O degelo da Groenlândia e a subida do nível do mar, artigo de José Eustáquio Diniz Alves
[EcoDebate] O nível dos oceanos aumentou mais rapidamente desde o século passado do que durante os últimos três milênios. Quatro artigos, publicados em fevereiro de 2016 nos Proceedings, da Academia Nacional de Ciências (PNAS) dos Estados Unidos, ilustram o crescente poder dos computadores para simular as interações complexas entre o clima, o gelo polar, e os oceanos. Os artigos também ressaltam os efeitos que o aumento dos gases de efeito estufa e as temperaturas globais podem ter sobre o nível do mar futuro.
De maneira resumida, o que os estudos mostram é que entre 1870 e 2000, o nível dos oceanos subiu cerca de 20 centímetros como consequência do degelo das geleiras, especialmente as do Ártico e da Groenlândia, mas também pela expansão das moléculas de água provocada pelo calor. Se não fosse o aumento das temperaturas globais provocado pelo aumento dos gases de efeito estufa (GEE) desde o início da era industrial, o aumento do nível dos oceanos teria chegado a, no máximo, metade do que ocorreu no século XX.
Em contraste, os oceanos diminuíram 8 centímetros entre os anos 1000 e 1400, período marcado por um esfriamento planetário de 0,2 grau Celsius. Um esfriamento tão leve provocou uma redução significativa. Agora que a temperatura média global atingiu 1 grau Celsius mais elevado do que a média do século XX e cerca de 1,3º C em relação ao período pré-industrial, os pesquisadores calcularam que o nível dos oceanos muito provavelmente aumentaria de 51 cm a 1,3 metro durante o século XXI, se a economia mundial continuar dependendo tanto de combustíveis fósseis e da expansão da pecuária. Mas as previsões variam de acordo com as metodologias e os novos dados.
Outro estudo publicado no periódico Scientific Reports, John Fasullo et al. (10/08/2016), explica que as cinzas do vulcão Pinatubo, em 1991, resfriaram a temperatura global e desaceleraram a subida dos mares na última década do século XX. Removendo o efeito do vulcão numa simulação que usa um grande conjunto de modelos climáticos computacionais, foi descoberta uma aceleração do nível dos oceanos. Os autores chegam a prever um aumento de 0,12 milímetro por ano além do que se esperaria.
A NASA tem duas medidas sobre a elevação do nível do mar, uma com base em dados terrestres e a outra, a partir de 1993, com base em dados de satélite. O que os dados mostram é que entre 1870 e 1930 o nível do mar subiu apenas 50 mm (ou 0,8 mm por ano). Entre 1930 e o ano 2000 a elevação foi de 150 mm (ou 2,1 mm por ano). Mas entre 2000 e 2015 a subida do nível do mar foi de 60 mm (ou 4 mm por ano). Ou seja, o ritmo de elevação do início do século XX é duas vezes mais rápido do que o ritmo do século XX.
Artigo de Nicola Jones, no site e360 Yale, coloca com clareza as tendências mais recentes. Ela começa dizendo que 99% do gelo de água doce do planeta está preso nas calotas da Antártica e da Groenlândia e que o degelo, especialmente desta última, poderá fazer o nível do mar aumentar 1,8 metro (seis pés) no século XXI e muito mais no século XXII.
De fato, o nível do mar pode subir muito mais rapidamente do que o esperado nas próximas décadas, de acordo com uma nova pesquisa que revela vasta camada de gelo da Antártida é menos estável do que se pensava anteriormente. O corpo de cientistas do clima da ONU havia previsto uma elevação de até um metro no nível do mar neste século, mas não antecipou nenhuma contribuição significativa da Antártica, onde era esperado aumentando a queda de neve para manter a camada de gelo em equilíbrio. Mas de acordo com um novo estudo publicado na revista Nature (Robert M. DeConto e David Pollard, 31/03/216), um colapso dos mantos de gelo da Antártica podem fazer o nível do mar subir até dois metros até 2100, caso as emissões de carbono não sejam cortadas.
Quando o último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) foi publicado em 2013, o consenso era de que o nível dos oceanos subiria no máximo um metro (3,3 pés) até 2100. Mas em 2016, as modelagens sugerem que talvez seja o dobro, com os mares subindo entre 1,8 metro (6 pés) e 2,1 metros (7 pés). No final da última glaciação do planeta, começando cerca de 14.000 anos atrás, o nível do mar subiu mais de 13 pés (mais de 4 metros) quando a enorme camada de gelo da América do Norte derreteu.
