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Artigo

Baixa produtividade da força de trabalho no Brasil, artigo de José Eustáquio Diniz Alves

 

151209

 

[EcoDebate] O artigo “Os Dilemas e os Desafios da Produtividade no Brasil” (NEGRI, CAVALCANTE, 2014) chama a atenção para a questão da produtividade da economia brasileira, em especial, a produtivadade da força de trabalho.

Os autores consideram que a produtividade da economia brasileira está estagnada (ou declinante) desde os anos de 1980. O ciclo de crescimento entre 2004 e 2010 ocorreu em função de fatores externos favoráveis, como a maior demanda externa por commodities (em um período que o preço da matéria-prima e produtos básicos estavam em alta), a maior liquidez e baixas taxas de juros internacionais e condições demográficas que favoreceram o crescimento do mercado de trabalho. Ou seja, o crescimento econômico da primeira década do século XXI ocorreu devido às condições internacionais favoráveis e, no plano interno, devido ao bônus demográfico.

Mas a rentabilidade das exportações de commodities, junto a baixa taxa de juros internacionais, permitiu a adoção de uma política monetária que valorizou a taxa de câmbio, garantindo, momentaneamente, uma sensação de riqueza para o conjunto da população brasileira. Mas a valorização do Real provocou a chamada “doença holandesa”, afetando a pauta de exportações brasileiras, que ficou muito mais dependente de produtos primários, influindo na composição do próprio investimento, o que acelerou o processo de desindustrialização precoce do país. O menor peso da indústria contribui para reduzir a produtividade e a competitividade. As exportações brasileiras passaram de mais de US$ 250 bilhões em 2011 para menos de US$ 190 bilhões em 2015.

Os autores mostram que “mesmo a adoção de uma série de medidas de estímulo ao crédito e ao investimento no âmbito da Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP) – lançada ainda antes da crise, em 2008 – não teve efeitos importantes sobre a taxa de investimento, embora o objetivo primordial da PDP fosse ampliar essa taxa para 21% do PIB em 2010” (p. 21). “Mesmo o aumento nos desembolsos do BNDES, que passaram de R$ 33,5 bi, em 2003, para R$ 156 bi, em 2012, não foi capaz de estimular o aumento dos investimentos na mesma proporção” (p.23).

Ou seja, o incentivo às compras, sem o aumento do investimento, aprofundou o desequilíbrio entre o consumo das famílias e do governo e a capacidade de oferta da economia, hiato que foi suprido pelo aumento das importações acima do crescimento do PIB e pelos crescentes déficits em transações correntes: “Esse processo teve impactos: i) fiscais, derivados das desonerações e dos empréstimos do tesouro para o PSI; ii) monetários, com a inflação chegando sempre muito perto do teto da meta, mesmo após o início de um novo ciclo de alta dos juros; e iii) nas contas externas, pressionadas pela queda das exportações de manufaturados e pela redução da demanda e dos preços das commodities e, além disso, pelo aumento das importações a taxas superiores ao das exportações” (p. 24).

O baixo crescimento da economia no governo Dilma Rousseff traz a tona, novamente, as dificuldades cruciais sobre a sustentabilidade do crescimento econômico brasileiro no longo prazo, isto porque as baixas taxas de investimento inviabilizam avanços na infraestrutura ena tecnologia, dois fatores essenciais para o aumento da produtividade.

Comparando com outros países, o baixo crescimento da produtividade agregada no Brasil nas últimas décadas têm deixado o Brasil em pior posição em relação ao resto do mundo. Citando o artigo de Ellery (capítulo 2), fica claro, conforme mostra o gráfico abaixo, que “a taxa de crescimento da produtividade no Brasil é baixa em termos absolutos e relativos. A partir de informações similares, usando a mesma base de dados – a PWT – e as mesmas definições, o autor mostra que “o Brasil sequer foi capaz de acompanhar o crescimento da fronteira tecnológica entre 1970 e 2011”. Por esses cálculos, entre 1970 e 2011, nos EUA a produtividade do trabalho cresceu 85%, a produtividade do trabalho ajustada pelo capital humano 58% e a PTF cresceu 38%. No mesmo período, o autor mostra que, no Brasil, a produtividade do trabalho cresceu 74%, e apenas 4% quando ajustada por capital humano, e a PTF caiu perto de 10%” (p. 36).

