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Notícia

Nota Pública da ASIBAMA/RJ – Licenciamento Ambiental Federal: Resistindo Aos Ataques

 

nota pública

A Associação dos Servidores Federais da Área Ambiental no Estado do Rio de Janeiro (ASIBAMA/RJ) vem a público explicitar uma série de fatos negativos pelos quais vem passando o licenciamento ambiental dos empreendimentos marítimos de petróleo e gás natural. Tais fatos, intensificados nos últimos meses, jogam por terra os avanços obtidos pelo setor do IBAMA que realiza esse licenciamento e colocam em risco um trabalho que vem sendo construído há cerca de 13 anos por um grupo de servidores públicos federais comprometidos com a sociedade brasileira, com o desenvolvimento mais justo e com a conservação ambiental.

O Licenciamento Ambiental busca analisar se há viabilidade socioambiental para a instalação de empreendimentos potencialmente poluidores em uma dada localidade, assegurando que os impactos socioambientais e riscos decorrentes de sua implantação sejam conhecidos, divulgados, debatidos, monitorados, avaliados, evitados, mitigados e compensados. O licenciamento ambiental deve ser considerado como uma conquista de toda a sociedade, pela possibilidade de ruptura com a lógica perversa onde as empresas poluidoras individualizam os lucros e impõem à sociedade os prejuízos.

No entanto, via de regra, os empreendedores interessados no desenvolvimento de suas atividades poluidoras acusam o Licenciamento Ambiental de ser excessivamente lento, burocrático, complexo, discricionário, dispendioso, um grande entrave ao desenvolvimento. Já as comunidades que serão impactadas pela poluição e degradação decorrentes dos empreendimentos acusam o Licenciamento Ambiental de ser açodado, pouco criterioso e pouco participativo. No discurso hegemônico dos que têm maior entrada nos meios formais de comunicação e influência política, invariavelmente a primeira versão é a mais divulgada e defendida, inclusive, dentro dos órgãos governamentais. Como resultado, não há um novo Ministro do Meio Ambiente, ou um novo Presidente do IBAMA ou Diretor de Licenciamento que não entre no cargo defendendo a batida bravata de “agilizar” o licenciamento.

No atual cenário de crise econômica, torna-se previsível a intensificação das tentativas de flexibilização da legislação ambiental, dando um novo fôlego aos inflamados discursos contra a “burocracia” do Licenciamento Ambiental. Porém é preocupante a defesa e imposição desta pauta dentro do próprio IBAMA, órgão que deveria defender publicamente os avanços e conquistas socioambientais históricas obtidas por meio das ferramentas de gestão ambiental que visam tornar efetivo o direito de todos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, princípio matriz contido no caput do art. 225 da Constituição Federal. No entanto, hoje, a agenda da Diretoria de Licenciamento Ambiental do IBAMA prioriza as demandas dos empreendedores em detrimento das demais partes interessadas. Ao mesmo tempo, desqualifica decisões técnicas há muito internalizadas pelas coordenações de Licenciamento.

ENTENDA O QUE ESTÁ ACONTECENDO NO LICENCIAMENTO DE PETRÓLEO E GÁS

– O Licenciamento Ambiental Federal das atividades marítimas de Exploração e Produção de Petróleo e Gás é conduzido pela Coordenação-Geral de Petróleo e Gás (CGPEG) do IBAMA. Trata-se de um escritório sediado no Rio de Janeiro, com cerca de 80 analistas ambientais concursados, com experiência acumulada em mais de 13 anos na condução, análise e acompanhamento dos processos de Licenciamento de atividades realizadas no ambiente marinho em qualquer ponto do Brasil.

– A CGPEG é subordinada à Diretoria de Licenciamento Ambiental (DILIC), sediada na sede do IBAMA em Brasília/DF. O Diretor da DILIC e o Presidente do IBAMA são indicados pela Ministra do Meio Ambiente. Esta, por sua vez, é indicada diretamente pela Presidência da República. Compete à Presidente do IBAMA assinar toda e qualquer Licença Ambiental expedida, seguindo – ou não – as recomendações apresentadas nos Pareceres Técnicos pelos servidores que trabalham na DILIC, que detêm atribuição legal e funcional para o exercício do Licenciamento.

