Externalidades, Educação Ambiental e Economia Verde, artigo de Antonio Silvio Hendges
Externalidades, Educação Ambiental e Economia Verde, artigo de Antonio Silvio Hendges
[EcoDebate] Durante minha palestra sobre a educação ambiental e as representações sociais no Congresso Nacional de Meio Ambiente e Sustentabilidade – CONMAS, realizado de 08 a 14/09/2015 e transmitido online, recebi alguns questionamentos que foram respondidos pessoalmente aos solicitantes, mas por se tratarem de temas de interesse coletivo e serem questões importantes para o desenvolvimento da educação ambiental e da sustentabilidade, seguem-se as questões com meus comentários e respostas. Agradeço aos que participaram da minha palestra no CONMAS, aos elogios recebidos e aos que enviaram os questionamentos e outros comentários sobre o tema abordado.
1 – O que são externalidades?
Este é um conceito fundamental em economia e contabilidade ambiental. Os recursos naturais são a base da economia e no desenvolvimento da sociedade industrial e tecnológica foram considerados inesgotáveis e gratuitos. No entanto, atualmente a demanda por estes recursos naturais é aproximadamente 35% superior à capacidade de renovação.
As externalidades são os efeitos ambientais, sociais, sobre a saúde, os ecossistemas, a economia de longo prazo, indiretamente causados pela produção, distribuição, consumo e descarte dos resíduos dos produtos do consumo em seus ciclos de vida. São os custos relacionados aos impactos – negativos ou positivos, imediatos ou de longo prazo – sobre o conjunto da sociedade, inclusive sobre aqueles que não participaram das decisões e/ou benefícios econômicos decorrentes.
Estas externalidades, quando não são calculadas e seus valores repassados aos custos finais dos produtos, resultam em uma escala de impactos que são pagos por toda a sociedade durante todo o ciclo de vida destes produtos, desde a extração da matéria prima até o seu descarte pós uso ou obsolescência. Neste sentido, as externalidades não calculadas e incorporadas mascaram e subsidiam os valores reais dos produtos, beneficiando economicamente aos que comandam as cadeias de produção e socializando os custos, prejuízos e impactos ambientais decorrentes.
2 – A educação ambiental depende de classe social? Ou seja, indivíduos mais esclarecidos têm condições de desenvolver a educação ambiental?
A educação ganhou o adjetivo ambiental por uma característica cartesiana de divisão dos conhecimentos em oposição aos pensamentos e ações complexas e interativas. Neste sentido, o que se denomina de educação ambiental estritamente interpretada nos conceitos tradicionais pode ser considerada como um adestramento ambiental, descontextualizado e sem relações com uma educação integrada, transdisciplinar, dialógica, multicultural e socialmente construída. A educação ambiental deve ser considerada mais no sentido contrário, articulando os conhecimentos para a construção de uma educação cidadã e que construa atitudes, valores, capacidades, conhecimentos e possibilidades de ação individuais e/ou coletivas ambiental e socialmente responsáveis.
E para isso, deve tomar como base em seus projetos as representações sociais¹ sobre meio ambiente e outros aspectos das comunidades e/ou grupos em que são desenvolvidos os projetos e, portanto não depende de aspectos relacionados com as classes sociais o que a tornaria elitista, elitizada, enciclopédica, ilustrativa, comunicada (de um grupo que sabe mais – Sabe mesmo? – para outros que sabem menos). Ao tomarem-se as representações sociais como base do desenvolvimento dos projetos formais ou informais de ensino/aprendizagem, é necessário identificarem-se os conhecimentos, costumes, práticas, condições econômicas, geográficas, de produção, consumo e outros aspectos socialmente estabelecidos em que estão inseridos os educadores e os educandos envolvidos nos processos.
Ao contrário do modelo estabelecido para a educação convencional, a universalidade da educação ambiental não pode ser compartimentada, comunicada, exclusivista e metodologicamente imposta como se um grupo economicamente destacado, que inclusive é responsável por grande parte dos impactos ambientais e sociais, seja mais legítimo e com isso auto estabeleça o direito de demandar seus conceitos e visões históricas. Outra questão fundamental é que esclarecimento e conhecimento não estão relacionados com as classes sociais, sendo estas, produtos das relações econômicas e não das capacidades individuais ou coletivas. A educação ambiental é a educação sem divisões conceituais, integrando os conhecimentos teóricos e as práticas aos diferentes contextos em que são desenvolvidos os processos educativos e considerando as dimensões humanas, ambientais, econômicas, sociais e tecnológicas do atual estágio de desenvolvimento e evolução da humanidade.
