Livro analisa como desconfiança nas instituições prejudica democracia
A percepção geral, comprovada pelas pesquisas, é de que os brasileiros estão insatisfeitos com as instituições políticas e e têm dúvidas de que elas atendam aos seus interesses. A crise de confiabilidade que afeta o país não é recente, embora venha sendo agravada nos últimos anos, desde as denúncias de corrupção que atingiram diversos partidos, parlamentares e o poder público – colocando em xeque o real papel dessas instituições para a manutenção do Estado e da democracia brasileira.
Um debate realizado neste mês no Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP discutiu esse cenário de profunda incerteza política, e como isso pode afetar o regime democrático. Participaram os pesquisadores Fernando Limongi, da Faculdade de Filosofia, Ciências Humanas (FFLCH) da USP; Marcus Melo, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE); Rachel Meneguello, da Unicamp; e José Álvaro Moisés, coordenador do Núcleo de Pesquisas em Políticas Públicas (NUPPS) da USP e professor da FFLCH.
O evento teve como ponto de partida o livro recém-lançado A Desconfiança Política e seus Impactos na Qualidade da Democracia (Edusp, 2013), organizado pelos professores José Álvaro Moisés e Raquel Meneguello. A obra corresponde ao segundo volume de uma pesquisa mais extensa realizada em uma parceria do NUPPS com o Centro de Estudos de Opinião Pública (Cesop) da Unicamp, denominada “25 anos de democracia”.
Mal estar
Segundo o autor do livro, o cientista político José Álvaro Moisés, a população, na sua grande maioria, tem uma visão muito crítica do funcionamento das instituições, dando origem ao que ele chama de ‘mal-estar com a democracia’. “Não é que as pessoas não queiram a democracia ou sejam contra. Pelo contrário. É justamente porque elas entraram no sistema democrático e se convenceram de que a democracia é uma alternativa melhor do que o autoritarismo que elas querem que a democracia funcione plenamente”, declara Moisés.
Para compor o estudo que levou a tais conclusões foi realizada uma pesquisa de opinião com dois mil entrevistados em diversas cidades do Brasil. O grupo procurava entender, principalmente, o que está envolvido na construção da democracia para os cidadãos.
Primeiramente, foi avaliado o papel que a corrupção tem sobre o exercício da democracia e, em seguida, foi analisada a relação dos brasileiros com a justiça, com a polícia e com alguns serviços públicos fundamentais. “As análises mostraram que o mau funcionamento dos serviços públicos, a ineficiência das instituições, e o fato de elas não estabelecerem contatos mais permanentes e sólidos com a população geram a desconfiança”, revela Moisés. E completa, exemplificando: “a polícia sofre desconfiança porque não consegue exercer seu trabalho com qualidade. Ela não consegue preservar a sobrevivência e a segurança da população”, avalia.
Entre coleta de dados e análises, o estudo que gerou A desconfiança Política e seus impactos na qualidade da democracia durou cinco anos, e contou com apoio da Fapesp e do CNPq.
A (des)confiança política
Uma das questões mais importantes que a pesquisa levanta, de acordo com Moisés, é qual a relevância que a confiança exerce no intermédio entre as instituições e o funcionamento da democracia. Os resultados das pesquisas de opinião pública mostraram que a legitimidade democrática pode ser afetada por um ambiente em que a desconfiança política seja muito forte.
Mas mais do que isso, o estudo evidenciou um comportamento dicotômico dos entrevistados que, às vezes, os levava a apresentar um distanciamento da democracia, e outras, os levava a admitir que a democracia poderia funcionar sem partidos e sem congresso – características típicas dos regimes autoritários. “Quando partidos, Parlamento e Congresso e parlamentares se desconectam da sociedade, recebem a crítica por parte dela. Recebem a desconfiança, a descrença”, ressalta o cientista político.
