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Artigo

Uma faixa exclusiva de ônibus incomoda muita gente… por Raquel Rolnik

 

“A ‘má vontade’ de nossos gestores sempre se voltou ao transporte coletivo e quem sempre usufruiu de ‘tratamento VIP’ foram os carros… afinal, o transporte por ônibus em nosso país sempre foi considerado ‘coisa de pobre’ e, como tal, nunca precisou ser eficiente, muito menos confortável”, escreve Raquel Rolnik, professora de Arquitetura e Urbanismo na USP, em artigo publicado no blog Habitat, 08-01-2014.

Eis o artigo.

300 km de faixas incomodam muito mais…

Todos os dias, os paulistanos gastam, em média, 2h e 42min para se locomover na cidade. Por mês, são dois dias e seis horas passados no trânsito. Por ano, chegamos a passar, em média, 27 dias presos em congestionamentos.

Não é difícil adivinhar que setor da população puxa essa média pra cima: segundo dados da última pesquisa Origem e Destino, realizada pelo metrô, o tempo gasto pelos usuários de transporte público em seus deslocamentos é 2,13 vezes maior que o de quem usa o transporte individual.

Sob o impulso das manifestações de junho, uma das medidas adotadas em São Paulo para tentar enfrentar o problema do transporte público foi a implementação de faixas exclusivas de ônibus em várias regiões da cidade. Neste final de ano, já são 295 km de faixas exclusivas e um ganho de quase 50% na velocidade média dos ônibus, que subiu de 13,8 km/h para 20,4 km/h.

Mas a medida vem descontentando, principalmente, usuários de automóvel particular, que têm passado mais tempo em congestionamentos desde a instalação das faixas. Sobre o assunto, um dos primeiros que se manifestou contrariamente às faixas foi o Estadão, que em um editorial do mês de outubro acusou a gestão municipal de “má vontade com o transporte individual”.

Recentemente foi a vez de a revista Época São Paulo decretar em manchete de capa que a experiência das faixas “deu errado”. Na matéria, a revista acusa a frota de ônibus paulistana de ter recebido “tratamento VIP” em diversas ruas da cidade.

Quem fala em “má vontade com o transporte individual” e em “tratamento VIP” dado aos ônibus parece desconhecer o fato de que os carros particulares, que transportam apenas 28% dos paulistanos, ocupam cerca de 80% do espaço das vias. Enquanto isso, os ônibus de linha e fretados, que transportam 68% da população, ocupam somente 8% desse espaço.

Esses números só confirmam que, na verdade, a “má vontade” de nossos gestores sempre se voltou ao transporte coletivo e quem sempre usufruiu de “tratamento VIP” foram os carros… afinal, o transporte por ônibus em nosso país sempre foi considerado “coisa de pobre” e, como tal, nunca precisou ser eficiente, muito menos confortável.

Em São Paulo, de fato, 74% das viagens motorizadas da população com renda até quatro salários mínimos são feitas por modo coletivo. De imediato, a implementação das faixas exclusivas de ônibus beneficia especialmente essa população, que depende do transporte público e historicamente é a mais afetada pela precariedade do sistema.

Entretanto, apenas criar faixas exclusivas, sem introduzir mudanças substanciais na qualidade, regularidade e distribuição dos ônibus, não vai produzir a mudança desejada de não apenas propiciar conforto para quem já é usuário, mas também atrair novos usuários, que hoje se deslocam em automóveis.

Isso inclui desde medidas básicas, como comunicar aos passageiros quais linhas passam em cada ponto, até a melhoria da distribuição das linhas e sua frequência.

Evidentemente, um plano de melhorias a ser implementado ao longo dos próximos anos é necessário para que este conjunto de aspectos seja atacado. Se este plano existe, onde se encontra? Quando foi lançado e por quem foi debatido antes de ser adotado?

Parte das avaliações negativas com relação ao transporte público tem a ver também com isso: anunciam-se medidas e não se pactua uma intervenção articulada, de longo prazo, em que os usuários consigam saber o que, quando e como será alterado…

(EcoDebate, 10/01/2014) publicado pela IHU On-line, parceira estratégica do EcoDebate na socialização da informação.

[IHU On-line é publicada pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]


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Alexa

One thought on “Uma faixa exclusiva de ônibus incomoda muita gente… por Raquel Rolnik

  • Se o Haddad tivesse não só implementado as faixas de ônibus, mas além de fazer essa medida barata (gasta-se o que com uma nova faixa? Basicamente, tinta e placas novas) dado uma maior prioridade para o transporte público aumentando o número de ônibus em circulação, eu confesso que quebraria uma promessa feita a mim mesma há muito tempo e votaria novamente no PT quando ele tentasse se reeleger. Pois realmente tentar enfrentar o problema do transporte de São Paulo exige coragem.

    Mas o que ele fez depois disso foi tão… nhé. Quebrar uma linha em duas ou três e dizer que aumentou o número de linhas NÃO VALE. Cada quebra significa uns 20min a mais de espera para se pegar o ônibus no ponto (estimativa pessoal em quanto tempo em média se demora para pegar um ônibus quando só uma linha vai para onde se quer, no centro expandido de São Paulo), e não, o próximo ônibus NÃO vai estar no ponto quando o primeiro chegar, especialmente porque o número de ônibus não aumentou. Note-se também que a sensação de “vazia” das faixas é uma das coisas que mais é criticada pelos motoristas.

    Se vissem dois, três, quatro ônibus os ultrapassando pelas faixas exclusivas cada vez que pegassem um congestionamento, especialmente se fossem ônibus bem cuidados, limpos, e não sobrelotados, muitos motoristas iriam parar para pensar se não vale experimentar ir de ônibus… e quando experimentassem se a experiência for boa, talvez passem a realmente usar o transporte público. E cada pessoa a menos de carro é um carro a menos, mas não um ônibus a mais (num ideal, seria um ônibus a mais a cada 45 pessoas mais ou menos). E o transito melhoraria para todos.

    Mas todas essas mudanças de linha sem nenhuma informação decente… já não está na hora da SPtrans ter um site decente e não ser mais fácil pegar as informações no Googlemaps (que, infelizmente, agora andam desatualizadas) que no site oficial?

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