3 – A economia verde no Brasil terá futuro?
A economia verde não pode ser uma forma de mascarar a continuidade do mesmo modelo baseado na exploração dos recursos naturais, centralização e controle dos lucros e socialização dos prejuízos sociais e passivos ambientais. Precisa ser mais que auto declaratória, rever os conceitos clássicos em que os recursos naturais são insumos para o desenvolvimento linear e constante e ter uma concepção mais cíclica e orgânica dos processos. Também é indispensável a substituição da matriz energética atual dos combustíveis fósseis e a erradicação dos desmatamento, queimadas e outras ações ilegais sobre os biomas.
Em uma economia verde os produtos devem ser ambiental e socialmente responsáveis, incorporando as externalidades de suas cadeias produtivas e ciclos de vida, com os diversos agentes econômicos – produtores, indústria, distribuidores, comércio e consumidores – assumindo as suas responsabilidades nos processos, preferindo produtos locais, cooperando consumidores e produtores, substituindo o modelo de externalidades descontroladas para uma economia inclusiva, com a otimização do uso dos recursos naturais, responsabilidade compartilhada pelos ciclos de vida dos produtos, preservação dos recursos hídricos, recuperação e manutenção da fertilidade dos solos, incentivos para a agroindústria e agregação de valor aos produtos da agricultura familiar, fontes múltiplas de energia (solar, eólica, bioenergias, biocombustíveis, por exemplo) e outras ações que diversifiquem as decisões de produção, distribuição e consumo.
Com a realização da COP 21 – Conferência das Partes da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima – de 30/11 a 11/12/2015 e a declaração conjunta do Brasil e dos EUA anunciada pelos governos do Brasil e EUA em 30 de junho, estas ações podem ser dinamizadas e pautar várias iniciativas brasileiras voltadas à redução das emissões de gases de efeito estufa e ao desenvolvimento de uma economia de baixo carbono. Isso pode contribuir para que o país aumente a sua eficiência e desenvolva tecnologias industriais mais limpas e competitivas, que podem inclusive serem transferidas, gerando novos negócios e estimulando inovações que aumentem a competitividade interna e externa da economia.
Mas para acontecer esta transição para uma economia de baixo carbono, há necessidade de criarem-se incentivos, mecanismos de financiamento e políticas públicas que estimulem o desenvolvimento em escalas competitivas e economicamente viáveis das oportunidades e das inovações, que devem convergir às exigências dos cidadãos e dos mercados consumidores internos e externos quanto à produção, distribuição e consumo ambientalmente menos impactante. Neste sentido, entendo que o Brasil tem todas as condições para desenvolver-se economicamente sendo responsável com seus recursos naturais e outros aspectos ambientais, inclusive tornando-se referência para outras experiências macro econômicas, principalmente nos países da América Latina.
¹ Em 1961, Serge Moscovici publicou na França o livro A Representação Social da Psicanálise, retomando as pesquisas de Émile Durkhein que publicou em 1895 o livro Regras do Método Sociológico. Moscovici passa a denominar as representações como sociais e não mais coletivas como os autores precedentes. “O caráter social das representações transparece, segundo Moscovici, na função específica que elas desempenham na sociedade, qual seja, a de contribuir para os processos de formação de condutas e de orientação das comunicações sociais” (REIGOTA, 2001, p. 69). As representações sociais são um conjunto de princípios que interagem e são compartilhados por diferentes grupos que atuam na sociedade, que compreendem e transformam suas realidades a partir delas. Possuem caráter transversal e multidisciplinar amplo e podem referenciar a formação de conceitos articuladores entre diferentes práticas e conhecimentos. Com o desenvolvimento tecnológico e científico, a globalização econômica e a sociedade da informação, as representações sociais tornam-se referência indispensável nas pesquisas sobre assuntos contemporâneos como a educação ambiental.
Antonio Silvio Hendges, Articulista no EcoDebate, professor de Biologia, pós graduação em Auditorias Ambientais, assessoria em educação ambiental e sustentabilidade – www.cenatecbrasil.blogspot.com.br
in EcoDebate, 28/09/2015
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