Coalizão de ONGs pede compromisso dos presidenciáveis para a conservação do patrimônio natural brasileiro
As unidades de conservação são importantíssimas não apenas para a proteção da biodiversidade, mas também indispensáveis para a vida e o bem-estar dos brasileiros. Um exemplo bastante atual em tempos de crise de abastecimento é que as unidades de conservação fornecem uma parcela significativa da água consumida em um terço das grandes cidades do mundo. No Brasil, mais de 30% da água consumida é captada diretamente ou em fontes a jusante dessas áreas, fontes que permaneceram limpas e necessitam de pouco investimento no tratamento da água, graças à presença de unidades de conservação. Além disso, estima-se que a água provida por essas áreas seja responsável por 79% da energia hidrelétrica nacional.
Além da água, as UCs fornecem outros serviços ambientais essenciais para a agricultura, fruticultura e também à vida das comunidades de seu entorno, como a purificação do ar, a regulação do microclima e o sequestro de carbono. Elas também representam geração de renda para milhares de brasileiros, pois importantes pontos turísticos naturais de grande beleza cênica são protegidos em seus interiores, além de algumas UCs marinhas funcionarem como berçários para o desenvolvimento de peixes que poderão ser pescados fora de seus limites.
“Unidades de conservação efetivamente implementadas contribuem diretamente para o desenvolvimento social e econômico do país. Elas são responsáveis, por exemplo, pela manutenção de mananciais hídricos que abastecem boa parte das cidades brasileiras e garantem a água que é utilizada na geração da maior parte da energia hidrelétrica do Brasil”, destaca Rodrigo Medeiros, Vice Presidente da Conservação Internacional – Brasil.
O Brasil foi responsável por 75% da ampliação da área protegida no mundo entre 2003 e 2009. No entanto, a criação dessas áreas não foi acompanhada pelos investimentos necessários a sua efetiva implantação. Nem mesmo a regularização fundiária – prioridade para implantar uma área – foi realizada em muitas unidades. O baixo grau de implantação das UCs deprime o seu potencial de contribuir para o desenvolvimento sustentável das regiões em que elas se inserem, acirra conflitos e dificulta a disseminação do papel e importância das unidades. Em conseqüência desse fato e por não estarem inseridas de forma estratégica nos planos de desenvolvimento do país, mais de 45 mil quilômetros quadrados de UCs já foram perdidos em todas as regiões ao longo das últimas três décadas (equivalente a área do Estado de Espírito Santo).
Com 14 anos, pode-se dizer que o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) tem o potencial dos melhores sistemas de áreas protegidas do mundo. No entanto, para desenvolver todo esse potencial, é necessário enfrentar a falta e priorização da agenda pública e de maior compreensão da sociedade a respeito de sua importância.
Por isso, uma Coalizão da qual participam as principais organizações ambientalistas que atuam na conservação da biodiversidade entrega esta semana aos candidatos à presidência da República um documento com propostas para fortalecer o SNUC, formado por mais de 2.400 áreas que cobrem 17%do território brasileiro.
Com o documento, a Coalizão Pró-UCs quer obter dos candidatos compromissos formais que garantam a consolidação do Sistema Nacional de Unidades de Conservação, por meio da criação de 27 milhões de hectares, incremento do orçamento anual para custos recorrentes das UCs federais em pelo menos R$ 188 milhões (e esforços paralelos nas esferas estaduais) e regularização fundiária de pelo menos dois milhões de hectares nos próximos quatro anos.
“A ciência ainda desconhece todo o potencial da biodiversidade brasileira abrigada nas unidades de conservação. Além disso, a capacidade dessas áreas em gerar divisas por meio do turismo e do uso sustentável não tem sido considerada de forma estratégica pelos recentes governos.” afirma Angela Kuczach, diretora da Rede Nacional Pró Unidades de Conservação.
Para atingir a meta e reverter o quadro de ameaças, as organizações querem garantir, a blindagem da Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (Lei 9985/2000) frente às propostas vigentes no Congresso Nacional, que visam o enfraquecimento do SNUC e a alteração nos limites e grau de proteção das Unidades de Conservação. Entre os projetos considerados ameaçadores para as áreas protegidas estão o PL 7.123 / 2010, que propõe a abertura de estrada asfaltada através do Parque Nacional do Iguaçu e modifica o SNUC; o PL 3.682 / 2012, que abre UCs de proteção integral à mineração; as Propostas de Emenda Constitucional (PEC) 215 / 2000 (Câmara) e 72 / 2011 (Senado), que vinculam a criação de Unidades de Conservação e Terras Indígenas à aprovação do Legislativo.
A Coalizão quer ainda garantir a criação de Unidades de Conservação em processo avançado de discussão, tais como o Parque Nacional de Guaricana (PR), Parque Nacional de Boqueirão da Onça e Toca da Boa Vista (BA), Parque Nacional da Serra do Gandarela nos seus limites originais (MG), e ampliação do Parque Nacional Marinho de Abrolhos (BA).
Recursos para a conservação – A falta de sustentabilidade financeira é apontada pela Coalizão Pró-UCs como um dos grandes riscos à manutenção e alcance dos objetivos dessas áreas. Para contornar o problema, o grupo quer que os candidatos se comprometam em adotar mecanismos eficientes para a aplicação dos recursos das compensações ambientais, garantindo agilidade, transparência e ampla participação da sociedade civil. A aprovação e regulamentação de políticas que garantam a valorização e a sobrevida financeira das unidades de conservação, aponta a Coalizão, dependem da regulamentação dos artigos 34, 47 e 48 da Lei do SNUC; da aprovação da Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais, do Imposto de Renda Ecológico e da ampliação do ICMS Ecológico para todos os estados.
Testar novos modelos de gestão, que envolvam parcerias entre os setores público e privado (empresarial e organizações da sociedade civil) como alternativas importantes à consolidação das UC, é vital para melhorar a efetividade desses espaços, ampliando o aproveitamento de seu potencial socioeconômico, as oportunidades de interação da sociedade com a natureza e a mobilização social em defesa dessas áreas.
Segundo Malu Nunes, Diretora Executiva da Fundação Grupo Boticário de Proteção da Natureza, ainda falta aos governantes a certeza de que o estabelecimento e a implementação de um sistema de unidades de conservação é uma das principais estratégias para a conservação da biodiversidade, para a garantia do bem-estar da população, incluindo sua segurança hídrica, e para o desenvolvimento econômico do país.
Critérios técnicos – As organizações ambientalistas querem ainda que sejam estabelecidos processos de análise técnica transparente e consulta pública para avaliar a real relevância de redução, recategorização e desafetação de unidades de conservação.
“Nos casos extremos em que as alterações forem inevitáveis, deve-se estabelecer um processo de compensação das perdas a partir da ampliação das UCs ou criação de novas, garantindo a representatividade do sistema e proteção de áreas com biodiversidade equivalente”, afirma Jean François Timmers, Superintendente de Políticas Públicas do WWF-Brasil.
Estabelecer mecanismos, critérios e princípios para orientar a compensação de reservas legais (Código Florestal) por áreas equivalentes em biodiversidade na regularização fundiária de unidades de conservação; monitorar o desmatamento de todos os biomas brasileiros, são providências que podem assegurar melhores condições para as UCs e para todos que se beneficiam da sua existência.
O Brasil está desperdiçando um potencial único e esperamos que o próximo governo assuma compromissos claros com uma nova forma de desenvolvimento que tem como base o rico patrimônio natural do país”, conclui Timmers.
Fonte: Imaflora
EcoDebate, 16/09/2014
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