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O clamor da juventude marginalizada no Brasil na Jornada Mundial da Juventude (JMJ)

 

[Por Cristiano Morsolin, para o EcoDebate] Sobre as recentes manifestações populares no Brasil, papa Francisco comentou que são justas e que seguem o Evangelho.

 

Rio de Janeiro, 02/07/2013 – Movimentos sociais protestam, em frente à favela Nova Holanda, no Complexo da Maré
Rio de Janeiro, 02/07/2013 – Movimentos sociais protestam, em frente à favela Nova Holanda, no Complexo da Maré, e na Avenida Brasil, contra ação da tropa do Bope na comunidade em junho, que resultou na morte de 10 pessoas. Foto de Tomaz Silva/ABr.

 

O argentino revelou sua preocupação com a exclusão social de jovens. “Essa primeira viagem é para encontrar os jovens. Mas não no isolamento e sim no contexto de sua sociedade. Quando isolamos os jovens, fazemos uma injustiça. Eles pertencem a uma família, a uma cultura, a um país, a uma fé. Não podemos isolá-los da sociedade”, disse o papa. “Por isso quero encontrá-los em seu tecido social”, insistiu. “É verdade que a crise mundial não tem sido suave com os jovens. Li na semana passada quantos deles estão sem trabalho e acho que corremos o risco de criar uma geração que nunca trabalhou”, alertou o papa. “Trabalho dá dignidade a pessoa e a habilidade de ganhar o pão. A juventude está em crise”, alertou. “Estamos acostumados com uma cultura descartável. Fazemos isso com frequência com os idosos e, com a crise, estamos fazendo o mesmo com os jovens. Precisamos de uma cultura de inclusão”, apelou o papa (1).

Na Jornada Mundial da Juventude (JMJ), a Pastoral da Juventude vai discutir o extermínio da juventude pobre no Brasil.

O teólogo Leonardo Boff denunciou que “Durante a jornada, o papa vai defender a vida. Ele conhece de perto esta situação da criminalização da juventude, até porque isso também acontece na Argentina, e o cenário é até pior do que no Brasil. Aqui, especialmente a polícia no Rio e em São Paulo, sobe o morro e não prende mais, eles matam. Pequisas mostram que a maioria dos jovens mortos levam tiro na cabeça, são execuções, ou seja, crimes contra a humanidade. O Estado não pode tolerar isso” (2).

Thiesco Crisóstomo, secretário nacional da Pastoral da Juventude (PJ), partilhou a realização do Seminário da Campanha Nacional contra a violência e extermínio de jovens, realizado de 3 a 5 de maio, e enfatizou o clamor da juventude presente na atividade para que, como cristãos, “possamos lutar pela vida da juventude e que a redução da maioridade penal não é a solução para a questão violência que assola no país e, sim, uma maneira de criminalizar a juventude”, afirmou o jovem.

Com a realização da Campanha Nacional contra a violência e extermínio de jovens a Pastoral da Juventude reafirma a sua luta pela vida, com destaque para que adolescentes e jovens sejam reconhecidos como sujeitos de direitos e tenham vida em abundância”, afirmou Joaquim Alberto (3).

Insatisfação latente

Roberto Malvezzi, assessor da Pastoral da Terra CPT, membro da equipe de assessoria da 5a Semana Social Brasileira, considera que “havia surpresa e perplexidade quando a juventude das periferias francesas explodiu em revoltas e protestos “nada pacíficos” alguns anos atrás. Afinal, tudo parecia normal no mundo europeu e particularmente na França.

Entretanto, aos poucos se revelava que ali havia uma insatisfação latente, que explodiu de forma espontânea, aparentemente anárquica, desconexa, desvinculada de partidos políticos e organizações tradicionais das esquerdas.”

Porém, o que motivava a revolta da juventude francesa, aquela das periferias, muitas vezes dos filhos de imigrantes, era a condenação perpétua à sub-cidadania. Embora protegidos por algumas políticas sociais, sabiam que seu destino era vegetar o resto da vida às margens da sociedade, vivendo do mínimo, enquanto a sociedade opulenta à sua volta podia viver o que a o consumo entende por cidadania plena. Era a revolta contra a situação de gueto, de marginalização, de exclusão do mundo pertencente aos senhores da França.