O dado preocupante é que a produtividade no Brasil está estagnada há mais de 30 anos e a economia só cresce, mesmo que em ritmo lento, devido ao incremento da taxa de atividade da força de trabalho (em decorrência do bônus demográfico). As razões para a baixa produtividade no Brasil podem ser atribuidas aos seguintes fatores:

Em primeiro lugar, à tecnologia, especialmente as tecnologias de processo que possibilitam uma maior
produção física a partir de uma mesma utilização de fatores, quanto as tecnologias/inovações de produto, que possibilitam preços maiores por uma mesma quantidade física de produtos.

Em segundo lugar, outro fator que, no longo prazo, é crucial para a ampliação da produtividade é a educação e a qualificação da mão de obra. O Brasil tem ampliado de forma significativa a escolaridade média de sua população, contudo, ainda há questões relevantes associadas tanto à qualidade da educação, quanto às áreas de formação em nível superior e nível médio.

Também são as deficiências de infraestrutura. Décadas de baixo investimento deixaram patente a insuficiência crônica de infraestrutura para sustentar o processo de crescimento econômico brasileiro.

Fator não menos importante é o custo do trabalho e o custo provocado por uma legislação trabalhista complexa e desatualizada.

Outro fator, são os acidentes de trabalho e a licenças de doença. Quase cinco milhões de trabalhadores (4,948 milhões) se acidentaram no Brasil em um ano, entre 2012 e 2013, segundo dados da Pesquisa Nacional de Saúde, do IBGE, o que mostra a falta de segurança no trabalho no Brasil e os problemas que geram para os trabalhadores e para a economia.

A imobilidade urbana também prejudica a produtividade do trabalho, pois, nas grandes cidades muitas pessoas gastam horas diárias no deslocamento entre a casa e o trabalho. É um desperdício de tempo que prejudica as firmas, as pessoas e as famílias.

Por fim, há a questão do ambiente de negócios ou de qualidade das instituições. A excessiva burocracia (não apenas pública) se manifesta desde a chegada ou a saída de mercadorias nos portos, até o registro de um novo medicamento ou patente, passando pela lentidão da justiça ou pela complexidade da estrutura tributária brasileira.

Podemos acrescentar mais dois pontos que afetam a produtividade. Um é o rebaixamento das expectativas de investimento e a insegurança jurídica provocada pelas práticas de corrupção. O outro é a crise ambiental, cuja crise hídrica é a face mais visível. Mas o desmatamento, as mudanças climáticas e a poluição em todas as suas vertentes são fatores que aumentam os custos e diminuem os retornos para a população e a sociedade.

Os autores concluem: “A persistência desse fraco desempenho da produtividade, mesmo em conjunturas de maior crescimento do produto, como foi o período 2003-2008, remete a causas estruturais, mais profundas e complexas do que problemas conjunturais ou crises transitórias. A busca pelas razões que mantêm o baixo crescimento da produtividade, mesmo em um contexto de crescimento econômico, constitui uma das principais questões da economia brasileira atualmente” (p. 48).

Os últimos dados divulgados pelo IBGE, em dezembro de 2015, mostram que o Brasil vive uma recessão profunda com inflação alta (estagflação). O principal fator de queda do PIB foi a retração do investimento. Isto agrava a questão da produtividade e pode jogar o país em uma depressão.
Portanto, o Brasil tem um sério problema econômico e a baixa produtividade é o grande entrave ao desenvolvimento e explica as dificuldades para melhorar a qualidade de vida da maioria da população e o apequenamento do país no cenário internacional.

 

José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

 

in EcoDebate, 09/12/2015

[cite]

 

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One thought on “Baixa produtividade da força de trabalho no Brasil, artigo de José Eustáquio Diniz Alves

  • Além da baixa produtividade da economia brasileira, o Brasil não tem espaço para mais impostos. O produto brasileiro está perdendo competitividade internacional, baixando substancialmente as exportações.
    Há que eliminar toda uma extensa variedade de impostos, muitos deles em regime cumulativo, e introduzir um imposto único a exemplo da União Europeia.

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