Prorrogação de prazo para fechamento de lixões é criticada por catadores
Movimento de catadores e especialistas criticaram medida provisória aprovada pelo Senado em 29 de outubro e que estende o prazo para que as prefeituras acabem com os lixões até 2018. A medida aguarda sanção presidencial. O prazo original determinado pela Lei Nacional de Resíduos Sólidos (Lei 2.305), de 2010, encerrou-se em agosto deste ano. Para um dos articuladores do Movimento Nacional de Catadores de Material Reciclável (MNCR), Alex Cardoso, se aprovada, a medida poderá representar um grande retrocesso para o meio ambiente e para os catadores do país.
Cardoso disse que, nos quatro anos desde que a lei entrou em vigor, muitos municípios sequer iniciaram o processo de fechamento dos lixões, que devem ser substituídos por aterros sanitários. “Eles deixaram o prazo estourar e agora fizeram lobby na Câmara e no Senado. Se o prazo realmente for ampliado, o Brasil perderá o salto qualitativo na parte da gestão ambiental e na defesa do meio ambiente”, disse e acrescentou que, além do prejuízo ambiental, os lixões representam riscos de contaminações e acidentes para os catadores.
O MNCR enviou em setembro uma carta aberta a senadores e deputados em que narra a morte de um trabalhador que foi soterrado pelo lixo e esmagado por máquinas usadas no Lixão da Estrutural, em Brasília. O caso ocorreu um dia após a morte de uma criança de 6 anos no Lixão Soledade, no Rio Grande do Sul.
O movimento está em contato com o conselho do Ministério Público e outras entidades da sociedade civil para que a medida seja vetada pela Presidência e que apenas os municípios que estejam na estaca zero do processo tenham maior prazo para se readequar à legislação. “Não dá para tratar todos os municípios de forma igual. Precisamos saber de fato quais já não têm lixões e o que pode ser feito para solucionar o problema daqueles que ainda têm lixões”, disse Cardoso. Antes da medida provisória, os municípios que mantiveram lixões após o prazo da Lei 2.305 poderiam sofrer sansões civis e responder por crime ambiental.
No Lixão da Estrutural, o maior da América Latina, são depositadas diariamente 8,7 mil toneladas de lixo. Lá trabalham mais de 2 mil catadores de material reciclável 24 horas por dia. Segundo o Serviço de Limpeza Urbana do Distrito Federal, o local deve ser desativado até dezembro, mas, se a medida for sancionada pela presidenta Dilma Rousseff, os catadores temem que o lixão permaneça aberto até 2018.
Para a coordenadora do Movimento Nacional dos Catadores no Rio de Janeiro, Claudete Costa, a 7ª Feira de Negócios e Encontro de Catadores (ExpoCatadores), que ocorre entre os dias 1º e 3 de dezembro, abrirá oportunidades para que catadores de todo o país se articulem e elaborem um documento contra a extensão do prazo do fechamento dos lixões. Segundo ela, o fechamento do Lixão de Gramacho, na Baixada Fluminense, em março de 2012, que já foi o maior da América Latina, tem sido positivo para os catadores da região. “Foi criada uma central e um polo de reciclagem que conta com o trabalho de cinco cooperativas de catadores e cerca de 60 trabalhadores”. Entretanto, Claudete lamentou que lixões clandestinos ainda operem impunemente na região. “Empresas de alto porte têm destinado seus resíduos a esses locais”, denuncia.
De acordo com a advogada especialista em Direito Público da Consultoria em Administração Municipal, Isabela Giglio, não basta prorrogar prazos se não houver orientação mais incisiva e repasse de recursos federais para alguns municípios. “A tarefa de investir em saneamento básico é dos municípios e vem desde a Constituição Federal de 1988. Os municípios já deveriam ter condições de resolver esse problema, mas como vemos que, na prática, isso ainda não foi feito, seria recomendável um apoio maior do governo federal”, acredita.
Dados da Pesquisa Nacional de Saneamento Básico (PNSB) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontam que, em 2013, dos 5.456 municípios do país, 2,2 mil tinham disposição final de dejetos ambientalmente adequada. A Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública aponta que 48% dos resíduos sólidos coletados no país ainda tem os lixões como destino final.
O governo federal havia aplicado até agosto R$ 600 milhões na elaboração dos planos e na implantação dos projetos estaduais e municipais de gestão dos resíduos sólidos. Governo e Ministério Público Federal tentam agora estabelecer uma estratégia de negociação dos prazos de encerramento dos lixões por meio de Termos de Ajustamento de Conduta (TAC) com as prefeituras.
Por Flavia Villela, da Agência Brasil.
Publicado no Portal EcoDebate, 06/11/2014
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