Uso de técnicas do planejamento estratégico empresarial nos planos diretores agrícolas: uma solução possível? por João de Deus Barbosa Nascimento Júnior
Uso de técnicas do planejamento estratégico empresarial nos planos diretores agrícolas: uma solução possível?!
João de Deus Barbosa Nascimento Júnior1
- Resumo:
Instrumentos motivacionais de grupos de interesse na formatação das políticas públicas e técnicas (Planos Estratégicos, diversas formas de crédito, propriedade privada, Usucapião individuais e coletivos, ferramentas Institucionais de planejamento territorial, etc.) e legais (Planos Diretores, Zoneamentos Urbanos e Peri – Urbanos, Estatutos das Cidades, Uso dos Solos Urbanos, etc.), têm como condição básica precípua: à organização, participação e fortalecimento das capacidades de gestão dos agentes dos poderes locais, em uma escala urbana, rural ou simplesmente territorial, formando o alicerce, tanto construção do plano de desenvolvimento endógeno local quanto regional, quer seja no âmbito municipal, estadual ou federal, formando assim, o capital social adequado ao cumprimento das ações necessárias ao incremento de atividades instigadoras dos órgãos responsáveis pelo planejamento urbanos e rurais, a cumprirem suas missões na implementação, das já existentes e de novas políticas públicas, voltadas para benefício dos cidadãos. Esse trabalho tem como objeto central, mostrar um novo modo de aproximar os interesses locais, as políticas públicas e seus beneficiários, via a adoção de práticas desenhadas de forma estratégica, para aplicação tanto urbana quanto rural das ferramentas de planejamento existentes.
Palavras Chaves: Planejamento Estratégico Urbano e Rural; Administração Rural.
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Summary:
Motivational tools of interest groups in shaping public policies and techniques (Strategic Plans, various forms of credit, private property, individual and collective adverse possession, Institutional territorial planning tools, etc…) And legal (Master Plans, zoning regulations and Peri – urban status of Cities, urban land use, etc..) have major duty as a basic condition: the organization, participation and strengthening of management capacities of local actors in an urban scale, rural or simply territorial, forming the foundation both construction plan local and regional endogenous development, whether in municipal, state or federal laws, thus forming the capital adequate to accomplish the actions necessary for the development of activities instigators of the bodies responsible for urban planning, to fulfill their missions and implementation of existing and new public policies, aimed at benefiting citizens. This work has as central object, showing a new way of bringing local interests, public policies and their beneficiaries, through the adoption of practices strategically designed for both urban and rural application of existing planning tools.
Keywords: Strategic Planning Urban and Rural Administration.
- O planejamento urbano no Brasil – teoria e prática:
Após a Constituição Federal de 1988, os municípios brasileiros passam a assumir um papel determinante na estrutura administrativa nacional. O repasse de responsabilidades para esse âmbito (saúde e educação basicamente), e, o crescimento da organização e da representatividade junto à sociedade civil (sindicatos, associações, conselhos, etc.), transformou essa esfera de decisão em uma dos suportes para a democracia no País. Participar, democratizar, descentralizar, se tornou verbos correntes em todos os discursos. Por outro lado, a escassez de recursos públicos tem incentivado a criatividade dos grupos de interesse, permitindo o surgimento de iniciativas modernas e eficientes na solução de problemas relacionados à gestão territorial dentre outros. Nesse sentido, a descentralização das decisões e das ações mostra-se eficaz na racionalização de recursos (financeiros e humanos), permitindo a redução dos desperdícios e o aumento dos benefícios às populações, transformando os municípios num território privilegiado para a dinamização de processos de desenvolvimento local, esse é o caso de pequena parte dos municípios brasileiros, àqueles localizados em regiões mais desenvolvidas economicamente e com um contingente de pessoal treinado e capaz de resolver suas questões voltadas a planificação municipal, mas para àqueles municípios onde a desinformação e a desorganização imperam na gestão, proporcionando a elevação dos desperdícios, a corrupção, os gastos com consultorias, etc., que, no nosso caso (regiões Norte e Nordeste), onde a grande maioria deles, essas questões se torna preocupante. Daí tem a teoria, ou seja, o que, como e quando deveria ser feito, mas a prática mostra-se contrária: não se sabe como, quando e muito menos quais as ferramentas disponíveis para se planejar dentro de um enfoque municipal, regional ou territorial.