– As três etapas principais da cadeia de empreendimentos marítimos da indústria petrolífera e que são ambientalmente licenciados pela CGPEG são: (i) Atividade de Pesquisa Sísmica Marítima; (ii) Atividade de Perfuração de Poços Exploratórios; e (iii) Atividade de Produção e Escoamento de Petróleo e Gás Natural. Cada uma destas etapas apresenta características e impactos ambientais específicos e são licenciadas separadamente.

– Após um relativo período de calmaria do setor petrolífero no Brasil, o mercado foi novamente aquecido em 2013, após a 11° Rodada de Licitações de Blocos da ANP, a Agência Nacional de Petróleo, Gás e Biocombustíveis. A grande novidade do 11° leilão da ANP foi a oferta de Blocos na Margem Equatorial brasileira (Bacias Sedimentares Potiguar, Ceará, Barreirinhas, Pará-Maranhão e Foz do Amazonas). Tratam-se de áreas consideradas como “nova fronteira exploratória”, destacadas pela elevada sensibilidade ambiental, pelo baixo grau de conhecimento biológico, pela grande vulnerabilidade socioambiental e pela carência de infraestrutura que possa absorver os empreendimentos ligados à cadeia produtiva do petróleo e gás.

– Posteriormente ao leilão da ANP, várias empresas de pesquisa sísmica solicitaram abertura de processo de Licenciamento na CGPEG. Muitos dos empreendimentos pretendidos estavam em sobreposição espaço-temporal. Como exemplo, na Bacia Potiguar foram abertos 8 (oito) pedidos de licenciamento para a mesma área, por empresas diferentes. Foi estabelecida uma verdadeira corrida especulativa pela Licença Ambiental. As empresas de aquisição de dados sísmicos pretendiam usar as licenças obtidas como moeda para alcançar um diferencial competitivo no mercado. Algumas empresas de perfuração de poços (que contratam os serviços sísmicos) chegaram a divulgar que as empresas com Licenciamento Ambiental concluído junto ao IBAMA obteriam prioridades contratuais. A sobreposição de pedidos de licenças nas mesmas áreas impactou o andamento processual na CGPEG, pois não há quantitativo de pessoal para conduzir de forma criteriosa uma enormidade de processos simultâneos, sendo a maior parte destes de caráter especulativo, ou seja, de atividades que nunca chegariam a acontecer.

– Diante deste cenário, a CGPEG convocou uma série de reuniões com as empresas de pesquisa sísmica numa tentativa de gerir as atividades especulativas pleiteadas, buscando um acordo com a indústria para que só fossem mantidos em aberto os processos onde as atividades estavam planejadas de fato, dentro do cronograma real das empresas. O resultado das reuniões foi praticamente inócuo, e a maioria das empresas mantiveram interesse nos processos de licenciamento abertos, mesmo aquelas que não tinham uma clara intenção de operar. Em vista disso, após esgotadas todas as possibilidades de previsão do cenário real de atividades, a CGPEG optou por considerar o pior cenário, incluindo a sinergia de impactos de todas as atividades, com a exigência de serem implementados projetos ambientais robustos para a continuidade dos respectivos licenciamentos. Importante ressaltar que os projetos ambientais foram propostos considerando-se a sobreposição e o adensamento de atividades da cadeia produtiva de petróleo (incluindo as etapas de perfuração e produção). No entanto, sua viabilidade e pertinência também se justificam pelos claros ativos ambientais da região de nova fronteira, mesmo num cenário onde as sobreposições não ocorressem. O que mudaria, neste caso, seria o dimensionamento e o tempo de execução dos projetos ambientais propostos.

– Para viabilizar o compartilhamento dos projetos ambientais por várias empresas de sísmica e, posteriormente, com as de perfuração, tendo fulcro na Portaria MMA 422/2011, a CGPEG, deu início a uma série de reuniões com as empresas e sua instância representativa, o IAGC (Associação Internacional dos Contratantes de Serviços Geofísicos, em tradução livre do inglês). Buscava-se, nestes eventos, o nivelamento das expectativas técnicas sobre os projetos ambientais propostos, bem como o detalhamento dos requisitos conceituais e práticos para sua viabilização, em áreas de complexidade logística crítica.