O estudo evidenciou um comportamento dicotômico dos entrevistados que, às vezes, os levava a apresentar um distanciamento da democracia, e outras, a admitir que ela poderia funcionar sem partidos e sem Congresso.
A lista dos fatores que ocasionam desconfiança política inclui ainda a confusão e a falta de compromisso com as ideologias que os partidos políticos pregam. “Os partidos tiveram uma queda progressiva da adesão que tinham nos anos 1980 e 90, quando fiz as primeiras pesquisas, porque assumiram uma lógica pragmática extremamente burocratizada perdendo assim a conexão com seus eleitores”, explica. “No caso do PT perdendo conexão com os movimentos sociais; no caso do PSDB perdendo a conexão com a classe média e os intelectuais; e no caso dos partidos mais conservadores, nem sequer se reuniram, porque ninguém quer dizer que é de direita no Brasil. Ninguém admite publicamente ser de direita”, completa.
Corrupção endêmica
Não foi aleatória a escolha a corrupção como primeiro quesito a ser analisado na pesquisa. Embora a corrupção exista em quaisquer países e em quaisquer regimes – inclusive em outros regimes democráticos – o problema no Brasil é ausência de mecanismos de punição e de controle eficazes.
O professor Moisés chama a atenção para o fato de que, para a grande maioria da população, a corrupção é vista como algo que sempre existiu e sempre existirá – o que de alguma maneira induz as pessoas a acreditarem que o uso indevido de recursos públicos é ‘normal’. Assim, a democracia acaba sendo distorcida em dois sentidos. Primeiro, porque os recursos que são manipulados pela corrupção são retirados de recursos que seriam aplicados nas políticas públicas e, segundo, porque os efeitos da corrupção induzem as pessoas a acreditarem que as leis são ineficazes, que as regras que organizam a vida democrática não valem na prática.
É nessa medida que a existência da corrupção, a ineficácia do judiciário, o acesso difícil das pessoas comuns à justiça, uma polícia que por vezes funciona de maneira arbitrária – pondo em risco a vida de setores da população -, enfim, todos esses aspectos, têm uma implicação na qualidade da democracia. “E ao perceberem uma qualidade mais baixa, ao invés de se prontificarem e darem a sua coloração ao sistema, as pessoas ficam com o pé atrás”, completa o docente.
2013, junho
Para Moisés, as manifestações de junho que tomaram diversas cidades do país e que reuniram milhões de pessoas são algo que, se não na exatidão de suas proporções e desdobramentos, poderia ter sido previsto com uma análise do cenário político. “As pessoas que estavam presentes nessas manifestações estavam reivindicando voz, participação e a necessidade das instituições serem eficientes”, explica. E complementa: “não é por acaso que os prédios das instituições de representação, como o Congresso Nacional e a Assembleia Legislativa, estão sendo objetos dessa invasão, desse ataque”.
Em sua análise, os jovens que organizaram essas manifestações e que somavam a grande maioria presente nelas não devem ser encarados como “baderneiros”. Eles não viveram em regimes totalitários e apenas buscam o exercício e a manutenção da democracia como ela é desejada, idealizada e difundida. “São os jovens que nasceram sobre a égide da democracia. Acreditaram na democracia e, por isso, mesmo estão pedindo por mais democracia”, explica Moisés.
Informe da USP, publicado pelo EcoDebate, 19/09/2013
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Agora professor sua pesquisa é DEZ. Conhecido o problema quem pode reverter esta situação?Que caminhos percorrer para resgatar a confiança? As manifestações de junho não deram pistas? Será que os politicos fizeram uma análise da situação ou estão todos, desta geração de políticos, escondendo a cabeça nas areais? Estão cansados e velhos? E cadê a nova geração de líderes. Porque não aparecem?É um enigma esta juventude que Sai às Raus e não se engaja? Ou nós não estamos permitindo que ela assuma seu s lugares para renovar nossa socieade? Sei não. Ficam aí as perguntas pats vocês, os pesquisadores.