Em uma reunião da Semana Social Brasileira conversamos sobre esse fenômeno, achando que um dia ele chegaria ao Brasil. Não estávamos errados. Num primeiro momento há certo contentamento com políticas de compensação social, mas ele não dura eternamente. Depois de satisfeitas certas necessidades básicas, a população sai em busca da cidadania plena. E ela tem se revelado nos acontecimentos de rua do país.

Primeiro, a insatisfação com o gasto do dinheiro público em obras faraônicas, inúteis, que satisfazem o apetite das empreiteiras e políticos, mas não as necessidades da população. A juventude protesta contra os estádios da copa, assim como protestamos contra a Transposição do São Francisco, assim como o movimento indígena protesta contra Belo Monte. Um país carente de transportes públicos – os vinte centavos são o pretexto -, com as ruas ocupadas em 80% por carros individuais, enquanto o transporte público leva 80% da população ocupando apenas 20% do espaço público, a roubalheira nas grandes obras, a falta de estradas decentes, o salário minimizado dos professores públicos, a saúde precária do SUS, o avanço do agronegócio sobre as águas e territórios tradicionais, tantos outros elementos que poderíamos agregar a esses, fazem um caldo de revolta latente que em algum momento virá à tona, mesmo que para muitos pareça irracional.

A revolta da população com essas políticas – e a falta delas para o povo – deve se agudizar daqui para a realização da copa do mundo. As injustiças sofridas pelos afetados pelas obras da copa são tão claras, tão visíveis, que as redes sociais se tornam instrumentos de convocação para qualquer ato. Mas, as pessoas saem às ruas é porque não estão satisfeitas, não porque “é típico da juventude” como desdenhou a presidente Dilma. O protesto só não é maior porque os atingidos pela Transposição, Belo Monte, indígenas, quilombolas, etc., estão longe dos centros urbanos.

Enfim, esgotamos o período de satisfação do Bolsa Família e outras formas de transferência de renda. Não que o povo que dele necessita vá desistir do que conquistou. Basta recordar o que aconteceu com o boato de sua extinção dias atrás. Mas, se as autoridades pensam que o povo vai assistir calado a tantas injustiças só porque já tem esses programas de compensação social, é bom olhar para o que aconteceu nas periferias francesas (4).

Estado e a violência contra a Juventude

Rosilene Wansetto, cientista social e mestre em Ciências Sociais pela PUC/SP, membro da Comissão de Formação do Conselho de Leigos da Arquidiocese de São Paulo (CLASP), e da Rede Jubileu Sul Brasil, analisou que “vivemos uma profunda e intensa mudança de época, de paradigmas e das formas tradicionais de ver e de analisar o mundo, é assim que o texto base da CF/2013 inicia a reflexão neste ano e tem a juventude como tema. Neste ensaio quero convocar a todos a refletir sobre a realidade vivida pelos jovens pobres, que vivem nas nossas periferias, negros ou brancos, que sofrem no cotidiano de suas vidas a violência e a criminalização. E ao mesmo tempo contribuir na reflexão sobre o Estado que temos.

A violência sofrida pelos nossos jovens se dá de diversas formas, seja pela ausência de políticas públicas ou pela presença violenta e repressiva do Estado. As mudanças de valores e de sentido de vida realmente expõem nossos jovens a situações de vulnerabilidade, isso ocorre devido a fragmentação da própria sociedade alicerçada em grande medida pelo consumo, pelo mercado e pelas parcas condições de vida oferecida. O que é mais grave é a forma como o Estado age com nossos jovens que estão expostos as vulnerabilidades sociais, muitas vezes provocadas pelo próprio Estado, com a ausência de políticas públicas (o desemprego, a ausência de vagas nas escolas e universidades, violações de direitos de diversas ordens, remoções forçadas e despejos, etc.).

