Suape fora da lei, artigo de Heitor Scalambrini Costa
Suape. Foto: Governo de Pernambuco
[EcoDebate] Para quem acompanha o modelo de desenvolvimento industrial predatório, adotado em Pernambuco, que tem na empresa que administra o Complexo Industrial Portuário de Suape seu símbolo maior, não se surpreendeu com a multa a ela aplicada pela Agência de Meio Ambiente – CPRH em razão do impacto ambiental que vem causando (JC 10/9), em particular com as obras de dragagem e derrocagem do porto pela empresa holandesa Van Oold.
São tantos os desmandos, o não cumprimento de leis, as injustiças praticadas pela empresa Suape ao longo dos últimos anos contra o meio ambiente e as populações locais, que não daria nestas parcas linhas descrevê-los.
O mais gritante desapego à lei são os anos e anos (mais de 10 anos) de descumprimento da aplicação das compensações ambientais impostas para que os desmatamentos dos mangues, restingas e mata atlântica ocorressem naquele território. Os inúmeros Termos de Ajustes de Conduta assinados com o Ministério Público foram sistematicamente desrespeitados pela empresa Suape. Em janeiro de 2012, a empresa publicou como matéria paga nos três jornais de grande circulação do Estado informe publicitário anunciando que o passivo ambiental daquela área tinha sido zerado. Até hoje, os moradores se perguntam onde foram realizadas as intervenções anunciadas com grande pompa? E o Ministério Público, que não se posicionou sobre o pedido de informação para que Suape apontasse em que locais teriam sido efetuadas aquelas intervenções?
Outra questão que indigna a todos os de boa vontade é a truculência com que é tratada a população local (pescadores, agricultores familiares, trabalhadores) que sistematicamente sofrem violências contra seus direitos mais elementares. É sempre bom relembrar que a Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, passou a incorporar o direito à moradia adequada como um dos direitos humanos reconhecidos internacionalmente como universais, e que lamentavelmente não é acatada por quem se diz proprietária da área, e que tem deveres em relação a seus moradores. Um exemplo a ser citado, que tem a ver com o direito a ir e vir, diz respeito aos moradores da Ilha de Tatuoca, que agora, para entrar e sair de onde vivem há décadas (mesmo antes da existência da empresa), receberam uma carteirinha de identificação da empresa Suape. Sem falar da verdadeira “milícia” (como chamam os moradores), que foi criada e é comandada pela Diretoria de Gestão Fundiária e Patrimônio da empresa, que infernizam e tornam a vida dos que ali moram insuportável.
O mais recente episódio é à matéria jornalística do JC de 12/9 último, dois dias após a mídia pernambucana e nacional divulgar a multa de 2,5 milhões de reais aplicada pela CPRH em razão das nocivas consequências ambientais provocadas pelas obras realizadas no Porto de Suape.
A reportagem “Posseiros de Suape são indenizados” dava conta de que 600 famílias oriundas de 5 engenhos, numa área de 670 ha, seriam indenizadas (valor médio de R$ 58 mil reais por família) com recursos repassados pela CPRH à empresa Suape. Dinheiro esse na realidade, recebido da Refinaria Abreu e Lima, e pago como parte da compensação ambiental. Além do escândalo no valor das indenizações (o ha em Suape vale hoje em torno de 500 mil reais), o mais grave, caso esta informação seja confirmada, é que recursos advindos de compensação ambiental são expressamente proibidos pela Lei Federal nº 9.985, de 18/07/2000, e pela Resolução nº 371, de 05/04/2006, do CONAMA, de serem usados para pagamento de indenizações. Então como Suape utilizará destes recursos nas indenizações?
É chegada a hora da sociedade pernambucana ter mais informações sobre o que esta acontecendo naquele território, e não somente receber “propaganda chapa branca” sobre geração de renda e de empregos. A “caixa preta” desta empresa pública tem que ser aberta, e a mídia têm um papel fundamental: o de informar os dois lados da questão.
Heitor Scalambrini Costa, Articulista do Portal EcoDebate, é Coordenação do Fórum Suape e professor da UFPE.
EcoDebate, 03/10/2013
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