os agroecossistemas se tornassem mais vulneráveis e se tornassem hegemônicas poucas espécies. Isto contribui para a baixa diversidade genética, gerando uma baixa eficiência energética dos produtos produzidos. Este processo contribui de forma relevante, para a extinção de diversas espécies de plantas alimentícias e medicinais.

Devido a essa preocupação, se identificam as plantas alimentícias, medicinais e condimentares que caracterizam a agrobiodiversidade presente nos sistemas de produção familiares orgânicos ou em processo de transição agroecológica.

Para isso, foram realizadas entrevistas semiestruturadas em 14 propriedades familiares com certificação em produção orgânica, do município de Ribeirão Claro no Paraná., cujos resultados apontam para a caracterização da agrobiodiversidade e seu papel nesses sistemas.

Para a identificação de plantas alimentícias, medicinais e condimentares foram realizadas visitas a campo em uma amostra composta por quatorze produtores vinculados à Associação de Produtores Orgânicos do Município de Ribeirão Claro no estado do Paraná. Todas estas propriedades investigadas eram familiares e com produção orgânica certificada ou em processo de transição para agroecologia.

Os quatorze produtores investigados na região, citaram um total de 85 plantas diferentes que são consumidas pelas famílias em suas propriedades. Dentre essas, 72% compreendem plantas alimentícias, 20% plantas medicinais e 8% plantas condimentares, demonstrando uma vasta diversidade de produtos tanto plantados como consumidos.

As espécies que mais se sobressaem, são as alimentícias pois os agricultores plantam de acordo com as demandas econômicas do mercado buscando garantir uma melhor segurança financeira. Como são produtores familiares buscam um maior valor do produto final por uma menor área explorada, desta forma a alimentação familiar se torna uma consequência da produção na propriedade.

As plantas medicinais apresentaram menor valor, cerca de 20% do consumo total da família, mas este montante se torna significativo considerando as dificuldades de acesso a medicamentos alopáticos. O uso de fitoterápicos demonstra a força das condicionantes socioculturais entre as gerações que compõem as famílias, sendo esse tipo de uso propicia uma sabedoria que vai se perpetuando. Com a facilidade de encontrarmos diversos produtos condimentares no mercado por preços reduzidos, o cultivo e a utilização de plantas condimentares por produtores familiares é bastante reduzida, sendo isso também influenciado pela restrição da força de trabalho presente nas propriedades.

FERNANDES et al (2014) observam a grande diversidade de espécies identificadas, tanto alimentícias, medicinais e condimentares. Destacam que estas são espécies de consumo mais popular e de fácil acesso nos mercados locais.

Apesar do predomínio dessas espécies, foram identificadas espécies consideradas não muito convencionais ou de consumo de massa, tais como, cará, seralha, espinafre, jambo, tamarindo, mandacaru, cajá-manga e uvaia, todas pertencentes a classe de plantas alimentícias. Para as medicinais foram identificadas, confrei, losna, favacão, folha e flor de laranja, folha de café convencional, ponta livre, erva de santa maria e babosa. E, no caso das condimentares o açafrão.

Entre raízes e tubérculos, se registraram mandioca, cenoura, beterraba, folhas e flores de alface, almeirão, couve e rúcula. Entre os legumes e frutas se destacam a presença de chuchu, tomate, abóbora, mexerica, laranja, manga, limão, maracujá e banana.

Como plantas medicinais se identificaram ainda folhas e flores de boldo, hortelã, alecrim, arruda e erva cidreira. Complementam a relação de plantas condimentares, as folhas e flores de cebolinha e a salsinha.

FERNANDES et al (2014) registram que há produtores que ainda cultivam e se alimentam de uma variedade relativamente grande de espécies não convencionais. Isto demonstra que mesmo havendo um consumo de massa de algumas espécies, sobretudo, aquelas que conformam um hábito alimentar padronizado, alguns produtores promovem uma conservação da diversidade genética representada pela permanência destes tipos de cultivo e da agrobiodiversidade desta forma representada.

Este fato é um indicador importante de que as novas gerações respeitam e conservam o patrimônio genético típico da região e característico da realidade sociocultural da população ali residente.

A investigação possibilitou a identificação das principais espécies alimentares, medicinais e condimentares cultivadas nas propriedades orgânicas do Município de Ribeirão Claro no estado do Paraná.

FERNANDES et al (2014) asseveram que é possível concluir que há uma grande diversidade de espécies sendo cultivadas. A maioria no entanto, se referem a espécies caracterizadas como de consumo de massa e que são típicas do hábito alimentar da população brasileira. No entanto, ocorre ressaltar que foi possível também verificar a permanência nos sistemas de produção de espécies consideradas exóticas ao cardápio padrão que orienta o consumo das famílias dos agricultores.

O mesmo sendo verificado para as plantas medicinais e condimentares, sendo este fato um indicador importante de que as novas gerações respeitam e conservam o patrimônio genético típico da região e característico da realidade sociocultural da população residente na região.

Porém, fica evidente que, para os produtores orgânicos ainda permanece como de grande valor entre as gerações, a diversidade da produção e do consumo familiar. Que esta reflexão possibilite um aprofundamento da concepção do mundo que se deseja legar para as próximas gerações, sem ranços e nem preconceitos.

Referências:

HOBBELINK, H. Biotecnologia: Muito Além da Revolução Verde. Desafio ou Desastre? Porto Alegre: AGE, 1990. 196p.

DELWING, A. B.. A Etnobotânica como Ferramenta da Validação do Conhecimento Tradicional: Manutenção e Resgate dos Recursos Genéticos. Revista Brasileira de Agroecologia, Rio Grande do Sul,v.2, n.1, fev.2007.

WOOD, D.; LENNÉ, J.M. 1999. Why Agrobiodiversity? In: Wood, D.; Lenné, J.M. Agrobiodiversity: Characterization, Utilization and Management. New York: CABI Publishing. pp.01-14

MARZALL, K. Fatores Geradores da Agorbiodiversidade – Influencias Socioculturais.Revista Brasileira de Agroecologia, v.2,n.1,fev.2007.

FERNANDES, Bruna Terci; MACEDO, Rogério Barbosa; PADUAN, Fernanda Neves; CORREIA, Larissa Vinis; FERNANDES, Flávia Regina Moreira; SILVA, Diego Contiero Agrobiodiversidade em sistemas de produção familiares agroecológicos Cadernos de Agroecologia – ISSN 2236-7934 – Vol 9, No. 1, 2014

 

Dr. Roberto Naime, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em Geologia Ambiental. Integrante do corpo Docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale.

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in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 06/04/2017

 

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