EUA: A vitória do populismo, uma reflexão do noticiário da TV alemã, por Johannes Gierse
A VITÓRIA DO POPULISMO – UMA REFLEXÃO DO NOTICIÁRIO DA TV ALEMÃ EM 3 PARTES
Jornalista Pinar Atalay: O novo é muito diferente dos presidentes anteriores dos EUA. E é exatamente este o motivo pelo qual muitos americanos votaram nele. E a metade do eleitorado enxerga nele um salvador que fala palavras claras e, finalmente, combate os descasos. Até mesmo aquelas pessoas aos quais Trump tinha atacado fortemente: boa parte das mulheres votou nele. Seu populismo o tornou o número “1”. E também no exterior dos EUA cresce sua base de fãs: seja na Rússia, na Turquia ou na Europa – aqui acolá há gente sonhando dos Estudos Unidos dos Populistas. A vitória deles analisa o jornalista Stefan Maier.
Parte 1: A reportagem de Stefan Maier
Agora, recém-eleito, ele quer ser o presidente de todos os americanos. “Eu digo que está na hora de nos aproximar como povo unido”, afirmou Donald Trump. Sua campanha eleitoral era marcada pelos insultos conta a adversária, ameaças contra minorias, mentiras. Por que o populista Donald Trump teve tanto sucesso com isso? Uma resposta é essa: Ele deu voz aqueles que se sentem esquecidos: os fazendeiros brancos e os operários de baixo nível escolar nas indústrias, os politicamente frustrados. Trump lutou por eles e contra o sistema estabelecido, encarnado pela Wall Street e a classe dos intelectuais. Nós contra eles, o herói luta pelo povo, contra os vilões. Este é um padrão do populismo.
Exemplo Grã-Britânia, o Brexit: o herói era Nigel Farage, o vilão a União Europeia. Farage, co-fundador do partido UKIP que cético à Europa, lutou durante 10 anos pela saída da Grã-Britânia. Nigel Farage disse: “Temos que sair da União Europeia e resgatar o controle sobre o nosso país”. Também Farage não recuou de mentir ao falar sobre os valores reais dos pagamentos à UE ou sobre o número dos migrantes. Mesmo assim, sua mensagem foi bem acolhida. A Grã-Britância votou pelo Brexit. O populista tinha vencido.
Donald Trump aperfeiçoou o método. „Só nós representamos a vontade popular“, foi sua mensagem. Tudo o que não se enquadra é considerado manipulado: o sistema político, a mídia crítica, até mesmo o resultado do pleito. “Somente irei aceitar o resultado desta eleição histórica se eu for eleito”, disse Donald Trump.
Os populistas na Europa adoram palavras deste tipo: o Geert Wilders na Holanda, o Victor Orban na Hungria, a Marine Le Pen na França, ou o partido “Alternativa para a Alemanha” que já conquistou 10 Assembleias Legislativas e logo mais também o Parlamento. “Somos um sinal para a Europa, para os partidos que se reformulam e que não fazem parte do sistema estabelecido”, diz Jörg Meuthen, porta-voz do partido “Alternativa para a Alemanha”.
“Sistema estabelecido” (ingl. establishment), um bicho-papão popular para os populistas, que se consideram o porta-voz do povo, porém, por eles mesmos anteriormente definido. Quem não faz parte é declarado adversário. O termo técnico chama-se „política post-facto“1, e significa o seguinte: populistas não se importam com os fatos, mas somente com as emoções. E o público não se importa com a verdade, mas com aquilo que afirma sua própria cosmovisão. Nestes tempos, a mentira se torna socialmente fidedigna.
Parte 2: A entrevista com o professor Jan Werner Müller
Jornalista Pinar Atalay: Agora vamos falar com o cientista político Jan Werner Müller sobre populismo. Ele leciona na US-University Princeton e é atualmente professor-convidado em Viena-Áustria. – Donald Trump é o protótipo de populista?
Professor J. W. Müller: Com certeza absoluta. Muitas vezes ouvimos como ele afirma que ele, e só ele mesmo, representa o povo verdadeiro. Chamou sua adversária de corrupta e até de criminosa; ela foi totalmente endemoninhada. Ela era ilegítima de qualquer jeito. O que não foi muito evidente é que ele disse desde o início que todos aqueles que não fazem parte do povo por ele definido como autêntico, não fazem parte de forma nenhuma. Quer dizer, todos aqueles que não o apoiam, automaticamente não fazem parte do povo verdadeiro. Portanto, o populista não exclui somente no nível político partidário – por assim dizer, no nível das elites – mas também ao mesmo tempo no nível dos próprios cidadãos e – como Trump praticou ao extremo – agita contra as minorias.
Jornalista Pinar Atalay: Mas, como um multimilionário, sendo ele mesmo elite, pude marcar pontos atacando as elites e, depois, se apresentar como o verdadeiro representante do povo?
Professor J. W. Müller: Duas respostas! A primeira: A promessa dos populistas na verdade não é que eles são como qualquer um ou querem ser como os demais. A promessa deles é a seguinte: Eu sou o único a realizar, de fato, a vontade popular. Eu não sou corrupto – no caso de Trump: “eu tenho meu dinheiro próprio” – e, por isso, os outros nem podem influenciar-me. Então, no fundo, não se trata em dizer que eles não sejam iguais aos outros.