Essa descentralização deveria fortalecer a capacidade de gestão dos poderes locais na direção de uma política mais participativa (ex. orçamento participativo) numa escala de economia local, constituindo assim, uma das principais tarefas no âmbito do desenvolvimento de novas institucionalidades locais. Fazendo com que os gestores municipais pudessem perceber com maior precisão as especificidades das carências, restrições e potencialidades de cada localidade, sem esses instrumentos técnicos e políticos de governança, não se promovem uma conversão, de forma organizada, na busca de soluções de problemas comuns a população, gerando assim dificuldades para a formação de capital social mais próximo dos interlocutores institucionais, políticos e técnicos, havendo dificuldades para a aproximação das estruturas capazes de formatar cenários para balizar as decisões de caráter desenvolvimentista, e, por outro lado, aumentando a capacidade do controle social para o estabelecimento e reorientação das políticas públicas.
O uso de ferramentas mais modernas de gestão, dentre elas, o planejamento estratégico, trazido das organizações privadas, é adaptado às diversas peculiaridades regionais e municipais por vários gestores públicos brasileiros, deixando-se aos poucos as velhas formas de gestão na medida em que os instrumentos tradicionais de planejamento urbanos já não eram mais adequados para lidar com a dinâmica do crescimento das médias e grandes cidades. Com esse instrumento, os municípios são administrados de forma mais flexível e dinâmica através de projetos e técnicas de trabalho participativas e mais transparentes.
Essas técnicas nasceram da necessidade de contato, comunicação, organização e relação entre as pessoas, já que a gestão de cidades nos remete ao vislumbramento do conturbado, contraditório e complementar cotidiano urbano.
Contudo, mesmo reconhecendo esse cenário de tensões e diversidades, materializado no ambiente urbano, o que foi proposto para as cidades foram planos urbanísticos, impostos muitas vezes pela esfera governamental, tendo como concepção inicial o uso de modelos perfeitos de ordenamento das cidades sem o necessário contraditório popular. Mas o resultado não foi o esperado, na maioria das vezes, mesmo naquelas cidades ditas “planejadas”, veja o caso de Brasília, nosso Distrito Federal, em cujo plano, estabelecia a ocupação por quinhentos mil habitantes, hoje está na casa de dois milhões.
Em linhas gerais o planejamento estratégico preconiza ou pode ser entendido como sendo um processo de trabalho permanente, que tem por objetivo final, a organização sistemática de meios a serem utilizados para atingir uma meta, que contribuirá para a melhoria de uma determinada situação, no caso específico, o das cidades.
Todavia, analisando a (des) organização das cidades a partir da segunda metade do século XX, se reconhece que a imagem de cidade ordenada, controlada, domesticável e planejável, apenas aguardando para ser cientificamente analisada e revelar suas leis de convivência, se moveu gradualmente para uma imagem de um ambiente perverso, indomável, controlado por tensões sociais.
Percebe-se que o processo urbano, direcionado pelo Estado, no molde Keynesiano, a partir da segunda metade do século passado, onde existia a crença no controle racional e centralizado dos destinos das políticas públicas urbanas.
Assim, pensar o espaço urbano exclusivamente como resultado de um plano, pode ser um equívoco. O plano abre um leque de opções e possibilidades de reconstrução ou adequação desse espaço territorial até os limites das possibilidades da gestão possível. Mas, nem tudo pode ser determinado por um belo plano tecnicamente perfeito, pois se está tratando com pessoas e suas esperanças de um nível de satisfação cada vez maior, ou seja, a produção técnica de um plano é um mosaico de interesses, altamente territorializados e cuja expressão física, que se faz através das obras arquitetônicas, infraestruturas, concebidas e desenhadas para formar estruturas que formatem a vida humana, mas, é perfeitamente possível elaborar-se um plano sempre participativo que estimule a co-responsabilidade de todos os atores e seus interesses no mesmo espaço físico.
- Municipalização e desenvolvimento local – fatos históricos e legais:
Diante do quadro acima, uma série de movimentos e de organizações tem defendido a tese de que o espaço local é o ambiente mais propício para a construção de políticas alternativas, novas opções de desenvolvimento e de participação da sociedade. Muitas experiências de administrações municipais têm trazido fortes luzes para a construção de um novo modelo de desenvolvimento brasileiro, na cultura das administrações e dos próprios movimentos sociais e no processo de municipalização adotado no Brasil, veja como exemplo a cidade de Curitiba no Estado do Paraná, sob a tutela de Jaime Lerner.
