Royalties pelo uso de transgênicos, artigo de Roberto Naime
[EcoDebate] O que mais impressiona nos transgênicos é a capacidade de gestão e de convencimento demonstrada pelas empresas. Mesmo com menor produção, com maior uso de agrotóxicos e com riscos desconhecidos, os agricultores ainda acham boa alternativa pagar royalties pelas sementes.
Transgênicos são alimentos modificados geneticamente, com a alteração do código genético. São inseridos no organismos genes proveniente de outro. Esse procedimento pode ser feito até mesmo entre organismos de espécies diferentes como inserção de um gene de um vírus em uma planta. O procedimento pode ser realizado com plantas, animais e micro-organismos.
Qualquer inovação tecnológica tem como estimulação, os benefícios que podem ser gerados. Embora possam ter trajetória tão diferenciada quanto são as intenções e predisposições de toda humanidade.
Assim, todos os procedimentos merecem isenção e avaliações em cada caso, e não condenações gerais de qualquer natureza, que respondam a anseios dogmáticos ou políticos.
Conforme já se referiu, mesmo que não se apregoe qualquer restrição às evoluções científicas que inegavelmente são representadas por incrementos na transgenia ou por aprimoramentos de moléculas na indústria química, não custa nada prevenir a todas as partes interessadas que é preciso ter um pouco de humildade.
Procedimentos que podem até interferir na seleção natural, são temerários, sem compreender todas as relações implícitas ou explícitas, e não lineares ou cartesianas da homeostase dos ecossistemas.
Logo parece um pouco pretensioso na atual fase de conhecimentos da civilização humana, implementar estes incrementos sem considerar os princípios de precaução e sem mobilizar tentativas mais sistêmicas e holísticas de se apropriar da realidade.
As espécies transgênicas são protegidas por patentes, o que significa que o agricultor que decidir utilizá-las, terá de pagar royalties para a empresa detentora da tecnologia. A consequência mais imediata será o aumento da dependência do agricultor das empresas transnacionais do setor.
Isto por que, por regra contratual, o agricultor não pode utilizar as sementes do plantio anterior, assim terá que comprar as sementes transgênicas a cada safra. Além disso, é muito difícil o agricultor “se livrar” totalmente das plantas transgênicas, o que pode ocorrer com qualquer plantação, já que, caso ele não queira mais plantá-las, a chance de ainda nascer uma planta transgênica na plantação convencional existe. Caso isso ocorra, ele poderá ser compelido a pagar uma multa e mais royalties.
Além disso, existe o risco da contaminação. A contaminação pode ocorrer por meio de insetos ou até mesmo por meio do vento. É o caso do milho. Assim, se não existir um espaçamento adequado entre as lavouras transgênicas e convencionais, a contaminação pode ocorrer, pegando de surpresa o agricultor no momento da venda. Ocorre com freqüência a perda de contrato desses agricultores, já que o comprador estava interessado em um produto não transgênico.
Quando se insere um gene de um ser em outro, novos compostos podem ser formados nesse organismo, como proteínas e aminoácidos. Se este organismo modificado geneticamente for um alimento, seu consumo pode provocar alergias em parcelas significativas da população, por causa dessas novas substâncias.
No Instituto de Nutrição de York, Inglaterra, em 1999, uma pesquisa constatou o aumento de 50% na alergia a produtos à base de soja, afirmando que o resultado poderia ser atribuído ao consumo de soja geneticamente modificada.
Outra preocupação é que se o gene de uma espécie que provoca alergia em algumas pessoas for usado para criar um produto transgênico, esse novo produto também pode causar alergias, porque há uma transferência das características daquela espécie. Foi o que aconteceu nos Estados Unidos: reações em pessoas alérgicas impediram a comercialização de uma soja que possuía gene de castanha-do-pará, que é um famoso alergênico.
Para se certificar de que a modificação genética “deu certo”, os cientistas inserem genes (chamados marcadores) de bactérias resistentes a antibióticos. Isso pode provocar o aumento da resistência a antibióticos nos seres humanos que ingerem esses alimentos. Em outras palavras, pode reduzir ou anular a eficácia dos remédios à base de antibióticos, o que é uma séria ameaça à saúde pública.
