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Paradoxo imprevisível, artigo de Montserrat Martins

 

opiniao

 

[EcoDebate] Muita curiosidade cerca o pleito de outubro próximo, pois ninguém sabe o que resultará das novas regras eleitorais. A redução do tempo de campanha e de TV, em contraste com o aumento da participação política na sociedade e nas redes sociais, constitui um paradoxo de resultados imprevisíveis.

Será uma eleição da “internet x TV”, dizem estudiosos do assunto. A grande dúvida é que Brasil emergirá dessas urnas, se um mais tradicional, fortalecendo as coligações com mais tempo de TV, ou um país mais surpreendente, em que as campanhas nas redes sociais gerem mais votos que os meios mais antigos.

É consenso entre os analistas políticos que temos um Congresso Nacional conservador, portanto as novas regras não teriam aspecto de inovação e sim consolidariam as estruturas políticas já bem estabelecidas. O paradoxo é que, ao reduzir o tempo de campanha e de TV esses meios tradicionais também podem perder força para os meios antes tidos como alternativos, que ganham importância agora, só não sabemos até que ponto.

Luís Fernando Veríssimo escreveu certa vez sobre a “irrelevância da política” diante da economia globalizada, ou seja, que via de regra nada pode ser “inventado” no mundo político que se coloque na contracorrente do mercado internacional. As exceções é que seriam os verdadeiros fatos políticos, aqueles que conseguem contrariar a regra de sua irrelevância, como seria o caso do “Obamacare”. Num país de cultura política altamente privatizada, Obama conseguiu criar um sistema de saúde pública (batizado de Obamacare, análogo ao nosso SUS) que criou uma nova realidade social, até então impensável.

A política só existiria realmente, portanto, quando não fosse uma mera “extensão do mercado” na vida social e no Congresso Nacional. Um aspecto interessante é que o Código Civil Brasileiro feito em 1917, que perdurou até 2002, tinha uma preocupação explícita com a saúde das empresas, tanto é que no capítulo sobre o Contrato de Seguro a maior parte dos artigos visava à sobrevivência das seguradoras. A legislação dos seguros só começou a se modificar a partir dos anos 90, quando entrou em vigência o Código de Defesa do Consumidor.

Na História do Brasil o maior exemplo no contra-fluxo da “irrelevância da política” é a legislação trabalhista da Era Vargas, que consegue persistir há cerca de 70 anos desafiando as “leis do mercado” que pressionam constantemente por sua “flexibilização”. Mas o século XXI é o mais imprevisível da história da humanidade e desafia nossos conceitos mais “estabelecidos”. As novas regras para Outubro, seja qual fosse a intenção dos legisladores, vão nos mostrar algo que ainda não sabemos.

Montserrat Martins, Colunista do Portal EcoDebate, é médico psiquiatra, bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais e ex-presidente do IGS – Instituto Gaúcho da Sustentabilidade.

 

in EcoDebate, 29/08/2016

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