Decreto estadual esquenta polêmica sobre licenciamento ambiental na Bahia
O licenciamento ambiental tem sido alvo de diversos questionamentos e tentativas de flexibilização nos últimos tempos. Ninguém parece contente com o modo que ele tem sido feito no Brasil e, particularmente, na Bahia. O estado vive atualmente um imbróglio por conta de leis estaduais que contrariam as normativas federais, como a dispensa de licenciamento para atividades agrossilvopastoris, desde 2014. O último lance desse conflito foi a publicação do decreto nº 16.963, em meados de agosto, definindo normas para o licenciamento ambiental a ser realizado pelo próprio empreendedor, sem fiscalização e supervisão do órgão ambiental.
O decreto surpreendeu e desagradou o Ministério Público da Bahia e as entidades ambientalistas. “Esse licenciamento tem uma fragilidade muito grande na análise do poder público, inclusive no controle social da atividade. Quando foi retirada a questão do licenciamento do Conselho Estadual do Meio Ambiente (CEPRAM), em 2011, o controle social praticamente deixou de existir na Bahia”, afirma Renato Cunha, do Gambá.
O desacordo jurídico iniciou com a Lei 12.377, de 2011, que instituiu no estado dois novos tipos de licença não existentes nas normativas federais, a Licença de Regularização (LR) e a Licença Ambiental por Adesão e Compromisso (LAC), que é concedida pela internet, à atividades de baixo ou médio potencial poluidor e com informações prestadas pelo próprio empreendedor, sem fiscalização do estado.
Essa licença tem sido usada para licenciar postos de gasolina, estações de rádio base e transporte de produtos perigosos sem a supervisão do órgão ambiental e, segundo o Ministério Público, já gera inúmeras situações de irregularidades e danos ambientais. Agora, com o decreto 16.963, embora não utilize o termo, o Governo do Estado propõe um licenciamento aos moldes da LAC para as atividades agrossilvopastoris, com requisitos declaratórios, como o CAR e declarações de uso correto de agrotóxicos ou de práticas sustentáveis de conservação do solo. Tudo isso sem fiscalização e comprovação pelo estado.
O decreto que regulamenta vem para tentar resolver o impasse desde que a Bahia passou a isentar as atividades agrossilvopastoris de licenciamento ambiental e gerou conflito com o Ibama, que segue a normativa federal e tem embargado terras no estado por falta de licença. Mas o Ministério Público da Bahia não achou a solução razoável, para o órgão esse tipo de licença fere o princípio constitucional da precaução, ao não procurar evitar o dano ambiental antes que ele seja cometido. “Nós recentemente ingressamos com uma ação para que houvesse a regularização pelo órgão ambiental estadual, já que a lei federal obriga pela resolução Conama 237/2007 a um regramento para o licenciamento ambiental”, afirmou a promotora Cristina Seixas no programa TVE Debate que discutiu licenciamento ambiental. Não se sabe ainda se o Ibama vai aceitar as novas regras do estado e considerar os empreendimentos como licenciados.
O Governo do Estado argumenta que o dever de resguardar o meio ambiente é do empreendedor e que é esse que deve se comprometer, “Ao estado compete verificar se ele está cumprindo a lei. Independente dele estar licenciado tem a obrigação de cumprir a legislação ambiental”, afirmou o secretário Eugênio Spengler, reforçando o papel da fiscalização. Mas o Ministério Público contesta essa ideia, “o órgão público tem o dever de controlar a qualidade ambiental, conforme estabelece a constituição federal, então ele precisa fazer um encadeamento de análises e tem também responsabilidade solidária ao empreendedor que ele autoriza a realizar uma atividade poluidora. E é nisso que se está equivocando na Bahia e em outros estados do Brasil. Depois que a atividade agrícola se instala e começa a produzir os danos isso repercute em toda a sociedade”, defendeu Cristina Seixas.
A Confederação Nacional da Agricultura também considera impossível licenciar todas as atividades agrárias no estado. Já Renato Cunha, do Gambá, defende que é necessário continuar licenciando algumas atividades: “A lei federal exige que tenha licenciamento nessa área e a Bahia isentou. Isso para atividades de monocultura, grandes plantios, com irrigação entre outras. São esses projetos que deveriam ser licenciados, principalmente os projetos em que há uma conversão de uso do solo. Embora não esteja muito claro, os pequenos produtores não precisariam ser licenciados até porque o órgão estadual não tem capacidade para isso”, avalia.
Fala, Gambá – Informativo do Grupo Ambientalista da Bahia, in EcoDebate, 19/09/2016
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