– As empresas, via IAGC, iniciaram o desenvolvimento conceitual e o planejamento executivo-financeiro para atender as requisições da CGPEG. Os prazos para a emissão das licenças acabaram sendo dilatados, em boa parte devido ao cenário complexo criado pela própria indústria.

– No entanto, no meio desta construção, as empresas entraram em contato direto com a nova diretoria da DILIC em Brasília, movimento já iniciado via Instituto Brasileiro do Petróleo (IBP), por meio de um Acordo de Cooperação Técnica firmado entre o IBAMA e o IBP (este Acordo foi criticado pelos analistas da CGPEG por meio da Nota Informativa CGPEG/DILIC/IBAMA N° 04/15, de 27.2.2015). Aliados às pressões governamentais pela aceleração do Licenciamento Ambiental na Margem Equatorial, foi criada a “Sala de Situação de Sísmica” – com representação do Ministério das Minas e Energia (MME), ANP, CGPEG e DILIC.

– Inicialmente, a equipe técnica da CGPEG entendeu que a Sala de Situação de Sísmica poderia abrir a possibilidade de se criarem marcos regulatórios importantes que impedissem os pedidos especulativos de licença em sobreposição espaço-temporal. No entanto, de forma surpreendente, tal assunto foi apenas tangenciado na primeira reunião da Sala de Situação. Sequencialmente, passou-se a um forte movimento de questionamento dos projetos ambientais propostos pela CGPEG para os licenciamentos de sísmica na Margem Equatorial. O que se criou com a Sala de Situação, de fato, foi um espaço privilegiado para a indústria pautar seus interesses junto ao Diretor de Licenciamento Ambiental, Senhor Thomaz Miazaki de Toledo. Cumpre esclarecer que o diálogo técnico é comum e legal no escopo das ações do Licenciamento. O problema é quando se oportuniza um espaço diferenciado para apenas uma das partes interessadas. Por que não está na Sala de Situação a representação das comunidades que receberão os impactos? Ou as ONGs, Universidades, associações de pescadores e pescadoras, o Ministério Público, os órgãos ambientais estaduais, etc.?

– Fato é que, com a formalização da Sala de Situação de Sísmica, as discussões técnicas em curso entre a CGPEG e o IAGC foram abruptamente interrompidas, com todas as facilidades pleiteadas pelas empresas sendo diretamente avaliadas pela diretoria da DILIC. As empresas foram instruídas, pelo Diretor de Licenciamento Ambiental, a se manifestarem quanto a eventuais divergências a respeito das análises da CGPEG (Ofício 02001.006185/2015-76 DILIC/IBAMA). Com isso, as empresas encaminharam argumentos solicitando a exclusão de parte dos projetos ambientais dos processos de Licenciamento já em curso, em fase avançada de análise.

– Diante da polêmica – as empresas solicitando exclusão dos Projetos Ambientais, a CGPEG mantendo seu posicionamento técnico pela manutenção dos mesmos – a presidência do IBAMA deliberou por reunir seu Conselho Gestor para uma tomada de decisão. O Conselho Gestor do IBAMA é uma instância colegiada que inclui a Presidência, todos os Diretores e a Procuradora-Chefe do órgão, normalmente sendo convocado em situações críticas como a avaliação do indeferimento de Licenças polêmicas, no que ficou definido como “Comissão de Avaliação e Aprovação de Licenças”. Nesta ocasião, foi aberto no dia 2.7.2015 um espaço para as empresas apresentarem seus argumentos contrários à realização dos projetos ambientais solicitados pela CGPEG, e, posteriormente, no dia 3.7.2015, para a CGPEG defender seus argumentos pela manutenção dos mesmos (Atas de Reunião Nºs 02001.000133/2015-96 e 02001.000134/2015-31). Diante da controvérsia estabelecida, o Conselho Gestor não se posicionou imediatamente, até porque nenhum dos representantes, à exceção do Diretor de Licenciamento, possuía conhecimento sobre o Licenciamento Ambiental de atividades marítimas de petróleo e gás, sobretudo, em relação à atividade de pesquisa sísmica.

