Pais, artigo de Montserrat Martins
por Ed Carlos para o Humor Político
[EcoDebate] Deus queira que eu possa estar com meu pai no hospital no Dia dos Pais, a melhor alternativa nesse momento, após cirurgia dele. Estar com o pai é algo que não tem preço. Das coisas boas que eu tive na vida, desde não passar privações até poder estudar, nenhuma se compara a ter um bom pai. Pessoas que enfrentaram dificuldades maiores que as minhas me disseram a mesma coisa – e provavelmente as que não tiveram essa dádiva saibam mais ainda o valor de um bom pai.
Pai é uma necessidade primordial: nos anos 90, um grupo de terapeutas de família entregou um projeto ao Cedica, “Nenhuma criança sem pai”, uma campanha de registro de paternidade, pois na nossa cultura ainda há muitas crianças registradas só no nome da mãe. Todos sabemos a importância da mãe, mais cultivada em nossa cultura que a função paterna. Há bem mais escrito, cantado e filmado sobre as mães, cuja importância vital já está bem gravada na consciência de todos. Sendo tão frequentes os casos de filhos com mães mas sem pais, talvez seja hora de refletirmos um pouco mais sobre a função paterna. Que nem sempre é desempenhada pelos pais biológicos, substituídos por quem está disponível para acompanhar a mãe na tarefa: tios, avós, padrastos, padrinhos, amigos da família, que por seu convívio com a criança vem simbolizar o exercício do papel paterno.
Uma particularidade do bom pai que tenho a dádiva de ter é sua consciência de fazer parte de um mundo, uma sociedade, bem mais ampla que os limites da nossa família biológica. Lembro que ouvíamos noticiários juntos, que ele comentava com uma visão dos fatos eivada de sabedoria. Meu pai nunca me pressionou para enriquecer (embora naturalmente querendo que eu vivesse bem), sempre apoiou estudos e valorizou a participação em atividades que contribuíssem para a sociedade.
O bom pai que lhes narro tem orgulho dos filhos e netos, por serem estudiosos e trabalhadores, sonha em ter bisnetos, a realização que lhe falta. Na sua profissão como magistrado, teve seu papel na criação dos Juizados Especiais Cíveis (inicialmente Juizados de Pequenas Causas), coerente com sua visão de que as instituições existem para atender às pessoas, principalmente às mais simples e que mais necessitam do Estado. Uma vez pensei em escrever um livro sobre sua vida, o que não fiz ainda, mas que já tem o título perfeito: “A causa dos pequenos”.
Seja no sentido das pessoas vulneráveis socialmente, que necessitam do Estado, seja no sentido de cada “pequeno” (criança) que necessita de um pai, nada mais emocionante que contribuir com a causa dos pequenos. Ainda não foi realizada a campanha “Nenhuma criança sem pai”, mas chegará o dia em que essa prioridade entrará em pauta – é uma das iniciativas sociais de que necessitamos com urgência. Nada se compara mesmo, na nossa vida afetiva desde pequenos, à importância de ambos os pais.
* Filho de Mílton dos Santos Martins.
Montserrat Martins*, Colunista do Portal EcoDebate, é Psiquiatra.
EcoDebate, 13/08/2013
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