Existem plantas e micróbios que possuem substâncias tóxicas para se defender de seus inimigos naturais, os insetos, por exemplo. Na maioria das vezes, não fazem mal ao ser humano. No entanto, se o gene de uma dessas plantas ou de um desses micróbios for inserido em um alimento, é possível que o nível dessas toxinas aumente muito, causando mal às pessoas, aos insetos benéficos e aos outros animais.
Isto já foi constatado com o milho transgênico “Bt”, que pode matar lagartas de uma espécie de borboleta, a borboleta monarca, que é um agente polinizador. Sequer a toxicidade das substâncias inseridas intencionalmente nas plantas foi avaliada adequadamente. Estas substâncias estão entrando nos alimentos com muito menos avaliação de segurança que qualquer aditivo, corante, pesticida ou medicamento.
Com a inserção de genes de resistência a agrotóxicos em certos produtos transgênicos, as pragas e as ervas-daninhas poderão desenvolver a mesma resistência, tornando-se “super-pragas” e “super-ervas”. Consequentemente, haverá necessidade de aplicação de maiores quantidades de veneno nas plantações, o que representa maior quantidade de resíduos tóxicos nos alimentos que nós consumimos.
No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) autorizou em 2004 o aumento em cinquenta vezes do limite de glifosato permitido em alimentos a base de soja. Os prejuízos para o meio ambiente também serão graves: maior poluição dos rios e solos e desequilíbrios incalculáveis nos ecossistemas.
A inserção de genes de resistência a agrotóxicos em certos produtos transgênicos faz com que as pragas e as ervas-daninhas desenvolvam a mesma resistência, tornando-se “super-pragas” e “super-ervas”.
Haverá ainda desequilíbrios nos ecossistemas a partir da maior resistência desenvolvida, ao longo dos anos, pelas pragas e ervas-daninhas. Para o Brasil, detentor de uma biodiversidade ímpar, os prejuízos decorrentes da poluição genética e da perda de biodiversidade são outros graves problemas relacionados aos transgênicos.
Referência:
Dr. Roberto Naime, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em Geologia Ambiental. Integrante do corpo Docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale.
Sugestão de leitura: Civilização Instantânea ou Felicidade Efervescente numa Gôndola ou na Tela de um Tablet [EBook Kindle], por Roberto Naime, na Amazon.
in EcoDebate, 08/04/2016
[cite]
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o agricultor moderno (que planta transgênico) sabe fazer conta muito bem e vê que milho, soja e algodão transgênico aumentam seu lucro. Ao contrario, portanto, do que afirma logo de início nosso articulista. Assim, as empresas não precisam convencer ninguém, seus pitiríase é que convencem.
Pode ser que tu tenha razão Paulo, mas o resto gera um potencial de desequilíbrio tão complicado…
Grande abs…
RNaime
Roberto, todas as questões que você debateu são válidas, mas foram discutidos em profundidade por todas as agências oficiais de avaliação de risco e agências regulatórias no Mundo. Todas chegaram à conclusão que os riscos são negligenciáveis. Esta conclusão foi a mesma aqui, nos EUA, no Canadá, na Europa, etc. Os danos previstos nunca se concretizaram depois de 20 anos de extenso uso e de dezenas de meta análises.
Está certo que foi tudo feito à luz do conhecimento atual, mas não poderia ser de outra forma.
Saudações
Concordo e agradeço a contribuição…mas que eu saiba tem vários países fomentando exclusividade de produção orgânica e também a proibição de transgenia em vários locais, o que até não resolve, porque o mundo é um só…
Concordo que os danos nunca se concretizaram…mas nem por isso devem ser negligenciados…
Grande abs…
RNaime
Roberto, os países europeus não seguem o que a agência de avaliação de risco sugere para os OGMs, mas a decisão é essencialmente política, não tem ciência nem avaliação de risco. Em outros países riscos e benefícios são sopesados e em alguns casos o país pode decidir por manter a agricultura mais convencional ou mesmo orgânica, mas a decisão e sempre um atendimento ao mercado e não uma abordagem de precaução, mesmo quando esta for a explicação (caso da França, por exemplo).
Bom fim de semana.
Bom fim de semana…
Abs…
RNaime