– A CGPEG manteve o seu posicionamento técnico, defendendo de forma clara, pública e processual a importância dos projetos ambientais de monitoramento e avaliação de impactos, sem os quais não havia possibilidade de sugestão de deferimento das licenças pleiteadas. Neste sentido, no contexto da reunião de defesa dos projetos, a CGPEG emitiu os 2 Pareceres Técnicos (PAR 02022.000312/2015-85 COEXP/IBAMA de 2.7.2015 e PAR. 02022.000378/2015-75 COEXP/IBAMA de 29.7.2015) compilando argumentos para a manutenção dos projetos ambientais propostos.

– Dentre as várias licenças solicitadas para a Margem Equatorial, a primeira em análise pela Sala de Situação de Sísmica é a pleiteada pela empresa PGS, para realização da atividade de pesquisa sísmica marítima na Bacia Sedimentar do Ceará. Em suma, foi solicitada pela PGS a exclusão dos seguintes projetos ambientais: i) Projeto de Monitoramento de Praias; ii) Projeto de Monitoramento de Mamíferos Marinhos por meio de Senso Aéreo; e iii) Projeto de Avaliação da Mortalidade de Larvas de Lagosta em Resposta aos Impactos da Sísmica.

– As argumentações constantes nos Pareceres Técnicos da CGPEG foram alvo de nova discussão em reunião do Conselho Gestor do IBAMA em 31.7.2015 (Ata de Reunião N° 02001.000161/2015-11). Na ocasião, segundo consta em ata, “O Diretor da DILIC informou que circulou cópia do parecer técnico emitido no dia 29/07/2015, contendo o resultado da reunião técnico informativa e novo pronunciamento da equipe técnica a respeito da pertinência dos programas ambientais questionados. A PGS solicita a exclusão de três programas ambientais: i) Programa de Monitoramento de Praias; ii) Programa de Monitoramento Aéreo e iii) Programa de Monitoramento de Lagostas. O Diretor discorreu sobre a análise registrada no parecer sobre cada um dos programas. O Parecer Técnico se preocupou em avaliar melhor a correlação dos programas com os impactos associados à atividade de sísmica. Lembrou que na reunião da Comissão de Avaliação e Aprovação de licenças de 10 de julho ficou evidenciada a falta de discussão sobre a correlação dos programas com a matriz de impactos associada à atividade em análise. O parecer trouxe a relação dos impactos de alta, média e baixa importância que podem ser relacionados aos programas em discussão”. E segue: “O Diretor manifestou que os referidos projetos buscam o aprimoramento dos estudos ambientais. Esses aprimoramentos poderiam, por exemplo, levar à identificação de impactos que o modelo empregado nos Estudos não caracterizou. Há uma intenção em aprofundar a discussão dos impactos associados à atividade e dos prognósticos trazidos pelos estudos ambientais. A presidente e os diretores se manifestaram no sentido de que, na Margem Equatorial, tendo em vista a limitação de informações existentes, um Programa de Monitoramento de Praias de abrangência regional seria relevante na busca do aperfeiçoamento da avaliação dos impactos ambientais” (…) “A Presidente do Ibama defendeu a realização de um programa desta natureza, contudo ressaltou que o formato apresentado no licenciamento ambiental é desproporcional à atividade de sísmica. Desta forma, a Comissão de Avaliação e Aprovação de licenças deliberou por reconhecer a importância da realização de um Programa de Monitoramento de Praias, como medida adicional aos programas ambientais exigidos no âmbito do licenciamento ambiental das atividades de sísmicas. Em razão de se tratar de monitoramento ambiental, mais amplo do que o monitoramento de impactos ou de medidas de mitigação específicas, a Comissão deliberou por excluir a exigência deste programa na licença de sísmica”. “O Diretor de licenciamento ambiental concordou com a proposta, uma vez que o monitoramento proposto pelo Programa deve ser realizado em médio e longo prazos e não durante os poucos meses de desenvolvimento da atividade de sísmica”. “Com relação ao Programa da Lagosta, a Comissão recomendou que a proposta de monitoramento complementar ao licenciamento trate da questão da pesca na Margem Equatorial de forma mais ampla, não se limitando à lagosta. O Diretor da DBFLO informou que irá se atualizar sobre a situação do monitoramento pesqueiro, que no passado era feito pelo Ibama, mas cuja atribuição foi repassada ao Ministério da Pesca e Aquicultura.” “Sobre o Monitoramento Aéreo, em diversas intervenções dos Diretores avaliou-se que o principal objetivo seria a aquisição de informações sobre rota de mamíferos, informação esta ainda pouco conhecida para a Margem Equatorial. As condicionantes da licença já exigem a presença de observadores na embarcação de sísmica para mitigar o impacto da atividade sobre estas espécies. Aqui também se identifica a necessidade de um programa de caráter regional com equipamentos e metodologia adequados às características da região”. “A Presidente do Ibama propôs o seguinte encaminhamento: (i) os três programas são importantes, mas sua abrangência deve ser regional e de longo prazo; (ii) para a sísmica, atividade de curto prazo, a empresa deverá reforçar, dentro do Programa de Comunicação Social, a orientação à comunidade local para direcionar todas as constatações de impactos ao Ibama e à empresa, para avaliação no âmbito do licenciamento ambiental e eventuais providências; (iii) o Ibama irá propor à ANP um A[cordo] de C[ooperação] T[écnica] para buscar formas de implementação de programas de monitoramento da Margem Equatorial complementares ao licenciamento ambiental; e (iv) a DILIC irá minutar a licença, sem a exigência de realização dos três programas questionados. [todos os grifos são nossos].

