Produtores aguardam regulamentação de compra e venda de Cotas de Reserva Ambiental (CRAs)
O novo Código Florestal Brasileiro, sancionado em 2012, abriu a possibilidade de um mercado promissor de ativos ambientais, de compra e venda de Cotas de Reserva Ambiental (CRAs). Mas, para que as trocas comerciais ocorram, produtores rurais ainda aguardam a regulamentação por parte do Ministério do Meio Ambiente (MMA).
Entre as obrigações previstas no código, estão a conservação das Áreas de Preservação Permanente (APP), como as margens dos rios, e da Reserva Legal (RL). O percentual de área de reserva na propriedade rural que deve ser preservada varia de 20% a 80%, de acordo com o bioma em que ela se encontra – 80% na Amazônia Legal e 35% no Cerrado, por exemplo.
O diretor do Departamento de Gestão Estratégica da Secretaria Executiva do MMA, Raimundo Deusdará, explica que o primeiro passo para a regularização ambiental é o Cadastro Ambiental Rural (CAR), que identifica e integra as informações das propriedades, visando ao planejamento ambiental, monitoramento, combate ao desmatamento e à regularização. Ele já está sendo feito por produtores em parceria com alguns estados e municípios, mas o banco de dados nacional ainda não está habilitado.
“O decreto de implantação do CAR ainda está em estudo e não tem prazo para sair. Estamos consultando os ministérios da Agricultura, do Desenvolvimento Agrário, da Fazenda e outros órgãos envolvidos. A partir de sua publicação, passará a contar o prazo de dois anos para os produtores se cadastrarem no CAR, podendo também aderir ao Programa de Regularização Ambiental (PRA)”, acrescentou o diretor.
O Código Florestal prevê que, após cinco anos de sua publicação, ou seja, a partir de 28 de maio de 2017, as instituições financeiras não poderão conceder crédito agrícola para os agricultores que não tiverem o Cadastro Ambiental Rural regularizado, ou seja, sem passivo ambiental ou em processo de recuperação da área desmatada.
Para recuperar essa área, os imóveis com déficit de reserva legal têm a opção de recompor a reserva por meio de plantio de mudas ou regeneração natural. Têm ainda a opção de compra de cotas de reserva em outras propriedades, desde que atendidas determinadas condições legais relativas à data da perda da cobertura florestal e que as cotas estejam no mesmo bioma e estado da área a ser compensada.
A compensação é feita da seguinte forma: um produtor que tenha, em sua propriedade, reserva excedente ao estabelecido pela lei, pode gerar cotas (1 cota = 1 hectare) e disponibilizar para venda. O produtor que tem déficit de reserva legal compra essas cotas e utiliza para compensação de sua própria área. Então, na prática, um produtor paga para outro preservar sua reserva.
Para estimular e orientar os produtores rurais no processo de regularização de suas propriedades, a Bolsa Verde do Rio de Janeiro promove o Circuito BVRio: Regularização ambiental em ação. A caravana está percorrendo vários municípios do Pará e de Mato Grosso, com palestras informativas. Ela teve início em 31 de janeiro em Paragominas (PA), com término previsto para 22 de maio em São José do Rio Claro (MT).
Leonel Mello, gerente comercial da BVRio, explica que, para fazer o reflorestamento com espécies nativas, o custo pode variar de R$ 15 mil a R$ 20 mil por hectare. “Há produtores rurais que já utilizam a área de produção há 30 anos, por exemplo, e reflorestar 80% disso inviabilizaria o negócio que já está estabelecido. Então, a melhor opção, e mais barata, são as cotas”, diz o gerente.
“Em termos ambientais, o uso da cota é benéfico. O produtor que teria condições de desmatar sua área legalmente é estimulado a preservar e transformar aquilo em renda”, ressalta Maurício Moura Costa, diretor de operações da BVRio.
Ele explica que ainda não há um valor estabelecido para as cotas, que deve variar por estado, bioma e tempo de compensação. “O que temos hoje são expectativas por parte dos vendedores que estão se cadastrando na plataforma virtual, já que as transações de mercado ainda não começaram”, diz Costa.
Segundo ele, a BVRio é uma associação sem fins lucrativos e analisada por auditores independentes. A divulgação para os produtores é feita da forma mais transparente possível. A plataforma online, BVTrade, atua como intermediária entre vendedor e comprador e cada produtor deve buscar a comprovação das informações por meio de documentação.
Leonel Mello explica que os produtores já estão fazendo os acordos onde o vendedor se compromete a criar as cotas, prefixando o preço e o prazo para a compensação, já que os valores tendem a subir com o tempo. Segundo ele, a plataforma BVTrade entrou em operação em dezembro de 2012 e já têm 500 mil cotas sendo oferecidas em todo o país, com ofertas de compra e negociações em andamento. Um técnico do Banco do Brasil também está em campo com o Circuito BVRio, para apresentar linhas de financiamento para que os produtores façam a regularização ambiental.
Deusdará informa que o sistema de troca de cotas ambientais já estava previsto desde 1996, mas agora, com o CAR, poderá ser mais bem viabilizado. “As iniciativas privadas, como a BVRio, estão antecipando um passo e buscando quem gostaria de aderir a esse mecanismo de compensação, que já tem os conceitos principais discriminados na própria lei. O decreto a ser publicado será mais de procedimentos, com regras de como fazer o mercado girar com garantias econômicas e ambientais, justamente para não virar um loteamento de ativos que não existem”, disse.
O secretário explica ainda que o CAR terá uma metodologia de análise para confirmação do uso de cotas nas compensações. “Esse mercado é finito e envolve a emissão de um quase título, que também precisa de acompanhamento físico. A ansiedade é muito grande, mas para fazer essa roda girar precisamos definir bem o papel de cada órgão no processo”, complementa.
A Comissão de Valores Mobiliários também foi consultada pela Agência Brasil sobre a regulação desse mercado de ativos ambientais e cotas de reserva. Segundo a assessoria, os valores mobiliários atualmente passíveis de negociação estão definidos no Artigo 2º da Lei 6.385. “Ressaltamos que a Autarquia está permanentemente e, sempre que necessário, modernizando a regulamentação do mercado de capitais, em função de fatores diversos, tais como estruturas inovadoras, experiência da supervisão, demandas de agentes de mercado, entre outros. No momento, não há previsão para edição de uma Instrução específica sobre o tema”.
Reportagem de Andreia Verdélio, da Agência Brasil, publicada pelo EcoDebate, 12/02/2014
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