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Tragédia de Mariana: Chefe de direitos humanos da ONU pede ‘investigação completa e imparcial’

 

A catástrofe socioambiental provocada pelo rompimento de barragem da mineradora Samarco em Mariana (MG), no último dia 5/11, atingiu 663 km de rios, com a destruição de 1.469 hectares de terras, incluindo Áreas de Preservação Permanente (APP), aponta laudo técnico preliminar do Ibama
A catástrofe socioambiental provocada pelo rompimento de barragem da mineradora Samarco em Mariana (MG), no último dia 5/11, atingiu 663 km de rios, com a destruição de 1.469 hectares de terras, incluindo Áreas de Preservação Permanente (APP), aponta laudo técnico preliminar do Ibama

 

Relatando aos membros do Conselho de Direitos Humanos da ONU sua visita a Brasília este mês, alto comissário da ONU também expressou preocupação com medidas como a PEC 215 sobre demarcação de terras indígenas e quilombolas e a proposta de redução da maioridade penal. Zeid Ra’ad Al Hussein reconheceu esforços do governo para enfrentar discriminação contra população afrodescendente e lembrou que “economia em declínio” também ameaça conquistas sociais recentes.

Durante um encontro informal com membros e observadores do Conselho de Direitos Humanos da ONU, ocorrido nesta terça-feira (15) em Genebra, o alto comissário da ONU para os Direitos Humanos, Zeid Ra’ad Al Hussein, destacou sua visita ao Brasil. Ele comentou sobre as reuniões bilaterais “substantivas” com funcionários de alto escalão do governo brasileiro, na capital Brasília, além de encontros com a sociedade civil e acadêmicos.

Zeid disse reconhecer os esforços empreendidos pelo governo brasileiro para diminuir a pobreza e reduzir a desigualdade na década passada, fazendo dos programas sociais uma prioridade. O alto comissário também agradeceu ao Brasil pelo seu “papel ativo” no Conselho de Direitos Humanos, inclusive em matéria de racismo e discriminação racial, xenofobia e formas conexas de intolerância e de orientação sexual e identidade de gênero.

Ele expressou, no entanto, “preocupação” com o fato de que os progressos recentes do Brasil foram desafiados por uma economia em declínio e a introdução de projetos legislativos que “minaram duramente” as conquistas em normas de direitos humanos em diversas áreas. O chefe de direitos humanos da ONU demonstrou preocupação com a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) número 215, que tem o objetivo de transferir o poder de decisão sobre a demarcação das terras indígenas e quilombolas do poder executivo para o legislativo.

Zeid também citou com preocupação a iniciativa que reduz a idade de responsabilização criminal de 18 para 16 anos. Em junho deste ano, a ONU Brasil já havia publicado uma nota técnica criticando a proposta.

Ainda comentando sobre a situação dos direitos humanos no Brasil, o alto comissário destacou os desafios relacionados a segurança pública e violência, superlotação do sistema penitenciário, corrupção, pobreza, exclusão e múltiplas e graves formas de discriminação. “Tal discriminação é particularmente expressa na falta de acesso a direitos econômicos, sociais e culturais básicos para grandes segmentos da sociedade”, disse Zeid.

Segundo Zeid, funcionários do governo brasileiro de todas as áreas afirmaram o compromisso de enfrentar, com urgência, a discriminação generalizada e a violência enfrentadas por pessoas afrodescendentes, solicitando apoio adicional do Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos (ACNUDH), através da estrutura de seu escritório regional para a América do Sul.

Comentando a tragédia de Mariana, em Minas Gerais, Zeid pediu uma “investigação completa e imparcial” e lembrou sobre a responsabilidade conjunta dos governos e das empresas de proteger e respeitar os direitos humanos, conforme descrito nos Princípios Orientadores das Nações Unidas sobre Empresas e Direitos Humanos.

“Uma grande tarefa nos espera: dez anos para reverter cinco séculos de discriminação estrutural”

Zeid destacou que o objetivo principal de sua visita ao Brasil, realizada nos dias 3 e 4 de dezembro, foi a participação na primeira Reunião Regional da Década Internacional de Afrodescendentes, ocorrida em Brasília nestes dois dias. O encontro reuniu governos e grupos da sociedade civil de toda a América Latina e Caribe.

Ele comentou sobre a “grande tarefa que nos espera: dez anos para reverter cinco séculos de discriminação estrutural”. A discriminação racial, destacou Zeid, tem profundas raízes cultivadas no colonialismo e na escravidão – e “alimentadas diariamente com o medo, a pobreza e a violência”. Estas, disse o alto comissário, são “raízes que se infiltram de forma agressiva em cada aspecto da vida, desde o acesso à educação e à alimentação até a integridade física e a participação nas decisões que fundamentalmente afetam a vida das pessoas”.

Ele lembrou que atualmente existem mais de 150 milhões de pessoas de ascendência africana na América Latina e no Caribe – cerca de 30% da população. No entanto, ao longo de grande parte da região, eles são “quase invisíveis nos corredores do poder – econômicos, acadêmicos, profissionais ou políticos, a nível local ou nacional, e os altos índices de desigualdade persistem”.

Historicamente e nos dias de hoje, acrescentou Zeid, pessoas de ascendência africana têm sido as principais contribuintes para o desenvolvimento e a prosperidade de suas sociedades e nações. “Mas, de forma consistente, os seus direitos humanos foram violados para que outros possam prosperar”, completou o chefe de direitos humanos da ONU.

O alto comissário pediu, durante o encontro, que os Estados-membros promovam os três temas da Década da ONU: reconhecimento, justiça e desenvolvimento. “O reconhecimento começa com o reconhecimento e a compreensão da extensão e profundidade do racismo e da discriminação racial enfrentado por pessoas de ascendência africana, e por fazer a história, a cultura e as realizações afrodescendentes visíveis”, disse Zeid.

A justiça, explicou, engloba abordar “urgentemente” o uso desproporcional da força contra as pessoas de ascendência africana, o encarceramento em massa dos negros, a discriminação racial e a intolerância. Ele pediu o combate à impunidade para tais violações dos direitos humanos. O desenvolvimento, concluiu, deve ter como objetivo melhorar o bem-estar de todos. “Mulheres e homens de ascendência africana tem de ser parceiros ativos na concepção de iniciativas de desenvolvimento”, sustentou.

Zeid pediu ainda que os Estados-membros respeitem os seus compromissos e obrigações nos termos do direito internacional dos direitos humanos e usem todas as ferramentas à sua disposição para promover progressos concretos na promoção dos direitos das e dos afrodescendentes.

A declaração adotada na reunião regional reafirma, acrescentou Zeid, o compromisso dos Estados com a implementação completa da Declaração e do Programa de Ação de Durban nos níveis nacional, regional e global. “Saúdo, também, a criação do Fórum das Pessoas de Ascendência Africana”, concluiu Zeid, declarando seu apoio à elaboração de um projeto de Declaração das Nações Unidas sobre o tema.

Acesse aqui as informações sobre a Reunião Regional da Década Internacional de Afrodescendentes para a América Latina e o Caribe.

Acesse aqui o discurso completo do alto comissário no encontro informal do Conselho de Direitos Humanos da ONU.

 

Informe da ONU Brasil, in EcoDebate, 16/12/2015

 

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