– Não bastasse a transferência de uma responsabilidade de avaliação dos impactos ambientais causado pela indústria para a população, por meio de Projetos de Comunicação Social, a saída do Conselho Gestor foi apontar uma solução etérea (Acordo de Cooperação Técnica com a ANP), sem que haja nenhuma garantia que as ações “de monitoramento de longo prazo” sejam viabilizadas para garantirem informações técnicas para os empreendimentos que estão prestes a acontecer.

– Ademais, é incorreta a avaliação de que somente os projetos de longo prazo seriam eficientes para geração de dados úteis para o monitoramento e a avaliação de impactos. Tal assertiva transfigura-se numa resposta útil aos pleitos das empresas, desonerando o poluidor das ações necessárias para a avaliação dos impactos socioambientais aportados com os empreendimentos licenciados.

– Em tempo, em 31.7.2015 foi solicitado pelo Diretor da DILIC por meio do MEM. 02001.011814/2015-80 DILIC/IBAMA que a CGPEG encaminhasse a minuta da licença pleiteada pela PGS, sem que a análise processual e técnica fosse sequer concluída. Destaca-se aqui que essa é a primeira de uma série de Licenças previstas para atividades de pesquisa sísmica na Margem Equatorial brasileira.

A Licença Ambiental da PGS foi emitida pela presidente do IBAMA em 18.8.2015 (Licença de Pesquisa Sísmica nº103/2015), com os três projetos mencionados cortados. Outro programa previsto – o Plano de Manejo de Aves em Embarcações Sísmicas – também acabou cortado da Licença, sem maiores justificativas.

– Ainda que não haja aparente ilegalidade na atitude da DILIC, nos causa surpresa e apreensão a excessiva abertura para a representação do setor industrial, parte diretamente interessada na facilitação dos processos de Licenciamento, e as crescentes dificuldades impostas para o debate público e aberto com os demais setores sociais. Causa também preocupação a utilização do Conselho Gestor para a definição de retirada ou flexibilização de condicionantes, sem que este tenha acúmulo de conhecimento técnico suficiente no tema.

O precedente aberto no caso acima relatado poderá incidir em outras tipologias submetidas ao Licenciamento Ambiental, fragilizando de maneira generalizada as medidas de avaliação, controle e monitoramento preconizadas.