As mudanças sociais, políticas, econômicas, culturais realmente podem gerar na juventude atitudes e consequências que os levem a desestruturação, mas a ausência de políticas públicas, que é uma responsabilidade do Estado, pode ser o principal fator de desestruturação e gerador de violência.

Quando vemos os noticiários – televisão e jornais – os jovens têm aparecido em evidencia, seja como protagonistas de violência ou como sofredores da violência. Neste caso devemos antes de tirar conclusões olhar o gerador dessa situação, muitas vezes as desigualdades socioeconômicas e culturais expõem nossos jovens a grande nível de vulnerabilidade. Quando analisamos os dados percebemos que a população jovem negra é de mais de 70% e mais de 30% dos jovens brasileiros estão na faixa de até meio salário mínimo. Isso nos evidencia uma enorme desigualdade social e de distribuição de renda. E aproximadamente 2 milhões de jovens vivem em favelas ou moradias inadequadas, destes 66,9% são negros e 30,2% vivem com até meio salário mínimo.

Por isso, quando no início nos referimos aos jovens negros e pobres como os mais vulneráveis no quesito violência e a criminalização partimos desses números. Pois o jovem pobre quando vai fazer uma ficha de trabalho e dá o endereço da favela já é em parte descartado pelo mercado e quando mora na favela e é negro, a situação da descriminalização é ainda maior, é descartado. Fica cada dia mais evidente a ‘ditadura’ da brancura e do ser e ter disfarçada em nossa sociedade, que anuncia ao mundo que aqui não tem racismo e o quanto somos um povo pacato, ordeiro e acolhedor.

Nesta mudança de época, só a violência e a criminalização dos jovens não mudou, haja vista os dados do Mapa da Violência de 2012 que indica que enquanto a taxa de mortalidade total da população brasileira caiu, a dos jovens subiu puxados pelos homicídios (entre os jovens esse percentual é de 40%, já entre a população não jovem é de 2%). Os homicídios (leia-se assassinatos) subiram consideravelmente entre os jovens negros 135% e pardos 122,8%, já entre os jovens brancos ficou em 63,9%, conforme o texto base da CF/13 nos chama a atenção, para cada jovem branco morto, em média, morre dois jovens negros e pobres.

Essas taxas refletem a necessidade de repensar o Estado e a sua política pública para os jovens, mesmo que tenhamos dados passos nestes últimos anos com a aprovação de Estatutos da Juventude, por exemplo. Tenho certeza, que estas são iniciativas importante, porém não basta!

Não é através do aparato policial que essas taxas serão revertidas ou mudadas, não queremos mais ver nossos jovens morrendo. Sabemos que muitos jovens estão no tráfico, nas drogas, e cometem diversos outros crimes. Mas antes de apontarmos o dedo condenando um jovem, devemos nos perguntar o que nossa sociedade, nosso Estado, nossa Igreja tem oferecido de fato para mudar essa realidade?

O Estado pela sua forma é detentor do poder das armas conforme define Hobbes, por isso sua forma de agir é através da repressão, porém somos sabedores que há outra face deste Estado, o que pode oferecer políticas publicas para os jovens e para todo o seu povo. Queremos um Estado que se desenvolva para o seu povo, invista nas pessoas, e não gaste quase 44% do seu orçamento anual com o pagamento de dívidas (seja ela externa ou interna), como tem sido o caso brasileiro nestas ultimas décadas. Ou ainda financiando empresas privadas com dinheiro público, e ao povo resta a conta.

