Vulnerabilidade Social e Injustiça Ambiental, Parte 2/6, artigo de Roberto Naime
[EcoDebate] RANGEL (2015) assevera que ao adotar como ponto inicial de análise o meio ambiente e sua relação direta com o homem contemporâneo, se faz necessário dissecar a concessão jurídica apresentada pela lei 6.938, de 31 de agosto de 1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicações.
Este diploma, ancorado apenas em uma visão hermética e ortodoxa, concebe o meio ambiente como um conjunto de condições, leis e influências de ordem química, física e biológica que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas.
Nesse primeiro momento, é possível deixar em clara evidência que o tema é dotado de complexidade, e dialoga uma sucessão de fatores distintos, que são facilmente distorcidos e deteriorados devido à ação antrópica.
José Afonso da Silva (2009, p. 20), ao traçar definição acerca de meio ambiente, descreve-o como “a interação do conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas formas”.
Celso Antônio Pacheco Fiorillo (2012, p. 77), por sua vez, afirma que a concepção definidora de meio ambiente está pautada em um ideário jurídico despido de determinação e diante da situação concreta, promover o preenchimento da lacuna existente.
Não é possível conceber, o meio ambiente apenas como uma floresta densa ou ecossistemas com espécies animais e vegetais próprios de uma determinada região.
É preciso alinhar o entendimento da questão com os anseios antropológicos apresentados pela sociedade contemporânea.
A acepção ingênua do meio ambiente, na condição estrita de apenas condensar recursos naturais, está superada, em decorrência da dinamicidade da vida contemporânea.
Tal fato decorre do processo de constitucionalização do meio ambiente no Brasil, concedendo a elevação de normas e disposições legislativas que visam promover a proteção ambiental.
Ao lado disso, não é possível esquecer que os princípios que sustentam a juridicidade do meio ambiente foram elevados a condição hegemônica, passando a integrar núcleos sensíveis, dentre as liberdades públicas e os direitos fundamentais.
“Com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, as normas de proteção ambiental são alçadas à categoria de normas constitucionais, com elaboração de capítulo especialmente dedicado à proteção do meio ambiente” (THOMÉ, 2012, p. 116).
Diante do alargamento da concepção do meio ambiente, problemas meramente socioeconômicos foram elevados à condição ambiental, pelas consequências que produzem e que englobam meio ambiente.
Trata-se do denominado meio ambiente artificial ou meio ambiente humano, estando delimitado espaço urbano construído, consistente no conjunto de edificações e congêneres, denominado, dentro desta sistemática, de espaço urbano fechado, bem como pelos equipamentos públicos, nomeados de espaço urbano aberto, como salienta Fiorillo (2012, p. 79).
O cenário contemporâneo, refletindo a dinamicidade e complexidade do ser humano, passa a materializar verdadeiro habitat para o desenvolvimento do indivíduo.
O meio ambiente artificial é o construído ou alterado pelo ser humano, sendo constituído pelos edifícios urbanos, que são os espaços públicos fechados, e pelos equipamentos comunitários, que são os espaços públicos abertos, como as ruas, as praças e as áreas verdes.
Embora esteja ligado diretamente ao conceito de cidade, o conceito de meio ambiente artificial abarca também a zona rural, referindo-se simplesmente aos espaços habitáveis pelos seres humanos, visto que neles os espaços naturais cedem lugar ou se integram às edificações urbanas artificiais, conforme FARIAS, 2009, p. 07.
É possível, assim, caracterizar o meio ambiente artificial como fruto da interferência da ação humana, ou seja, “aquele meio ambiente trabalhado, alterado e modificado, em sua substância, pelo homem, é um meio ambiente artificial” (BRITO, 2013).
Neste cenário, o instrumento legislativo de tutela do meio ambiente humano, em um plano genérico, está assentado na lei nº. 10.257, de 10 de Julho de 2001, que regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal conhecido como “Estatuto da Cidade”.
Conforme RANGEL (2015), um dos objetivos da política de desenvolvimento urbano previsto no artigo 182 da Constituição Federal, são as funções sociais da cidade, que se realizam quando se consegue propiciar ao cidadão qualidade de vida, com concretização dos direitos fundamentais, e em consonância com o que disciplina o artigo 225 da Carta Magna, que garante a todos o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
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Dr. Roberto Naime, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em Geologia Ambiental. Integrante do corpo Docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale.
Sugestão de leitura: Civilização Instantânea ou Felicidade Efervescente numa Gôndola ou na Tela de um Tablet [EBook Kindle], por Roberto Naime, na Amazon.
in EcoDebate, 27/10/2016
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