– Vale citar que em 14.7.2015 foi realizada uma Reunião Técnica Informativa – RTI (instrumento semelhante à Audiência Pública, prevista na Resolução Conama 350/2004) em Fortaleza, como parte do processo da PGS de Licenciamento Ambiental na Margem Equatorial (Processo 02022.002094/13-54, citado acima). Entretanto, o edital de convocação da RTI foi encaminhado à DILIC para publicação com apenas 15 dias de antecedência para sua realização e os Relatórios Ambientais de Sísmica (RIAS), documento base para informação da população, só começaram a ser distribuídos um dia após a data da convocação. Como resultado, muitos RIAS foram recebidos pelas partes interessadas em datas muito próximas à realização da RTI, ou mesmo após sua realização. Como consequência, a RTI teve baixa representatividade dos principais grupos sociais afetados pela atividade de pesquisa sísmica marítima: as comunidades pesqueiras.

– Contribuindo para piorar ainda mais o cenário, desde 2014 vem ocorrendo um progressivo cerceamento da liberdade de comunicação imposto pela DILIC aos analistas ambientais lotados no Licenciamento Ambiental, o que impacta diretamente na capacidade de gestão e acompanhamento dos projetos ambientais propostos. Qualquer comunicação entre o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e o Licenciamento Ambiental do IBAMA tem que ser centralizada nas Diretorias. Tal decisão compromete a celeridade e efetividade de trocas de informações entre as duas autarquias e criam empecilhos ao funcionamento de parcerias históricas construídas entre o IBAMA e o ICMBio, desarticulando ações conjuntas que fortaleciam as demandas por projetos cuja abrangência incluía espécies ameaçadas ou áreas protegidas. Todas as formas de comunicação passaram a ser controladas pela DILIC. Com base na Portaria n° 55/2014, o Diretor de Licenciamento afirma, por meio do MEM 02001.012017/2014-39 DILIC/IBAMA, que “a CGPEG não detém autonomia para emitir comunicações a órgãos federais, sejam diretorias, chefias de centros e unidades de conservação ou coordenações regionais”. Digno de nota, a Asibama/RJ solicitou à presidência do IBAMA e à DILIC a revisão dos fluxos documentais entre a DILIC e o ICMBio por meio do Ofício 20/2014, de 30.12.2014. Até o momento não houve nenhuma resposta aos questionamentos dos servidores.

– Em mais um ato de cerceamento dos direitos para o exercício pleno das atribuições funcionais no Licenciamento Ambiental, em 2012, as Portarias de Fiscalização de todos os servidores do IBAMA lotados na DILIC foram autoritariamente revogadas, sem nenhuma comunicação prévia ou justificativa. Desprovidos da Portaria, os analistas ambientais não podem atuar como fiscais, não podem aplicar multas, notificações ou embargos, perdem o poder de polícia. Significa que se um analista ambiental que trabalha no Licenciamento constatar um ilícito ambiental durante suas atividades de rotina, o que é muito frequente, não terá competência formal para aplicar as medidas legais cabíveis. Restringir-se-á a registrar o ilícito e encaminhar para a DILIC que, por sua vez, encaminhará para a Diretoria de Proteção Ambiental do IBAMA (DIPRO), que encaminhará para um servidor com Portaria para analisar a questão e aplicar as sanções cabíveis, de acordo com a Portaria IBAMA N° 27, publicada no Boletim de Serviço de 27.11.2014. Além de gerar excessivos passos burocráticos desnecessários, lentidão para a tomada de decisão e duplicidade de esforços de analistas ambientais da mesma carreira, a medida dificulta o rastreamento das ações de fiscalização no Licenciamento Ambiental e transfere para os Diretores da DILIC e da DIPRO a discricionariedade para decidir o que deve e o que não deve ser fiscalizado. Desde então, a CGPEG encaminhou inúmeros Pareceres constatando ilícitos para a DILIC, sem ter havido qualquer resposta sobre seu encaminhamento ou não para autuação por um agente da DIPRO. Essa situação foi alvo de questionamento por parte da Asibama/RJ (Ofício n° 017/2014 de 22.12.2014) nunca tendo sido recebida qualquer resposta da Presidência do IBAMA ou das Diretorias envolvidas. Em suma, cortam-se os projetos, retiram-se a atribuição de fiscalização, centralizam-se todas as decisões na DILIC, que hoje procede desconsiderando avaliações técnicas de suas coordenações. O resultado é um processo ainda mais lento, burocrático e frágil do ponto de vista da proteção ambiental.