Quando observamos os investimentos em políticas públicas seja para a juventude ou nos direitos de modo geral, a pizza do orçamento pouco se altera ano após ano. Em 2012 o governo brasileiro gastou 43,98% (R$ 752,93 bilhões em amortizações e juros da dívida interna e externa – dívida publica), que significaram R$ 45 bilhões a mais do que foi gasto em 2011 e que beneficiam aproximadamente 10 mil “credores” da dívida (especuladores, bancos,…). Em dezembro de 2012, a dívida interna bruta alcançou R$ 2,823 trilhões, e a externa US$ 441,757 bilhões – o endividamento brasileiro é maior que R$ 3 trilhões. Isso tudo para dizer o quanto é necessário reverter a ordem de prioridade, a prioridade deve ser as políticas públicas, casa, transporte, trabalho, saúde, educação, seguridade social, cultura, saneamento, etc., investir em políticas sociais não é um atraso, mas ao contrário, é desenvolver, é crescer, é respeito a vida e a dignidade.

Queremos um Estado a serviço da nação, de nossos jovens, não um Estado violento, repressor e criminalizador. Queremos nossos jovens, negros, pardos, brancos, pobres vivos e construindo essa sociedade justa e fraterna e vivendo e sendo protagonistas do presente, sonhando com o futuro, construindo o projeto popular. Basta de violência contra nossos jovens. Basta de extermínio“(5).

A violência fardada

No texto Quem vigia os vigias: um estudo sobre controle externo da polícia no Brasil, (2003 317 p.) publicado em 2003, Lemgruber, MusumeciCano afirmam que a Polícia Militar ainda hoje traz em si uma herança doperíodo da ditadura militar, tempo em que a organização se fazia valer pela “máxima” de que todo aquele que se apresenta como “inimigo” deveria ser exterminado. Neste período o inimigo era caracterizado pelosguerrilheiros/comunistas, hoje, sem estas figuras, os negros, pardos e favelados, passam a ser os “opositores da ordem pública”, logo, são alvos das investidas policiais, lembra Lídia Maria de Lima (6).

Não podemos ignorar o fato de que esta prática de violência policial contra negros, identificada como “uma forma de manter a ordem”, é muito anterior ao período da ditadura. Suas bases são escravocratas e mesmo após o período da abolição, as autoridades policiais seguiam agindo de maneira violenta contra a população pobre de nosso país (vale lembrar que esta era composta majoritariamente por pessoas negras e indígenas).

As práticas religiosas e culturais da negritude eram vistas como atos de bruxaria e desordem, basta pensarmos na discriminação sofrida pelas religiões afro-brasileiras (que ainda é presente) e nas rodas de capoeira e samba que eram identificadas como “vadiagem”. “A violência era exercida de várias formas, pois ao mesmo tempo em que a polícia deteve poder legal para punir escravos, também lançava mão de prisões arbitrárias e espancamentos para exercer a intimidação e a punição dos pobres em geral” (7).

A socióloga Helena Wendel Abramo considera que “por muito tempo “invisíveis” e sem interlocutores públicos, na última década muitos atores juvenis vieram se manifestar (muitas vezes por meio de uma linguagem mais cultural que propriamente política) a respeito das questões que os afetam nesta conjuntura de virada de século, e que não estão sendo respondidas nem pelas soluções desenvolvidas para a infância e adolescência, nem pelos serviços estruturados para a população adulta. 

Tais questões se relacionam a necessidades ligadas a diversas dimensões de suas vidas e são, politicamente, “novas”, sob a ótica desta especificidade, ou seja, não constam ainda do repertório das soluções já testadas e estruturadas. Além da reivindicação do cumprimento do direito à educação – a uma educação para todos, completa e de qualidade – (que, na verdade, é o único direito reconhecido aos jovens, no plano retórico, pelo menos ), os jovens têm expressado demandas por mecanismos de apoio e participação em várias outras áreas: trabalho, saúde, lazer, cultura, circulação pelo espaço público, política. 

Tomar os jovens como sujeito de direitos significa, portanto, em primeiro lugar, reconhecer a especificidade de sua condição e a singularidade da sua experiência geracional; significa também olhar suas demandas como relevantes e pertinentes ao debate público. Exige, como aconteceu no caso das crianças e adolescentes, que se vá além da ótica que apreende os jovens como risco ou problema social, assim como da perspectiva que os situa apenas como sujeitos voltados para o futuro, negligenciando a sua vida e necessidades no presente. Implica, necessariamente, incorporar a participação de seus interlocutores (aqueles que expressam esta experiência e condição singular) nas disputas que definem as formulações sobre os direitos e sobre as políticas. Ou seja, significa abrir um debate público democrático sobre tal pauta de demandas e sobre o modo como podem e devem ser respondidas pelo estado e pela sociedade” (8). 