Embora no Brasil, os processos de municipalização tenham adquirido força e começado, de fato, a serem implementados a partir da Constituição Federal de 1988, começaram a crescer em todo o mundo, desde os anos 70, a construção de propostas de descentralização do Estado, principalmente a partir de reformas adotadas pelos governos sociais-democratas da França, Itália e Espanha. Na América Latina, o debate sobre a municipalização como forma de descentralização do poder central do Estado esteve muito ligado ao debate da democratização, uma vez que, nesse período, caminhava-se para o fim das ditaduras militares (Melo, 1996).
Os princípios básicos que, ainda hoje orientam as administrações municipais, são fortemente influenciados por uma lógica clientelista e altamente subordinada aos interesses das oligarquias locais. O papel dos governos municipais era extremamente limitado, restringindo-se suas responsabilidades a pequenas obras de infra-estrutura como conservação de ruas, estradas vicinais, praças etc., ou a políticas assistencialistas. Pouco ou quase nada era discutido sobre o papel dos governos municipais na implantação de políticas de desenvolvimento econômicos e sociais, que se restringiam a incentivos fiscais à instalação de indústrias.
A falta de instrumentos de participação da sociedade civil na definição das políticas públicas é outra característica da grande maioria dos municípios brasileiros. Mesmo do ponto de vista das organizações sociais, a falta de experiência de participação e de discussão sobre políticas municipais ainda é um dos grandes limites à instituição de um processo realmente participativo de construção do desenvolvimento local.
Porém, fortes mudanças se anunciam nas políticas de desenvolvimento municipal e no papel a ser desempenhado pelos governos municipais. Grande parte dessas mudanças é o resultado de um longo processo de descentralização acompanhado pela incorporação de importantes políticas por parte dos governos locais, que se viabilizam graças a uma definição na distribuição dos recursos públicos.
O processo de descentralização no Brasil se deu principalmente por meio de uma reforma na política fiscal, com a instituição do Fundo de Participação dos Municípios – FPM e pela transferência aos municípios de políticas que tradicionalmente eram coordenadas e/ou executadas pelo governo estadual e federal. Além desse repasse e de arrecadação própria, os municípios recebem parcelas de recursos financeiros do ICMS, do ITR, dos Fundos de Saúde, da Assistência Social e Educação e, mais recentemente do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar – PRONAF (alguns municípios selecionados), entre outros, como royalties, etc.
De 1980 para 1994, as Prefeituras e governos estaduais ampliaram suas participações nas receitas disponíveis do Estado, ao tempo em que houve uma redução nas receitas proporcionais da União. Os municípios foram os principais beneficiários com as reformas fiscais realizadas nos últimos anos, passando sua participação na receita de 9% para 15% mesmo considerando que a criação do Fundo de Estabilização Fiscal, no início do Plano Real, implicou com um corte de 20% no Fundo de Participação dos Municípios FPM.
Tabela 1 – Distribuição (%) das receitas entre as três esferas de governo Brasil. 1980-1990.
Esferas de governo | 1980 | 1988 | 1990 |
Receita própria | 100 | 100 | 100 |
União | 75 | 71 | 66 |
Estados | 22 | 26 | 29 |
Municípios | 3 | 3 | 5 |
Receita disponível | 100 | 100 | 100 |
União | 69 | 62 | 58 |
Estados | 22 | 27 | 27 |
Municípios | 9 | 11 | 15 |
Fonte: Afonso & Serra, citado por Melo (1998).
Tal situação deu a muitos governos municipais a oportunidade de se assumirem efetivamente como importantes agentes de promoção e articulação do desenvolvimento municipal e microrregional. A participação de prefeituras na elaboração de projetos de desenvolvimento econômico, a implementação de políticas sociais voltadas para uma nova concepção de desenvolvimento, a organização de associações de municípios para a construção de planos de desenvolvimento microrregionais, a criação de Conselhos Municipais, provocaram modificações nas legislações municipais para a criação de fundos de crédito, de sistemas de inspeção, adoção de políticas de abastecimento, de fomento, e uma série de outras políticas de incentivo a promoção do desenvolvimento, são sem dúvida, frutos positivos que mostram uma nova postura dos governos e dos diversos atores locais aos desafios colocados pela globalização.
Essa mudança no papel tradicional dos governos municipais recebeu uma contribuição fundamental com a emergência de novos governos municipais de esquerda, baseados na organização popular. As experiências de políticas voltadas para a distribuição de renda, para o desenvolvimento econômico das populações mais carentes, baseadas no que se convencionou chamar de inversão de prioridades e de participação popular na elaboração de orçamentos, têm influenciado decisivamente os processos de municipalização e as políticas municipais em todo o País.