Não temos dúvidas de que nosso relato exemplifica diversos casos que ocorrem sistematicamente no IBAMA e pode dimensionar também a intensidade dos ataques que estão por vir. Esta não foi e nem será uma exclusividade da CGPEG.

Dessa forma, é alarmante a perspectiva que seja implementada no âmbito do licenciamento ambiental federal uma prática de exclusão de projetos ambientais propostos pelos técnicos do IBAMA como condicionantes de licença, sem considerar a importância destes como medidas de avaliação e controle dos impactos dos empreendimentos. Também é preocupante que não se enfrente o debate sobre a sinergia dos impactos ambientais em áreas de elevada sensibilidade, o problema da precariedade das informações diagnósticas apresentadas nos Estudos Ambientais e a tentativa de minimizar a importância do componente social como fator relevante para a tomada de decisões.

O cenário que se desenha aponta para um mecanismo autorregulatório no qual a os empreendedores e suas consultoras subcontratadas para elaboração dos Estudos Ambientais serão responsáveis pela proposição das medidas de avaliação e monitoramento fragilizando a função do IBAMA e seu protagonismo.

Mas gostaríamos de questionar até onde o poder discricionário de nossos gestores pode se sobrepor às análises técnicas que tem o objetivo, justamente, de subsidiar decisões de gestores que, por terem uma função distinta, não têm a obrigação de dominar amplamente todos os assuntos e sequer tem o tempo necessário para se aprofundar nas questões técnicas referentes a todas as tipologias do licenciamento ambiental federal.

É premente que as tomadas de decisão que não estejam em consonância com os Pareceres Técnicos das equipes de analistas do IBAMA, sejam justificadas com o mesmo rigor técnico que as equipes elaboram seus argumentos sem a recorrente tentativa de relativizar os impactos socioambientais dos empreendimentos e de manter na invisibilidade as populações e povos tradicionais atingidos.

Por isso, ressaltamos que somos contra a tentativa de flexibilização e simplificação do licenciamento que busque torná-lo cartorial. Defendemos, sobretudo, a continuidade e evolução de um trabalho sério, construído com diálogo e embasamento técnico, que garantiu legitimidade e segurança jurídica a todas as licenças emitidas para o setor de petróleo e gás na última década e trouxe o reconhecimento do IBAMA como um órgão capaz de cumprir a sua missão institucional na condução dos processos de Licenciamento Ambiental.

Sabemos que o Licenciamento Ambiental Federal precisa melhorar suas ferramentas para abarcar a participação mais efetiva dos atores historicamente excluídos dos processos decisórios nesse país e isso não se fará com flexibilização que agiliza processos facilitando apenas para os empreendedores. Defendemos um Licenciamento Ambiental criterioso e democrático com a implementação das medidas de controle e mitigação nas condicionantes das licenças, até que outras propostas mais amplas e inovadoras estejam disponíveis para substituição do atual modelo.

Acreditamos, ainda, que todos devem saber o que se passa dentro do Serviço Público Federal e o papel que os servidores da área ambiental federal vêm cumprindo para defenderem seus posicionamentos técnicos e se manterem independentes de pressões políticas e econômicas.

Assim, nos resta apenas convocar os servidores lotados nas demais Coordenações de Área e nos Núcleos de Licenciamento Ambiental (NLAs) das Superintendências do IBAMA para se somarem a esta luta e também denunciarem publicamente outros casos que evidenciam este processo consciente de fragilização do Licenciamento Ambiental. Neste mesmo sentido, fazemos um chamado à ASCEMA Nacional e às demais entidades representativas dos servidores para ampliar este debate e organizar um movimento nacional dos servidores que exija a valorização do caráter técnico e público do Licenciamento Ambiental através de mudanças imediatas na prática adotada pela atual gestão.

ASIBAMA/RJ – 20 de agosto de 2015

 

in EcoDebate, 24/08/2015


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