Espécies brasileiras que saíram da lista de ameaça ainda são vulneráveis
Animais pesquisados estão menos vulneráveis, porém caminho para a efetiva proteção ainda é longo, indicam especialistas; índice de ameaça é alto para espécies recém-descobertas
No final de 2014, o Ministério do Meio Ambiente (MMA) divulgou duas listas atualizadas das espécies brasileiras ameaçadas de extinção, de flora e de fauna. No tocante aos animais, 170 saíram da categoria de vulnerabilidade. Entre elas, destacam-se a baleia-jubarte (Megaptera novaeangliae) e a arara-azul-grande (Anodorhynchus hyacinthinus). A lista brasileira usa como base os indicadores e as classes estipuladas pela União Internacional para Conservação da Natureza (UICN). Dessa forma, aquelas espécies que constam na listagem do Brasil são as que estão nas categorias ‘Criticamente em Perigo’, ‘Em Perigo’ e ‘Vulnerável’ dessa instituição.
“A melhora no status de conservação dessas espécies é um avanço significativo para toda a sociedade, incluindo o poder público, o meio científico e as organizações que atuam em prol da biodiversidade brasileira. Esses bons resultados práticos são resultado da ação conjunta desses setores e devem ser reconhecidos”, afirma Malu Nunes, diretora executiva da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza. A instituição foi responsável por financiar projetos de conservação de 18 das 170 espécies que saíram da lista, com destaque, além da própria baleia-jubarte e da arara-azul-grande, para o papagaio-de-cara-roxa (Amazona brasiliensis), o albatroz-de-sobrancelha (Thalassarche melanophris) e a jaguatirica (Leopardus pardalis mitis).
De acordo com Rosana Subirá, coordenadora substituta da Coordenação Geral de Manejo para Conservação do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (CGESP/ICMBio), dois fatores foram determinantes para melhorar o status de conservação dessas espécies. “O primeiro foram as medidas de conservação rigorosas, como a proibição da caça à baleia-jubarte, que foi determinada por lei e fortemente fiscalizada. O segundo foi a atuação diária de pessoas dedicadas à causa ambiental”, explica. Com relação a essa atuação, Rosana cita como exemplo o caso da arara-azul-grande “que teve sua captura na natureza para abastecer o tráfico ilegal fortemente reduzida devido a intensas campanhas de sensibilização feitas por pesquisadores com moradores das áreas onde a espécie ocorre”.
Ela comenta ainda que a saída das 170 espécies ensina duas coisas: “a importância das pesquisas para que tenhamos uma compreensão cada vez melhor da nossa biodiversidade, sua dinâmica e inter-relações; e que, com vontade e esforço, é possível sim evitar a extinção de espécies”, conclui. “Um resultado direto disso é o fato de 23 das170 espécies terem recebido financiamento da Fundação Grupo Boticário, instituição que já apoiou quase 1.400 pesquisas em todo o país”, completa Malu Nunes, evidenciando como o fomento à pesquisa traz resultados práticos para a conservação de espécies e ecossistemas.
Não dá para relaxar
Segundo a diretora executiva Malu Nunes, apesar dessa grande conquista é preciso entender que o caminho para a efetiva conservação dessas e de outras espécies ainda é longo. “O fato de elas terem saído da lista não significa que não estejam vulneráveis à ameaça de extinção. Muitos desses animais estão agora classificados como ‘Quase Ameaçados’, o que significa que eles estão em uma linha tênue e podem ser incluídos em alguma das categorias de ameaça em futuro próximo”, esclarece.
Já Rosana Subirá afirma que é preciso olhar esse resultado com cautela. “Muitasespécies foram retiradas da lista não porque sua situação tenha melhorado, mas sim porque hoje temos muito mais informações sobre elas do que tínhamos 12 anos atrás, quando foi preparada a lista anterior”, comenta.
Para garantir a durabilidade dos avanços já conquistados com essas espécies, é necessário que cada uma delas possua um Plano de Ação Nacional (PAN) e que ele esteja sendo aplicado na prática. Os PANs são documentos produzidos pelo ICMBio e apresentam o status de conservação de determinada espécie ou ecossistema, suas principais ameaças, além de elencar objetivos prioritários de conservação. Segundo o MMA, em 2013 apenas 307 dos 1.173 animais registrados na fauna brasileira possuíam PANs. Além disso, outro item que merece atenção é se as populações desses animais estão protegidas por unidades de conservação (UC). De acordo com dados da mesma instituição, apurados em 2012, apenas 369 espécies brasileiras de animais estão protegidas por UCs federais.
Apesar de esforços, a lista de ameaças deve aumentar.
A diretora executiva da Fundação Grupo Boticário afirma que a instituição tem apoiado muitas pesquisas com descobertas de novas espécies. “Uma realidade que tem se mostrado recorrente é a descoberta de novas espécies que já ‘nascem’ ameaçadas, mostrando que ainda conhecemos pouco da biodiversidade e podemos já ter perdidoespécies que nem chegamos a conhecer”, conclui Malu Nunes.
Algumas das descobertas mais recentes foram duas espécies de peixe: Ituglanis boticario e Austrolebias bagual e duas espécies de ave: o macuquinho-preto-baiano (Scytalopus gonzagai) e a patativa-tropeira (Sporophila beltoni), todas consideradasameaçadas de extinção logo que foram descritas pelos pesquisadores. Dentre elas, as duas espécies de peixe ainda não constam na lista do ICMBio, mostrando que a faunaameaçada ainda é maior do que a divulgada.
Sobre a Fundação Grupo Boticário: a Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza é uma organização sem fins lucrativos cuja missão é promover e realizar ações de conservação da natureza. Criada em 1990 por iniciativa do fundador de O Boticário, Miguel Krigsner, a atuação da Fundação Grupo Boticário é nacional e suas ações incluem proteção de áreas naturais, apoio a projetos de outras instituições e disseminação de conhecimento. Desde a sua criação, a Fundação Grupo Boticário já apoiou 1.418 projetos de 481 instituições em todo o Brasil. A instituição mantém duas reservas naturais, a Reserva Natural Salto Morato, na Mata Atlântica; e a Reserva Natural Serra do Tombador, no Cerrado, os dois biomas mais ameaçados do país. Outra iniciativa é um projeto pioneiro de pagamento por serviços ambientais em regiões de manancial, o Oásis. Na internet: www.fundacaogrupoboticario.org.br,
Colaboração de Maria Luiza Campos, NQM
Publicado no Portal EcoDebate, 16/04/2015
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