Seminário Internacional da Juventude Operária Católica JOC Brasileira

A Juventude Operária Católica JOC Brasileira também vai participar da JMJ, no Rio. Dia 25 de julho (quinta feira) já realizou junto com o CEDAC – Centro de Ação Comunitária, um Seminário Internacional de Juventude. A Juventude Operária Católica (JOC Brasileira) organizou o Encontro Continental da Juventude Operária Católica na América, evento que aconteceu até o dia 12 de novembro do 2011 no Colégio Assunção, na cidade do Rio de Janeiro. O objetivo do encontro foi revisar, planejar, formar e projetar ações de referência que permitam fortalecer as ações do grupo, na luta e na transformação da Juventude Trabalhadora nas Américas, tendo como marco a Campanha pela Proteção Social. A JOC América, escolheu como tema “Por Nossa Ação Militante, Vida e Transformação da Juventude Trabalhadora”. Participaram militantes da JOC do Haiti, Chile, Quebec, Paraguai, Peru, Venezuela, Nicarágua, Guatemala, Costa Rica, República Dominicana, Colômbia, Bolívia, Equador e Brasil.

A deputada estadual Inês Pandeló (PT-RJ) realizou no dia 31/10/2011, no plenário da Assembleia Legislativa do Rio, sessão solene em homenagem à Juventude Operária Cristã/Católica – JOC. Segundo a parlamentar, o evento, que abre o “Encontro Continental da JOC”, tem um significado importante e faz lembrar sua juventude. “Lembro-me de um poema que compus a partir de um encontro que participei da JOC em meu município, Barra Mansa; era um período de ditadura e a juventude dava seu sangue na luta pela democracia”. Inês completou dizendo que através da força da juventude, da mobilização será possível transformar o mundo. “Somente com a união conseguiremos mudar nossa realidade”.

Durante a sessão solene, a jovem Isabel Molina, da JOC da Nicarágua, recebeu a Medalha Tiradentes, maior comenda ofertada no Estado do Rio de Janeiro, a título da Juventude Operária Cristã na América. Isabel, que falou em nome da mulher trabalhadora, se disse emocionada em receber a honraria. “Mi compromiso es con la militancia. Adelante jovenes“. Em nome de Padre Agostinho Pretto, o padre Adelar Pedro de David recebeu o Titulo de Benemérito do Estado do Rio, uma homenagem post mortem ao sacerdote. Padre Agostinho foi uma das principais lideranças da Juventude Operária Católica. Na década de 1960, foi Assessor Nacional e depois Latinoamericano da JOC. Em 1970, ele e outros militantes da JOC foram presos pela ditadura militar. Em 1974, mudou-se Nova Iguaçu. Agostinho fundou a Pastoral Operária e exerceu durante anos a coordenação nacional do movimento. Foi fundador também da Associação Nacional de Presbíteros. Durante mais de 20 anos foi o pároco da Catedral de Santo Antônio. Antes de sua morte, aos 87, no último dia 6 de outubro, Padre Agostinho era pároco da Paróquia São José Operário, no bairro Califórnia.

A haitaina Rose Perlyne Guillaume foi agraciada com o Título de Cidadã do Estado do Rio de Janeiro com o Título de Cidadã do Estado do Rio de Janeiro. Por razões de saúde, ela não pôde comparecer e a irmã Rose Missole Guillaume recebeu a comenda. A jovem sofreu sérios ferimentos durante o terremoto que devastou o Haiti no ano passado. Maria da Penha Pereira da Silva, da JOC de João Pessoa (PB), foi agraciada com o Título de Cidadã do Estado do Rio de Janeiro.