Somente a Groenlândia está perdendo cerca de 200 bilhões de toneladas de gelo por ano. Essa taxa duplicou desde 1900 até o ano 2000. Isto lembra outras mudanças climáticas. Esse bloco gigante de gelo (situado sobre a ilha) tem o potencial de aumentar os níveis globais do mar por 7 metros (23 pés), se derreter em sua totalidade. Estudo da Nasa (13/10/2015) conclui que a elevação do nível do mar em decorrência do degelo da Groenlândia será maior do que os modelos atualmente têm projetado.
Artigo de Laura Faye Tenenbaum mostra que o satélite GRACE da NASA observou o degelo de trilhões de toneladas de gelo durante a última década na Groenlândia e a taxa de derretimento está aumentando. Artigo publicado no dia 21 de setembro, de Borenstein, mostra que a Groenlândia está, na verdade, perdendo cerca de 40 trilhões de libras a mais gelo por ano do que se pensava, segundo um novo estudo que utilizou GPS para ajudar a estimar o quanto o gelo está derretendo.
O degelo da Antártica ocorre de forma mais lenta do que a Groenlândia. Mesmo assim, o continente do Sul está perdendo cerca de 92 bilhões de toneladas de gelo por ano, com a taxa dobrando entre 2003 e 2014. Mas Antártica é bastante vasta – 1,5 vezes o tamanho do Brasil – com blocos de gelo de cinco km de espessura em alguns lugares e um montante de gelo suficiente para elevar o nível do mar por cerca 65 metros (cerca de 200 pés).
Para se ter uma comparação histórica, os pesquisadores olham para o último período interglacial, cerca de 120.000 anos atrás, quando as temperaturas médias eram cerca de dois graus mais quente do que os níveis pré-industriais e os mares estavam de 6 a 9 metros (20 a 30 pés) mais elevados do que hoje.
Também o artigo recente de James Hansen et. al. está prevendo um aumento do nível do mar mais rápido do que as estimativas do IPCC. O estudo mostra que o nível do mar pode subir não apenas 1,8 metro até 2100, mas 5 a 7 metros num futuro não muito distante. A dúvida é se isto vai ocorrer em 100, 200 ou 300 anos. A certeza é que os prejuízos serão enormes e crescerão na direta proporção da elevação do nível do mar.
Na semana passada um outro estudo publicado na revista Nature gerou polêmica ao apresentar uma projeção bastante pessimista sobre o aquecimento global. A pesquisadora americana Carolyn Snyder disse que a temperatura terrestre nos próximos milênios subiria cerca de 5 graus mesmo se emissões de carbono parassem hoje. Esta conclusão deriva de uma reconstrução inédita das temperaturas globais nos últimos 2 milhões de anos. Caso as emissões de GEE fossem mantidas, o aquecimento global chegaria a 9º C. Embora este número elevado de longo prazo tenha sido contestado, há consenso de que é grande a probabilidade de se superar a meta de 2º C do Acordo de Paris.
No dia 29 de setembro de 2016, um grupo de sete renomados cientistas climáticos liderados por Robert Watson, ex-presidente do Painel Intergovernamental das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, lançaram um documento (ver link abaixo) afirmando que é praticamente nula a chance de manter o aquecimento global abaixo de 1,5 graus Celsius em relação aos níveis pré-industriais. Os cientistas apoiam o Acordo de Paris, mas acham que o ritmo de cortes nas emissões de gases de efeito estufa (GEE), propostos nas INDCs, é totalmente insuficiente. Segundo Watson, na trajetória atual, o mundo pode chegar a 1,5º C acima dos níveis pré-industriais em 2030 e em 2º C graus até 2050. Certamente, se isto ocorrer, o nível do mar deve subir em torno de 2 metros até 2100.
Ninguém tem bola de cristal e o futuro está sempre aberto para diversas possibilidades. Porém, o aquecimento global já é uma realidade e somente o degelo da Groenlândia é suficiente para ameaçar as áreas costeiras do mundo. O aquecimento também provoca modificações nas correntes de ventos, gerando furacões e ciclones que tendem a ser fatais em momentos de maré alta. Megalópoles como Miami, Xangai, Mumbai, Lagos, Londres e Rio de Janeiro vão pagar um alto preço. Os prejuízos para as civilizações serão imensos. A acidificação das águas vai reduzir a vida marinha acelerando o processo de perda de biodiversidade e extinção em massa de espécies.