A segunda: É muito importante que figuras como Farage e agora, sobretudo, Trump tenham recebido anteriormente a bênção de outras figuras estabelecidas. Farage não organizou sozinho o Brexit. Ele precisou o Boris Johnson e o Mikel G. do partido dos Torres; e Trump precisou de republicanos estabelecidos como Gingrich, Christi e Juliane que disseram: “Vocês, eleitores dos republicanos, vocês podem ter receios contra Trump, mas nós dizemos a vocês que ele é “ok”. Pois, não eram somente as pessoas contra o estabelecimento que agora votaram ao seu favor, mas também eram pessoas que diziam: “Sempre votei nos republicanos e agora preciso a afirmação de figuras bastante estabelecidas dizendo que o Trump é gente boa.
Jornalista Pinar Atalay: Todo mundo se pergunta como o Trump será como presidente. Há o antes e o depois. Ele continua como um populista ou vai recuar logo mais, vai se mudar? Ele disse ao menos, que quer ser presidente de todos os americanos.
Professor J. W. Müller: Naturalmente, isto é uma formulação padrão que qualquer vencedor alega no início; no contexto americano é um clichê. Não vejo nenhum motivo pelo qual ele deveria se mudar. De certa forma ele tem o sucesso do lado dele. Muitas pessoas disseram a ele: “Se você quebrar essa regra política, se você quebrar este tabu, estará tudo perdido”. Mesmo assim, ele quebrou. O sucesso dá razão a ele. Por que ele deveria se mudar radicalmente? Ele obteve sucesso opondo as pessoas e dividindo o povo. Por que ele não deveria continuar do mesmo jeito?
Jornalista Pinar Atalay: Como o senhor já mencionou, fatos e argumentos não contam para os populistas. Mas, embora assim seja, como pode-se falar com os seus adeptos? Como a gente pode alcançar essas pessoas novamente?
Professor J. W. Müller: Temo que usamos o termo da “era do post-facto” como diagnóstico demasiadamente rápido. Os fatos da era do post-facto não estão sendo estabelecidos. É muito ingênuo acreditar que os fatos falassem por si mesmos. Não! Eles fazem parte de uma narração; em parte eles transportam certos valores que mudam à luz das diferentes experiências. É muito ingênuo acreditar que bastasse uma simples afirmação referente à facticidade de uma coisa e que com isso a gente fosse vitoriosa contra os populistas. Não! Os fatos precisam ser incorporados numa narração que quiçá seja pluralista e tolerante. E é preciso contar com que uns populista dizem: “Bem, nós temos uma outra narração e, por isso, vocês não nos convencem muito alegando fatos”.
Jornalist Pinar Atalay: „Donald Trump e a vitória do populismo“ – agora um comentário de Alois Theisen da emissora de TV Hessischer Rundfunk.
Parte 3: O comentário de Alois Theisen
Nós vivemos, de fato, na “era da mentira”, como se poderia traduzir de forma elegante o termo da “era do post-facto”? Penso que se trata apenas de uma tentativa impotente e imprópria para explicar os pleitos cujos resultados são cada vez mais inesperados. Por qual motivo os eleitores se deixam hoje com mais facilidade enganar do que outrora? Não dispomos sobre mais informações como nunca antes? E nunca antes como hoje, os pronunciamentos dos políticos foram verificados com mais frequência e de diversos lados. Não, em todos os tempos houve mentiras na política e na vida particular. Quem afirma outra coisa vive no saudosismo. Aquele que explica a vitória de Donald Trump nas urnas, o voto dos britânicos a favor do Brexit e os sucessos do partido “Alternativa para a Alemanha” com uma estupidez de boa-fé ou a intolerância dos eleitores referente aos fatos, para mim comprova somente o seguinte: uma arrogância insuportável diante do soberano do Estado, o povo, e, com isso, também diante dos eleitores e a razão deles.
As constelações políticas desenvolvem-se diferentemente de como alguns formadores de opinião gostariam. Mas, na “era do post-facto” eles mesmos não vivenciam possivelmente os fatos decisivos que marcam a vida e o trabalho dos eleitores, tampouco as preocupações, os medos e às vezes o pânico que causa a transformação acelerada do mundo. Sempre se fez política baseada nos medos e nas emoções: por exemplo, na questão da energia atómica. De um lado, o que era barato, de outro lado não poderia ter falhas. “A era do post-facto” não passa de ser outra formula impotente atrás da qual se esconde o seguinte: Muitos inteligentes explicadores do mundo não estão mais entendendo o mundo.
(Transcrição e tradução: Johannes Gierse, frade e menor)
1 O conceito „política post-facto“ designa um pensamento e uma ação políticas para os quais os fatos não estão mais no centro da atenção. A verdade de uma colocação fica em segundo plano, em primeiro está o efeito para a clientela. Segundo o iluminismo, num discurso democrático debate-se quais as consequências devem ser tiradas de fatos comprovados. Num discurso post-facto, ao contrário, se mente, desvia-se a atenção ou dilui-se o assunto – sem ter uma grande relevância para o público alvo. O decisivo para os eleitores aos quais a política post-facto se dirige é que a questão se os modelos explicativos se aproximam ao mundo das emoções. In: https://de.wikipedia.org/wiki/Postfaktische_Politik. Tradução própria.
in EcoDebate, 06/12/2016
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Coisa a lembrar: Trump só foi eleito porque os americanos têm como base o absurdo sistema distrital de votos. Ele teve DOIS MILHÕES de votos A MENOS que Hillary Clinton, mas como nos EUA uma pessoa NÃO vale um voto, ele foi eleito.
E tem gente que quer trazer esse sistema estúpido para o Brasil, para que as eleições sejam decididas apenas pelos moradores do Acre.