A JOC é um movimento educativo e de ação com o objetivo formar jovens e levá-los a descobrir e tomar consciência dos problemas e da necessidade de transformar a realidade que os envolve. Com missão evangelizadora, ela defende que o anúncio de Jesus Cristo é inseparável do compromisso de luta pela libertação e dignidade dos jovens do meio operário. A JOC nasceu na Bélgica em 1925 por iniciativa do jovem padre Joseph Cardijn e de um grupo de jovens trabalhadores. Nasceu para dar resposta à situação de sofrimento e exploração vivida pelos jovens operários e à necessidade da Igreja os entender e organizar. Também fizeram parte da mesa de oradores a Coordenadora Nacional da JOC Brasileira, Alessandra Lazzari; e Pedro Grabois, representando o Conselho Nacional de Juventude. No plenário ainda estavam presentes delegados da JOC do Paraguai, Equador, Peru, Canadá, Bolívia, França, Guatemala, Venezuela e de vários estados do Brasil (9).

O caso da massacre na praça da Igreja da Candelária

Mais de 50 crianças e adolescentes de rua costumavam dormir na praça da Igreja da Candelária, região central do Rio de Janeiro. Na madrugada de 23 de julho de 1993, policiais militares, em horário de folga, atiraram contra nove deles, com idades entre 11 e 20 anos. Dos atingidos, apenas um sobreviveu. Durante as investigações, levantaram-se diferentes razões para o crime. De uma pedra atirada contra uma viatura da polícia por um dos garotos até o não pagamento de propina aos PMs coniventes com o tráfico de cocaína, comentou Leonardo Sakamoto.

Quatro pessoas foram acusadas após a chacina: Marcus Vinícius Emmanuel, Cláudio dos Santos e Marcelo Cortes e o serralheiro Jurandir Gomes de França. Em 1996, Nelson Cunha confessou sua participação no crime e acusou seus colegas policiais Marco Aurélio Alcântara, Arlindo Lisboa Afonso Júnior e Maurício da Conceição, assassinado em 1994.

Desses, Emmanuel, Alcântara e Cunha, foram condenados a penas que chegaram a 300 anos de reclusão, respectivamente. Mas, hoje, estão em liberdade, indultados ou em condicional.

Arlindo foi condenado a dois anos porque uma das armas usadas na chacina foi encontrada em seu poder. Cláudio, Jurandir e Cortes foram inocentados com o depoimento de Cunha e absolvidos a pedido do Ministério Público. Os dois primeiros foram indenizados pelo Estado por ficarem presos injustamente por quase três anos.

Na época, os meninos afirmaram que oito policiais participaram da ação, e Wagner dos Santos, o único sobrevivente, foi contundente ao reconhecer Cortes como um de seus algozes. Hoje, a vítima mora na Suíça, após ter sofrido um atentado e recebido constantes ameaças de morte. Carrega as sequelas do crime, como balas alojadas no corpo.

Os promotores do processo afirmam que havia mais policiais envolvidos, mas durante as investigações não foi possível identificá-los.

A repercussão internacional decorrente da exploração do caso na mídia e do trabalho das ONGs ajudou na condenação dos policiais. Mas a pressão da mídia também prejudicou o andamento do processo por dar a ele um sentido de escândalo, impedindo o aprofundamento na investigação. Daí, alguns foram injustiçados e outros saíram impunes.

O Estado, porém, não teve competência para garantir uma vida melhor ao restante dos jovens que dormiam sob as luzes da Igreja da Candelária. Muitos sobreviventes morreram assassinados, vítimas da Aids, outros serviram ao tráfico, foram para prostituição e há os que desapareceram. Sandro, o sequestrador morto pela polícia no caso do ônibus 174, caso que inspirou um filme, escapara daquele dia na Candelária.

Nas últimas duas décadas, o Brasil bateu recordes na geração de empregos, reduziu a fome e a pobreza, manteve sua economia estabilizada, consolidou sua democracia. Tornou-se parte de um acrônimo (Bric), ganhou respeito internacional e começou a pavimentar seu caminho para se tornar a quinta maior economia do mundo – processos que, em maior ou menor grau, devem ser creditados aos governos que conduziram o país nesse período. Diante de um cenário de pujança como esse, pergunto-me porque o Brasil continua encontrando formas idiotas de matar seus filhos.