Além disso, mesmo que muito frágeis as experiências de participação popular e a organização de conselhos municipais são elementos concretos de mudanças, mas, sobretudo, são processos didáticos, nos quais a sociedade civil começa a aprender a construção de um embrião de poder popular municipal. Argumenta-se que o fato de existir maior proximidade entre a sociedade e o Estado, nos municípios, e maior facilidade de compreensão das pautas municipais por parte da população é um elemento facilitador de uma maior democratização do Estado nos municípios. Muitas críticas, porém, têm sido feitas a esse processo de descentralização do Estado, principalmente em relação à forma como foi conduzido no Brasil.
Segundo Nunes (1996), a atual onda de descentralização decorre de uma crise das instituições públicas centrais, gerada por esse processo de liberalização desencadeado pela hegemonização do Estado e da sociedade sobre o mercado, estando muito articulada, nesse sentido, com as propostas de reforma do Estado, diminuição de gastos sociais e Estado mínimo2
As posições que predominam na política de descentralização ou municipalização foram baseadas numa lógica de descentralização apenas administrativa, permanecendo centralizados o poder político e as decisões sobre as questões de fato fundamentais para o desenvolvimento do País, sem nenhum instrumento de participação popular. Além do que, em muitos casos, os conselhos municipais e os planos diretores são criados apenas formalmente como uma obrigação imposta pela Constituição Federal ou para o repasse dos recursos dos fundos, como uma obrigação legal para ter acesso a eles. Veja exemplo, apresentado na Tabela 2 abaixo, mostrando estudo realizado:
Tabela 2 – Motivos para elaboração dos Planos Diretores Municipais:
Motivos | Quantidade | % |
Obrigação legal | 48 | 56,5 |
Facilitar a obtenção de financiamento | 2 | 2,4 |
O projeto foi financiado por terceiros | 1 | 1,2 |
Pressão de organismos estaduais | 3 | 3,6 |
Insistência ou facilidades pessoais | 2 | 2,4 |
Racionalizar a administração municipal | 20 | 23,5 |
Ordenar o crescimento urbano | 7 | 8,2 |
Melhoria na qualidade de vida | 1 | 1,2 |
Melhorar o planejamento da cidade | 1 | 1,2 |
Fonte: Extraído do artigo: “Plano Diretor Municipal: três questões para discussão. Roberto Braga, Professor Doutor do Departamento de Planejamento Territorial e Geoprocessamento da UNESP – SP – Campus de Rio Claro, SP.
O argumento da proximidade da população com o poder local é considerado no mínimo uma situação ambígua, uma vez que o município é também o lugar da reprodução do poder discricionário das aligarquias. A fragilidade política das organizações populares ao nos municípios; a ausência de instituições relativamente autônomas municipais, como a imprensa, que atua como agente fiscalizador da ação do Estado são elementos que garantem a continuidade do poder tradicional.
- O processo de gestão municipal no Brasil – uma avaliação crítica:
O debate e as decisões de políticas de desenvolvimento têm ficado muitas vezes, restrito ao âmbito municipal ou microrregional, fortalecendo assim uma visão isolacionista. Se
O desenvolvimento local é fundamental para a mudança na qualidade de vida das populações locais, os fatores externos relacionados às políticas do Estado, do País, e cada vez mais, do planeta como um a real democratização, dependem principalmente das decisões globais. Na maioria das vezes desconsidera-se que a grande mudança das causas dos problemas sociais da população brasileira escapa da governabilidade das Prefeituras.
A forma como foram instituídos e conduzidos os processos de descentralização, com a ausência de um órgão condutor e coordenador das políticas públicas municipalizadas, torna as políticas públicas, a partir dos municípios, fragmentadas e pontuais. O sucateamento dos órgãos de planejamento nacionais e estaduais e a inexistência de planos mais amplos de desenvolvimento, mesmo nos níveis setoriais, acabam por permitir que grandes empresas privadas, quebrem os territórios geopoliticamente estabelecidos, tratando apenas dos seus interesses de lucro, sem considerar o desenvolvimento dos municípios que lhes deram guarida e muitas vezes, essas medidas, ter caráter meramente restritivo aos seus interesses e são paliativas guando se requer que o planejamento municipal ou regional seja considerado como norte dessas ações.
