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Uma nova lei para as florestas de São Paulo? artigo de Roberto Resende

 

opinião

 

[Ipam] Foi publicada, em 15/01, pelo Governo do Estado de São Paulo a Lei 15.684, que dispõe sobre o Programa de Regularização Ambiental (PRA) das propriedades e imóveis rurais, além da mensagem sobre os vetos feitos pelo Governador Geraldo Alckmin. Esta lei vem do Projeto de Lei nº 219/14, dos deputados Barros Munhoz (PSDB), Campos Machado (PTB), Estevam Galvão (DEM), Itamar Borges (PMDB), José Bittencourt (PSD) e Roberto Morais (PPS).

É importante lembrar que este projeto foi conduzido de forma acelerada na Assembleia, com relatores especiais e regime de urgência. As poucas discussões com participação das entidades da sociedade civil só aconteceram na reta final.

Mesmo limitado, este processo de participação e mobilização foi um bom saldo do processo. As várias manifestações e propostas contribuíram para algumas melhorias, evitando-se maiores retrocessos, apesar de praticamente não se ter progressos na lei. Mesmo a segurança jurídica tão pleiteada não foi tão atendida.

Basicamente, a lei aprovada manteve vários dos dispositivos da Lei federal 12.651/2012, até porque não poderia contrariá-la. Dentre estes está a polêmica “escadinha”, que escalona as obrigações de recuperar as faixas ciliares em função do tamanho dos imóveis. Este ponto e outros, como as diversas dispensas de recuperação das APPs (Áreas de Preservação Permanente) e Reservas Legais são objeto de vários questionamentos, inclusive de Ações de Inconstitucionalidade (Adins), por parte do Ministério Público Federal, ainda não julgadas.

Também devem ser lembrados questionamentos quanto à necessidade e mesmo a propriedade desta lei, uma vez que a Lei 12.651/2012 determina que o Programa de Regularização Ambiental deve ser implantado por ato do Chefe do Poder Executivo (por decreto, não lei).

Dentre os pontos vetados podemos destacar como bastante positivos:

  • A inversão da lógica da lei federal quanto à distinção das áreas de preservação permanente que devem ser recuperadas e as que podem continuar na condição de uso consolidado por atividades agrícolas e de infraestrutura (art. 23 e § 1º do art. 26).
  • A ampla anistia a infrações por desmatamento anteriores a 2008, ampliando a norma federal indevidamente (art. 6).
  • A falta de definição clara de faixa mínima para a recuperação de matas ciliares nos imóveis maiores (item 1 do § 5º do art. 14);
  • A previsão de se ter novos desmatamentos para implantar aquicultura, também contrariando a lei federal (art. 18).

Mas ainda restaram diversos pontos com problemas. Um é a obrigação de se ter um processo em papel, sem poder se feito apenas em meio digital, para cada Plano de Regularização ( § 2º do art. 5). Isso vai onerar excessivamente a administração pública, e prejudicar o atendimento do cidadão, uma vez que são previstos mais de 300 mil PRAs no Estado.

Conforme outro ponto (§ 6º do art. 12) o órgão ambiental fará automaticamente a definição como Servidão Ambiental e Cota de Reserva Ambiental (CRA) da vegetação que for excedente, na prática impondo uma decisão, que deveria ser voluntária, ao proprietário.

Porém, ainda restam alguns problemas mais graves. Um está no artigo 27, que trata da Recuperação das Áreas de Reserva Legal. Apesar de não haver mais uma menção explicita à tese que o Cerrado não é protegido pelas versões mais antigas do Código Florestal ainda há um grande risco para este Bioma, com a dispensa de recuperação de reservas. Se houvesse o entendimento de que é importante conservar e recuperar este Bioma poderia se feito algum comando neste sentido, esclarecendo mais um ponto de dúvida na Legislação Brasileira.

O mesmo pode ser dito quanto à possibilidade de compensação de Reservas Legais fora do estado. A Lei Federal assim o permite, mas a crítica situação socioambiental de São Paulo não. Ao omitir esses dois temas a lei os deixa para um regulamento, o que não contribui nem para conservação ambiental, nem para segurança jurídica e agilidade de processos administrativos e judiciais.

E também foi mantida a previsão para regularização de uso de áreas de preservação nas cidades (art. 40), contrariando a jurisprudência predominante sobre o assunto.

Continuando…

Incialmente deve ser acompanhada a resposta da Assembleia aos vetos. É até possível a rejeição destes, o que exige a maioria absoluta dos deputados (ver o artigo 28 da Constituição Paulista).

É fundamental acompanhar o regulamento, seja por Decreto ou normas da Secretaria do Meio Ambiente, em especial na definição de critérios e procedimentos para o entendimento da recomposição de Reservas e APPs. Especialmente aqui deve ser considerado o conceito de bacias hidrográficas críticas, muito desmatadas, que também é previsto na Lei 12.651/2012.

É preciso que o Cadastro Ambiental Rural (CAR) seja efetivado, o que demanda orientação político-administrativa, recursos humanos e materiais, além de uma ampla rede de parcerias com diferentes níveis e áreas de governo e a sociedade civil.

Também é importante articular de forma efetiva o CAR e o PRA com o licenciamento ambiental, inclusive para facilitar o atendimento dos agricultores que precisam obter autorizações.

O envolvimento da extensão rural, governamental ou não, ações de comunicação e envolvimento dos agricultores é base para um efetivo avanço na gestão sustentável dos recursos naturais em São Paulo.

Também é necessário iniciar a aplicação efetiva dos instrumentos econômicos, previstos no programa de apoio e incentivo à conservação do meio ambiente, com prioridade para a agricultura familiar (arts. 37, 38 e 39). Para isso é necessária uma ampla discussão com os vários setores interessados, de forma integrada com outras políticas, como a de Mudanças Climáticas, e articulada com ações de âmbito nacional, regional e municipal.

Outro passo é começar a discussão de uma lei específica para as APPs urbanas, com todas as implicações para a qualidade de vida nas cidades.

Para tanto, é necessário o envolvimento das diversas instâncias de participação, novas e existentes, como coletivos, conselhos, em especial os Comitês de Bacia e o Conselho Estadual de Meio Ambiente, o CONSEMA, ausentes nas discussões até aqui.

Com o agravamento da crise hídrica é evidente a importância de boas políticas públicas e da ação de todos para a gestão dos recursos naturais. Constatar que o conseguiu até aqui com toda esta mobilização e negociação foi apenas evitar retrocessos não deve desanimar, mas estimular a busca por avanços efetivos.

Continuamos ainda com muito que fazer, para contribuir na melhoria das condições ambientais, não só em São Paulo, mas a partir daqui.

* Roberto Resende é agrônomo, Mestre em Ciência Ambiental e Presidente da Iniciativa Verde.

Artigo socializado pelo Ipam – Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia e reproduzido pelo Portal EcoDebate, 21/01/2015

[cite]


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