Pensávamos que não cometeríamos os mesmos tipos de “erros” de 20 anos atrás, mas não foi bem assim. Carandiru (1992), Vigário Geral (1993), Ianomâmis (1993), Candelária (1993), Corumbiara (1995), Eldorado dos Carajás (1996) ganharam roupagem nova e continuam acontecendo. Ou seja, o modelo se se manteve: continuamos matando gente pobre.

Nos últimos dez anos, o país assistiu a centenas de assassinatos de trabalhadores rurais indígenas, quilombolas e ribeirinhos em conflitos agrários (e daqueles que ousaram os ajudar), massacres de sem-teto e população em situação de rua, mortes de homossexuais. Isso sem contar os jovens negros e pobres na periferia de grandes cidades, como São Paulo.

Como em agosto de 2004, quando moradores de rua foram espancados no Centro de São Paulo, na região do Largo São Bento, Praça João Mendes e Rua 15 de Novembro. Sete não resistiram e morreram em decorrência dos ferimentos. Policiais militares e seguranças privados foram apontados como responsáveis, formando uma espécie de grupo de extermínio.

Ou em maio de 2006, em que cerca de 500 pessoas, a maioria de jovens, negros, pobres e moradores de periferia foram mortos no Estado de São Paulo. O indícios apontam para policiais e grupos de extermínio ligados a eles como retaliação aos ataques do PCC.

Ou ainda a condição dos guarani kaiowá do Mato Grosso do Sul, que enfrentam a pior situação entre os indígenas do Brasil, apresentando altos índices de suicídio e desnutrição infantil. O confinamento em pequenas parcelas de terra por conta do avanço do agronegócio no estado é uma das razões principais para a precária situação do povo. O Estado vem concentrando a maioria dos assassinatos de indígenas no país, boa parte delas diretamente relacionadas com a disputa pela terra. Mesmo em reservas já homologadas, os fazendeiros-invasores se negam a sair. E contam com a ajuda da segurança pública, a mando do poder público ou a soldo particular.

Muitos policiais estão envolvidos com os crimes citados. Poderiam muito bem afirmar que estava “cumprindo ordens”, como os nazistas em Nuremberg. Pois, o que ocorreu em muitas dessas chacinas foi um servicinho sujo que parte de nós, “homens e mulheres de bem”, desejavam (e ainda desejam) em seus sonhos mais íntimos: a “limpeza social” desde país das “classes perigosas” e dos entraves para o progresso. Vamos ser sinceros. Não é que a nossa sociedade não consegue apontar e condenar os culpados por todas elas como deveria. Ela simplesmente não faz questão. Porque, como já disse aqui, não suportaria um espelho no banco dos réus” (10).

Para o professor do Departamento de Comunicação da PUC-Rio e autor do livro “Cidade Cerzida”, Adair Leonel Rocha, chacinas com moradores de rua não mobilizam a população. Segundo ele, as chacinas são uma banalização da vida, algo que ocorre no cotidiano na medida em que grande parte da população não tem acesso ao poder público e a tudo que tem direito.

A chacina é uma das formas de destruição e aniquilamento. A visão geral da população é que as pessoas que trazem riscos devem ser aniquiladas, então a chacina da Candelária foi vista como algo bom, como uma limpeza necessária.

Rocha alerta que as chacinas ainda acontecem, principalmente dentro das favelas e em comunidades empobrecidas. Segundo ele, os mortos acabam virando só um número. Ele ainda aponta a lógica da escravidão como uma explicação para esse pensamento, já que a matança é vista como uma coisa natural e a própria população empobrecida aceitaria essa ideia de que é menos importante do que as classes dominantes. E propõe: “O avanço do processo democrático da cidadania aumenta a visão crítica e questiona esses valores estabelecidos” (11).