Mas não precisamos esperar muito. O aumento do nível do mar já está provocando o naufrágio do delta dos rios e alagando imensas áreas férteis e que são a fonte de sustento de milhões de pessoas. Diversas cidades já estão sofrendo danos crescentes com a inundação e as marés altas. Diversas praias estão desaparecendo com o Pontal de Atafona, em São João da Barra, na foz do rio Paraíba do Sul. Aliás, toda a cidade de São João da Barra já está sofrendo com a elevação do nível do mar e pode ser tornar inviável economicamente. Muitas partes do litoral brasileiro vão desaparecer, é só uma questão de tempo. Tempo ruim!
Referências:
Greenland ice sheet http://nsidc.org/greenland-today/
J. T. Fasullo, R. S. Nerem & B. Hamlington. Is the detection of accelerated sea level rise imminent? Nature, 10/08/2016
Nicola Jones. Abrupt Sea Level Rise Looms, e360 Yale, 05 May 2016
Jane Beitler. A submarine retreat. New maps get to the bottom of Greenland’s outlet glaciers. Earthdata, Nasa, October 13, 2015
Laura Faye Tenenbaum. Greenland on the edge, NASA, August 2, 2016
Nasa. https://omg.jpl.nasa.gov/images/graphics/601_OMG-Poster-0923m-Draft-3b.png
Robert M. DeConto & David Pollard. Contribution of Antarctica to past and future sea-level rise, Nature, 531, 591–597 (31 March 2016) doi:10.1038/nature17145
Seth Borenstein. Greenland ice loss 40 trillion pounds bigger than thought, Phys, 21/09/2016
Jeff Tollefson. Longest historic temperature record stretches back 2 million years. Suggests greenhouse gases may warm planet more than previously thought. Nature, 26 September 2016
Robert Watson et. al. The Truth about Climate Chance, 29/09/2016 http://feu-us.org/
https://drive.google.com/drive/folders/0B7HRGKIJWol-OEZfNDFjRHUwM2c
José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br
in EcoDebate, 03/10/2016
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Minha avó nasceu em São João da Barra no ano de 1904, muito antes do assunto aquecimento global virar notícia. Viveu parte da sua infância no Pontal de Atafona, até que a sua família se mudou para Minas. A casa onde ela viveu sua infância já não existe mais há muito tempo. A área foi tomada pelo mar. Segundo os relatos que ouvi, o processo se devia mais à redução do volume de águas do rio Paraíba, do que propriamente ao aquecimento da atmosfera. O mesmo ocorre em outras regiões onde as águas dos rios são desviadas antes de atingir a foz. A história nos mostra isso. O volume de água dos rios se reduz e não consegue mais se contrapor à força das marés.
Por outro lado, a física nos mostra que a água ao se solidificar, ou seja; virar gelo, aumenta de volume. Desta forma o gelo consegue flutuar sobre a água, mantendo cerca de 98% do seu volume submerso e apenas 2% emerso. Resulta daí que se toda a calota polar derretesse, o nível dos oceanos seria reduzido e não elevado como querem nos fazer crer. É física e não achismo.
Resta então a água da superfície continental. Sabemos que sob a calota polar norte há somente água, fica uma dúvida: Se todo o gelo da Groelândia derretesse, qual o volume de água que seria lançado ao mar, uma vez que o volume de água é menor que o volume do gelo e, quanto realmente seria a elevação do nível do oceano que acarretaria?
Em um artigo técnico recente, lí que o fenômeno El Niño havia provocado uma elevação do nível das águas do oceano Pacífico, maior que o calculado pelo efeito de aquecimento da atmosfera. Aqui sim, um caminho interessante. Também da física; quando um corpo é aquecido ele aumenta de volume (dilatação volumétrica). Novamente a água é dos poucos elementos da natureza que pode sofrer aumento de temperatura e ainda reduzir o seu volume. O menor volume da água ocorre à temperatura de 4ºC e só acima deste valor o seu volume aumenta.
No seu livro de 19982, John D. Hamaker defende uma idéia oposta à do IPCC, mas muito bem fundamentada. Note-se que nesta época entrava em moda a questão da camada de ozônio, que se tornou público mais tarde, foi alardeada para resolver a questão financeira de um grupo empresarial. O maior fabricante mundial de CFC.
Me parece que a ciência ainda não encontrou uma causa plausível para os fenômenos em curso, e portanto; jogam a culpa no tal do “aquecimento global”.
Será que estão querendo nos induzir a uma nova armadilha midiática?