As Tecnologias da Amazônia, artigo de Raimundo Nonato Brabo Alves
Foto: Freepik
[EcoDebate] Como duas tecnologias, uma de origem mecânica outra de origem química, foram capazes de mudar o comportamento das comunidades e a paisagem de uma região.
É quase unanimidade que uma das causas do subdesenvolvimento da Amazônia é a dificuldade de difusão de tecnologias. Existe uma afirmação popular: “o que é bom por si só se divulga”. Depende: quando avaliamos somente a eficácia da tecnologia ao atingir o alvo, sem levar em conta os efeitos colaterais no longo prazo, até que esta assertiva se aplica.
Mas o contexto deste ensaio são duas tecnologias que considero como as mais difundidas na Amazônia, que mesmo sendo uma de origem mecânica e outra de origem química, ambas em tese se complementam em seus efeitos colaterais. Impressiona como suas adoções mudaram o comportamento de comunidades inteiras e foram capazes de modificar a paisagem de imensas regiões. Eu refiro-me a utilização da motosserra e ao uso dos agrotóxicos.
Antes do advento da motosserra a floresta amazônica era quase inacessível considerada até mesmo “o inferno verde”. Era difícil domina-la ou abate-la a golpes de machado. Muitos pesquisadores vinculam o desmatamento da Amazônia – hoje em 75 milhões de hectares – a aberturas de estradas, implantação de grandes projetos que funcionam como atrativos de migrantes. Mas a fronteira avança com a difusão e uso intensivo da motosserra. Cadeias produtivas como a da madeira e do carvão vegetal (muitas na ilegalidade), só se estabelecem graças a motosserra. Chama a atenção o domínio dessa tecnologia nas regiões mais remotas da Amazônia, não exigindo escolaridade para operadores, presenciando-se uma verdadeira rede de assistência técnica, reproduzidas em pequenas oficinas manejadas por pessoas semianalfabetas e de “postos de combustível” vendendo gasolina misturada com óleo 2 tempos embaladas em garrafas PET.
A motosserra vai na frente promovendo o desmatamento e a pastagem vem logo a seguir. Aqui entra a tecnologia de origem química com a aplicação do herbicida. Antes da difusão do herbicida era quase impossível manter grandes áreas de pastagem sem a infestação da “juquira” – como se dizia na fronteira – fazendo o roço “no braço” à foice e facão com elevado custo da mão-de-obra. Claro que nesta fase do domínio da fronteira os atores são, na maioria, grandes produtores capitalizados. Não se sabe se o êxodo rural veio antes ou depois da adoção das tecnologias. O fato é que os pequenos agricultores familiares que permanecem no campo tentam reproduzir a aplicação dos dois processos tecnológicos difundido pelos grandes produtores mais capitalizados.
O herbicida ficou tão popular que não interessa o princípio ativo nem a marca, para o incauto agricultor tudo é “veneno”. Os agricultores semianalfabetos não sabem se o “veneno” é sistêmico, se é de contato ou se é seletivo. Nada disso é levado em conta, pois não conseguem ler as instruções de uso. Preparam misturas das mais variadas, muitas vezes com dosagens acima das recomendadas pelos fabricantes. O “veneno” ficou tão difundido na Amazônia pela eficácia no controle de “juquira” em pastagens que hoje é usado com frequência no controle do mato em hortas, pomares, nas culturas industriais e até na tradicional cultura da mandioca.
Alias “veneno” é um termo genérico que os agricultores familiares chamam para qualquer produto químico. Presenciei recentemente em uma comunidade a prática de superdosagens de agrotóxicos em hortaliças, sem nenhuma orientação técnica e sem respeito ao prazo de carência do princípio ativo. Em outra um pequeno agricultor familiar estava aplicando “veneno” para controle de ácaro usando um fungicida.
Os agricultores sem a necessária e adequada orientação, foram muito eficientes na adoção dessas duas tecnologias, lamentavelmente sem o domínio de todo o processo e sem o conhecimento de seus efeitos colaterais. Um massivo programa de extensão rural se faz necessário na Amazônia para corrigir estas distorções, minimizando os problemas de saúde pública que sofrem os agricultores que manuseiam os agrotóxicos e os consumidores que se alimentam dos produtos contaminados. Para o desmatamento são necessárias políticas públicas e medidas de controle mais enérgicas, para amenizar os impactos ao meio ambiente.
Raimundo Nonato Brabo Alves
Pesquisador da Embrapa Amazônia Oriental
EcoDebate, 11/08/2014
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A derrubada de florestas e a utilização de agrotóxicos contribuem para a produção agropecuária, o que faz elevar o PIB e o crescimento das empresas, e é isso que interessa aos Estados capitalistas.
Estamos em campanha eleitoral (Presidente da República, Senadores e Deputados Estaduais). Alguém já ouviu algum candidato falando em defender o meio ambiente? Certamente não. E nem ouvirá, pois eles, todos eles, estão focados no desenvolvimento econômico, e este desenvolvimento depende da destruição do que ainda resta de recursos naturais (florestas, rios, lagos, oceanos e a própria terra, através da contaminação e da exploração mineral). E, se algum desses candidatos falar, não deve ser levado a sério, pois, certamente, será, apenas, uma estratégia eleitoral. É o desenvolvimento econômico que eles apresentam como sua meta principal, e, infelizmente, a grande maioria da população deste país e de todos que são conduzidos pelo capitalismo pensam de maneira igual.