Conclusão

Vou concluir essa matéria com as palavras do senador Cristovam Buarque, do PDT e Ministro da Educação do primeiro governo Lula, que em artigo no Jornal Folha de são Paulo, parafraseou Marx no livro A miséria da filosofia, no qual confronta Proudhon, que escreveu “A filosofia da miséria”. O título do artigo de Buarque é “A miséria da superação”, em oposição à “superação da miséria”. Sua argumentação põe a nu toda a demagogia de sua aliada:

“Primeiro, cabe observar que os 22 milhões de brasileiros que são apresentados como tendo superado a miséria recebem R$ 70 por mês. Isso equivale a R$ 2,34 por dia para uma família de cinco pessoas ou 1,4 pão por dia para cada um dos membros. Não são mais os retirantes que a fome expulsava de suas terras por comida, mas ainda não é possível afirmar que saíram da miséria”.

Bastaria uma inflação de 8% ao ano para que, em quatro anos, os atuais R$ 70, sem reajuste, passassem a valer R$ 51,45, o que não compraria nem mesmo um pão por dia para cada membro da família.

Segundo, é grave a ilusão de que a miséria pode ser superada sem se assegurar a estrutura que permita o salto sem volta. Mesmo com a renda do Bolsa Família, os beneficiados permanecerão na mesma situação social. Continuarão sendo cidadãos sem educação, sem esgoto, sem água potável e sem condições de empregabilidade. Isso não é superação.

Terceiro, apesar de mitigar o sofrimento, o programa Bolsa Família não abre a porta de saída da extrema pobreza, não abole a miséria nem provoca um salto social sem retrocesso. Embora o governo não informe, há grande possibilidade de que alguns dos atuais pais beneficiados pela Bolsa Família tenham sido crianças de famílias com a bolsa.

Cria-se um círculo que nega totalmente o conceito de superação aplicado aos resultados obtidos. Prova disso é que o governo comemora o aumento do número dos que recebem o Bolsa Família. Não comemora, no entanto, a redução do número dos que necessitam da transferência de renda do governo para compensar o que a estrutura social e econômica não faz para superar a miséria de forma sustentável, com mudanças estruturais e escola de qualidade para todas as crianças.

Ao dizer que houve superação da miséria, a presidenta corrompe o dicionário. Cria a ilusão que pode acomodar o espírito de solidariedade transformadora de que o país precisa. Todos sonham com a superação da miséria, não com o conceito de superação empobrecido” (12).

NOTAS

  1. http://rondoniaempauta.com.br/nl/nacional/visita-e-em-momento-oportuno-diz-papa-sobre-protestos-no-brasil/

  2. http://www.brasildefato.com.br/node/14420

  3. http://www.ccj.org.br/site/noticias.php?op=VerNot&idNot=1134

  4. http://www.jubileusul.org.br/nota/1201

  5. http://www.jubileusul.org.br/nota/866

  6. https://www.metodista.br/revistas/revistas-ims/index.php/CA/…/3586

  7. CARVALHO, D. A questão racial e o direito à vida: os desafios para uma sociedadedemocrática. 293p. In: 5º Relatório Nacional sobre Direitos Humanosno Brasil. 2001-2010 / Núcleo de Estudos de Violência (NEV-USP). São Paulo,2012. Disponível em: <http://www.nevusp.org/downloads/down265.pdf >.

  8. http://www.ondajovem.com.br/acervo/5/juventude-em-construcao

  9. http://www.inespandelo.com.br/page/internaImprimir.asp?cod=863

  10. http://blogdosakamoto.blogosfera.uol.com.br/2013/07/23/candelaria-20-anos-pais-rico-e-pais-sem-chacina/

  11. http://www.editora.vrc.puc-rio.br/cidade_cerzida.html

  12. www.folha.uol.com.br/

* Cristiano Morsolin, operador de redes internacionais para a defesa dos direitos da criança na América Latina. Co-fundador do OBSERVATÓRIO SELVAS, é colaborador internacional do Portal EcoDebate.

 

EcoDebate, 29/07/2013


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