Relator da comissão especial da Câmara sobre crise hídrica vai propor soluções de rápida implementação
Deputado Givaldo Vieira vai sugerir medidas de uso racional da água, ampliação da educação ambiental nas escolas, novo padrão de edificações e maior incentivo a agricultores que prestarem serviços ambientais
O relator da comissão especial da Câmara sobre crise hídrica, deputado Givaldo Vieira (PT-ES), prevê uma crise duradoura de abastecimento de água no País e, para minimizar essa situação, pretende apresentar relatório que aponte soluções viáveis de rápida implementação e baixo custo.
A comissão busca medidas para reduzir o impacto da escassez de água no País desde abril de 2015. O relatório final deverá ser apresentado em março e, segundo Givaldo Vieira, vai conter sugestões como mudanças no padrão das edificações no País, principalmente com relação ao uso racional da água e à captação da água de chuva.
Mesmo considerando as diferenças climáticas do País, o deputado avalia que a crise hídrica é resultado, sobretudo, de desmatamentos, crescimento populacional desordenado nas áreas urbanas e negligência governamental na proteção dos mananciais e na ampliação dos reservatórios.
Outros fatores, como o aumento da temperatura global, levam Vieira a prever que a crise não será passageira e vai exigir que a sociedade se adapte à nova realidade de pouca disponibilidade de água em algumas regiões.
Agricultura
Para o deputado, é preciso transformar o pagamento a agricultores por serviços ambientais em programas de longo alcance, “já que hoje são programas pilotos espalhados pelo País que não conseguem a repercussão necessária”. “Outro caminho interessante são as chamadas barraginhas, uma tecnologia que a Embrapa desenvolveu e permite reservar, sem grande custo, uma quantidade interessante de água no tempo das chuvas e que depois abastece o lençol freático”, afirmou.
Givaldo Vieira informou que outro foco do relatório será a educação, a fim de que o uso consciente da água esteja presente em todas as fases do aprendizado escolar.
Também deverão constar do relatório medidas como a previsão de investimentos em saneamento básico (para conter o lançamento de esgoto nos rios), o replantio de árvores (incentivos aos pequenos agricultores para a proteção das nascentes) e uma nova conscientização da população em relação ao uso racional da água.
Crise de abastecimento
O deputado lembra que o Brasil tem uma das maiores reservas de água doce do mundo, porém, mal distribuída: a maior parte está na Região Norte, onde a população é menor que a das demais regiões.
Entre 2014 e 2015, a crise hídrica atingiu o Sudeste, deixando parte da região com cenários típicos do semiárido nordestino. Já 2017 começou com racionamento de água em parte do Distrito Federal. A medida inédita surpreende pelo fato de acontecer em pleno período de chuva no Centro-Oeste, região conhecida como “caixa d’água” do Brasil por abrigar as nascentes de rios que formam algumas das maiores bacias hidrográficas do País.
Especializado em fluxo de água no solo, o ex-diretor do Departamento de Geografia da Universidade de Brasília (UnB) Mário Diniz de Araújo Neto avalia que a crise hídrica tem especificidades regionais, de acordo com o histórico de uso e ocupação territorial.
No Distrito Federal, ele aponta problemas de gestão nos últimos 30 anos, que levaram à expansão desenfreada das áreas urbanas e à transformação do cerrado em áreas agrícolas. O atual racionamento recebeu críticas por estar restrito a apenas 14 regiões administrativas abastecidas pela Barragem do Rio Descoberto. Outras regiões consideradas nobres, como Brasília, Lago Sul e Lago Norte, foram poupadas.
Mário Diniz criticou o fato de o racionamento atingir apenas consumidores residenciais. “O foco do racionamento está na gente, nos usuários residenciais: vamos diminuir o banho, diminuir o uso da máquina de lavar. Está certo, vamos lá. Mas há outros envolvidos que não estão sendo chamados a participar do processo: a agricultura irrigada, a agroindústria, aqueles abatedouros de frango em que, cada peça abatida, gasta em torno de 15 litros de água. E são abatidas, por baixo, 50 mil a 60 mil cabeças por dia. Aí ninguém fala nada, só estão olhando para a gente”, afirmou.
Segundo o especialista, a média mundial mostra que as residências respondem por apenas 8% do consumo total de água. Os outros 92% são consumidos pela indústria, agricultura e comércio.
Em março de 2018, Brasília vai sediar a 8ª edição do Fórum Mundial da Água. O evento é promovido a cada três anos pelo Conselho Mundial da Água para envolver governos locais e parlamentares na busca de soluções para problemas ligados aos recursos hídricos.
Projetos em análise
Além das medidas em estudo na comissão especial da crise hídrica, a Câmara dos Deputados analisa vários projetos de lei relativos ao tema. Há propostas, por exemplo, sobre o uso da água descartada do ar-condicionado como fonte alternativa para o abastecimento de casas e prédios (PL 4060/15), incentivo aos estudos científicos de combate à desertificação (PL 3095/15), padronização das normas para o uso da água da chuva (PL 2457/11 e apensados), incentivos aos produtores rurais para a preservação de nascentes (PL 1465/15 e apensados), incentivo às indústrias que invistam no tratamento da água de reuso nas empresas (PL 182/15) e isenção de impostos para a aquisição de equipamentos, como bombas, coletores e filtros, para a construção de sistemas de captação de água da chuva (PL 377/15), entre outros.
A crise hídrica também foi debatida em comissão geral no Plenário da Câmara, em 2015.
Reportagem – José Carlos Oliveira
Edição – Pierre Triboli
Da Agência Câmara Notícias, in EcoDebate, 26/01/2017
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