Além disso, a pouca vontade política dos governantes; a falta de continuidade dessas políticas e a frágil capacidade de gestão das administrações municipais, com limitados quadros técnicos, com escassos instrumentos de planejamento e de monitoramento das políticas, com grande inexperiência dos órgãos públicos em pesar e gerir políticas mais amplas de desenvolvimento faz com que as prefeituras, juntamente com os órgãos públicos se tornem incompetentes para desempenhar esse papel. A baixa eficiência e eficácia das políticas desempenhadas por órgãos públicos municipais é problema presente na grande maioria dos municípios brasileiros.
Há ainda claros elementos de má gestão que contribuem em muito para o endividamento e a precária situação financeira das Prefeituras como a falta de transparência nas administrações municipais, compras de maquinário e estruturas muitas vezes de duvidosa importância, compras sem licitação, gastos sem critérios claros, inchaço de funcionários na máquina política pública decorrente de compromissos escusos realizados nos processos eleitorais, dentre outros.
Para driblar a crise financeira, muitas Prefeituras vêm reduzindo seu quadro funcional paralisando obras de infra-estrutura, e mantendo de forma precária os serviços de emergência nas áreas de saúde, educação, assistência, etc. Essas reduções nos serviços públicos municipais vêm causando enormes prejuízos ao atendimento às comunidades. Avalia-se que a mudança na política fiscal e de distribuição dos recursos públicos, mesmo que ampliando a capacidade financeira dos municípios, acabou gerando uma distribuição desigual das riquezas, e proporcionalmente insuficiente para atender ao enorme aporte de despesas geradas com as novas responsabilidades colocadas para os governos municipais.
Alega-se que a Constituição Federal de 1988 não determinou claramente as atribuições, e os municípios foram de certa forma forçados a assumir serviços que antes eram de competência da esfera federal e estadual como saúde, educação, segurança pública, habitação e saneamento que, por serem áreas bastante intensivas de mão-de-obra, ampliaram em muito os gastos, já então elevados, com o funcionalismo municipal.
Da mesma forma que o repasse de recursos do ICMS para municípios, o FPM apresentam uma baixa eficiência redistributiva, privilegiando os municípios economicamente mais bem sucedidos. Como o Fundo é distribuído com base no critério do número de habitantes, os municípios que apresentam uma condição econômica mais dinâmica que gere ocupações e absorva um maior número de trabalhadores recebem mais recursos. Assim, os municípios que passam por situação de crise econômica, apresentando muitas vezes um crescimento populacional negativo, estão condenados ao ciclo da pobreza. O FPM acaba assim por acentuar as diferenças regionais.
Atualmente a forte escassez de recursos públicos provocada pela política de governo federal, que pretende reduzir os custos do Estado, mas por outro lado redireciona recursos para os grandes grupos econômicos, via Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social- BNDES, nacionais e internacionais, e pela grande influência da política de arrecadação, principalmente dos tributos federais e estaduais, além de municipais, tem provocado como diz Salgado (1996), uma busca competitiva em vez de mecanismos de cooperação, horizontal e vertical. A chamada guerra fiscal, prática recente, em especial entre os governos estaduais, privilegia também os municípios e estados mais eficientes e aquinhoados em termos de condição econômica, recursos naturais, infra-estrutura, mercado, etc., reforçando ainda mais as diferenças regionais.
- Mas tem jeito!?. As novas ferramentas:
Ante o exposto, pode-se imaginar que as dificuldades são de grande monta que por muitas vezes trazem consigo uma falsa idéia de que as ações de planejamento urbano e rural, por que rural? Por que ambas as questões estão caminhando juntas, no plano legal e de fato, quando se pensa em desenvolvimento global territorial, são impossíveis de serem arquitetadas, especialmente ações democráticas de participação popular nas decisões tomadas pelas diversas câmaras municipais. Mas, sendo otimista, pode-se dizer que já estivemos muito pior, em termos de planejamento. Cursos universitários, especialmente de pós-graduação (a UFPA/PLADES é um exemplo), vêm sendo ofertados em todo o País, e uma nova geração de técnicos estão sendo capacitados e formando organizações não governamentais e governamentais, e, essas vêm se mobilizando para atrair a comunidade organizada a interagir com as autoridades legislativas municipais, no sentido de defender seus interesses mais coletivos e menos individuais. Outra ação importante, para o tratamento realista dessa questão, é a utilização das técnicas de planejamento estratégico, que surge no bojo, de várias tentativas de planejamento substituindo as antigas técnicas utilizadas ou mais tradicionais e que não deram bons resultados.
