O desabafo de Naomi Klein contra a aliança dos ambientalistas com os capitalistas
Por Hélène Crié-Wiesner e Hervé Kempf, em Reporterre
Traduzido do francês por Stéphan Bry
As grandes organizações ambientalistas têm uma responsabilidade tão grande quanto os climato-céticos na atual regressão da política ambiental. Esta é a tese defendida pela jornalista altermundialista Naomi Klein. Segundo ela, a escolha de colaborar com as grandes empresas e a ideologia neoliberal só pode levar ao fracasso. Sua posição provoca um importante debate nos Estados Unidos.
A famosa jornalista canadense, militante altermundialista conhecida por seus livros “No logo” e “A estratégia do choque”, acabou de desencadear uma polêmica dentro do movimento ambientalista norte americano.
Há dois anos, Naomi tinha escrito no jornal The Nation que o militantismo climático e o capitalismo são incompatíveis. Ela observava que os climato-céticos o eram por razões ideológicas: eles entendem muito bem que se a mudança climática ocorre, a única maneira de escapar de suas consequências é questionar o sistema econômico atual, o capitalismo. Segundo ela, a única resposta adaptada à ameaça climática é a “pulverização da ideologia do mercado livre que está dominando a economia há mais de três décadas”.
Ela segue nesta ideia acusando os principais grupos ambientalistas de não ter entendido esta verdade elementar, o que os levou a fazer alianças culpadas com as grandes corporações.
Os “Big Greens”, péssimos líderes
Eis uma tradução parcial das opiniões de Naomi, numa longa entrevista no Earth Island Journal:
”O movimento ambientalista tem mostrado uma profunda negação quando se trata dos “Big Greens”, as principais organizações ambientais. Creio que fizeram mais danos que os negacionistas climáticos de direita. Se perdemos tanto tempo, é culpa delas que nos levaram numa direção que ofereceu resultados deploráveis.
Examinando o que aconteceu depois do protocolo de Kyoto na última década – os mecanismos da ONU e aqueles implantados pela União Europeia – dá para perceber o quanto foi desastroso. (…)
A direita tinha combatido as trocas de permissão de emissão alegando que isso nos levaria à falência, que era a distribuição de esmolas para as grandes empresas, além do fato de que não iria funcionar. A direita tinha razão! Não em relação à falência da economia, mas pelo fato que se tratava de presentes enormes para as grandes sociedades. Ela tinha também razão na sua previsão do que estes mecanismos não nos aproximavam do que desejavam os cientistas, a diminuição das emissões. Então, por que os grupos verdes insistiram nesta direção?”
Naomi Klein observa que “o nível de redução das emissões de que precisamos nos países desenvolvidos é incompatível com o crescimento econômico”.
Ela lembra que, nos anos 1970, o movimento ambiental era muito poderoso e tinha conseguido impor medidas legislativas para reduzir a poluição. Mas, com a eleição de Ronald Reagan à presidência dos Estados Unidos, uma política oposta ao meio ambiente foi implementada. E, em vez de resistir, os movimentos ambientais escolheram colaborar com as grandes empresas. Ela cita Fred Krupp, o presidente de Environmental Defense Fund, uma importante ONG estadunidense, que afirmou claramente esta política. Acontece – o que ela não diz – que Fred Krupp é um participante regular do grupo Bildelberg, que reúne a cada ano grandes patrões e responsáveis políticos para definir a política neoliberal a ser aplicada no mundo.
Assim, explica Naomi, “para os ambientalistas, tratava-se de estabelecer alianças com as empresas. Eles não pensavam “ataquemos estes bastardos!” mas “trabalhemos juntos, os bastardos e nós!” Isso significa designar as corporações como atores voluntários da solução.
“Nós globalizamos um modelo econômico insustentável de hiperconsumismo. Ele está se espalhando com sucesso no mundo e ele nos mata. (…) Os grupos ambientalistas não foram espectadores deste fenômeno; eles foram parceiros. Eles queriam fazer parte disso”.
As grandes ONG’s ambientais aceitaram e apoiaram o tratado de livre-comércio entre Canadá, Estados Unidos e México, Alena, apesar das diminuição das proteções do meio ambiente que ele implicava.
“Eu não digo que tudos os grupos foram cúmplices: nem Greenpeace, nem os Amigos da terra, nem o Sierra Club. Também não o 350.org, que não existia ainda. Mas isso data das raízes do movimento. (…)
Estas elites históricas tinham decidido salvar a natureza, e elas eram respeitadas por isso. Então, se o movimento ambientalista tivesse decidido combater as empresas, suas elites teriam corrido o risco de perder sua aura, e ninguém estava pronto para assumir isso. Penso que esta situação está na origem do atual nível das emissões de gás do efeito estufa. (…)
A estratégia do chamado win-win é um fracasso, lamentavelmente. Era a ideia geral das trocas das permissões de emissão. Os grupos verdes não são tão experts como eles acreditam. Eles jogaram numa escala grande demais. Muitos de seus parceiros tinham um pé no Climate Action Partnership e o outro nas Câmaras de Comércio.”
Naomi Klein observa que na Europa, as coisas estão mudando num outro sentido. Mais de cem organizações tomaram posição para acabar com o mercado do carbono. “É o tipo de coisas que nos devemos fazer agora. Nós não temos mais o tempo para perder”.
A primeiras respostas indignadas – e argumentadas – começam a aparecer. O site ClimateProgress escreve:
“Não só ela está errada como ela está profundamente errada. Sua visão revisionista é errada, e é contradita por suas próprias prescrições políticas.”
O site destaca que na Europa, as emissões de gás carbônico diminuiram, o que ele atribui ao mercado das emissões dito ETS (European trading system):
Evolução das emissões de CO2 e do PIB na União Europeia. Fonte: Climate Progress
A resposta de Naomi Klein, publicada no seu site, é que esperem a saída de seu próximo livro, previsto para 2014.
A crítica das grandes ONG’s ambientais já foi feita na França. Em Quem matou a ecologia (Qui a tué l’écologie, ed. Les liens qui libèrent, 2011), o jornalista Fabrice Nicolino atacou o WWF, FNE e Greenpeace por causa de suas políticas de colaboração com as grandes empresas e o governo. Também em Como a globalização matou a ecologia (Comment la mondialisation a tué l’écologie, ed. Les Mille et une nuits, 2012), Aurélien Bernier mostra que a ideologia neoliberal influenciou fortemente o movimento ecologista a partir dos anos 1980.
Matéria socializada pelo blogue Racismo Ambiental, de Tania Pacheco e reproduzida pelo EcoDebate, 24/09/2013
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É, aqui no Brasil vemos a SOS Mata Atlântica volta e meia balançando a mão de quem ela deveria enfrentar…