O Plano Estratégico, não é uma panacéia, mas é mais uma opção recente de gerenciamento dos fatores produtivos locais, sem esquecer, no entanto, das pessoas. Mas esses novos instrumentos, não existem quando não existe pessoal qualificado ou vontade política de aplicá-los. Segundo Peter Pfeiffer “Os dois principais instrumentos de planejamento urbano no Brasil são a Lei Orgânica e o Plano Diretor”. Nesse cenário legal, municípios com mais de 20.000 habitantes são obrigados a elaborar um Plano Diretor, mas a Constituição Federal oferece só uma orientação geral, dizendo que o seu objetivo é “ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes. (Brasil, 1988, CF. título VII, capítulo III, artigo 182). A Constituição também orienta que a elaboração do Plano Diretor deve ser participativa, além de considerar os interesses das organizações civis locais. No entanto, os pormenores sobre o procedimento são definidos na Lei Orgânica e podem variar de município para município, desde que não firam a legislação federal e dos Estados”. Todavia para Aureliano (1996:31), nos ensina que: “para ser eficiente na sua implementação, a descentralização exige o desenvolvimento de uma capacidade gerencial, o que não ocorre de um dia para o outro.”. Na prática, o Plano Diretor tem uma aplicação muito limitada. Primeiro, porque a sua elaboração geralmente leva vários anos, e, quando finalmente recebe a aprovação política, as informações neles contidas já estão ultrapassadas. Segundo, porque seu caráter e extremamente normativo, mas carece de orientações concretas para a tomada de decisões sobre o que fazer e como fazer? Com isso, o Plano Diretor permanece como um instrumento primordialmente político, enquanto o desenvolvimento das cidades ocorre independente dele. Para lidar com essas situações, necessita-se de conceitos e instrumentos capazes de levar em consideração, adequadamente, as transformações e desenvolvimentos que estão ocorrendo, pois, sem uma orientação clara de desenvolvimento que se baseie no potencial do município, e sem a flexibilidade de reagir as influências externas, o desenvolvimento do município pode ser prejudicado sensivelmente. Um dos instrumentos para lidar com processos dinâmicos e transformações é o planejamento estratégico. Esse método foi criado no setor privado, mas a sua passagem para o setor público, não é assim tão fácil, pois incorpora os projetos extraplanos definidos por instrumentos legais antes utilizados. É definido como um instrumento de gerenciamento, com o propósito de tornar o trabalho de uma organização mais eficiente, isso significa o que se está fazendo, pode ser feito de outra forma? Diferente? Melhor? Isso porque, há o tempo todo mudanças nos ambientes internos e externos e as organizações, dentre elas as prefeituras municipais, e devem se adequar rapidamente a essas transformações. Essa é uma forma de flexibilidade necessária, porque essas mudanças ocorrem independentemente da vontade da organização ou do gestor e é uma forma de reação e ação diante dos problemas.
Tabela 3 – Diferenças significativas entre o setor público e privado:
Instrumento | Empresa privada (Plano Estratégico) | Setor público (Planos Diretores) |
Missão | Limitada (a determinados produtos e serviços) | Ampla e não específica (muitas das vezes implicitamente submetida e não explicitamente definida) e obrigatória na base de um mandato. |
Visão | Baseada na missão e na análise do ambiente. | Determinada politicamente, ampla e não específica incoerente com os recursos disponíveis. |
Organização | Funcional, linhas claras de decisão, relativamente simples. | Parcialmente funcional, superposição de funções políticas, complexidade. |
Clientela | Limitada ao campo de atuação da empresa, relação definida através de compra ou contrato. | Ampla e diversificada, relações mal definidas, cliente não visto como tal. |
Propósito de atuação | Realizar lucro, cumprir a missão. | Servir ao público, servir à política informalmente. |
Forma de atuação | Tem que ser eficiente dinâmica. | Não precisa ser eficiente e geralmente é lenta e burocrática. |
Fonte: Planejamento estratégico no Brasil. Pfeiffer, P. ENAP, 37, 2000, Brasília-DF.
Outro instrumento utilizado para planejamento local, microrregional e até regional é o Zoneamento Ecológico-Econômico. Trata-se de uma ferramenta que visa ampliar o acesso a informação e melhorar a capacidade dos atores locais a serem envolvidos num processo de gestão do meio ambiente e do território. Essa ferramenta foi legalizada em 1990 pelo Governo Federal, quando instituiu, através do Decreto nº 99.540, a Comissão Coordenadora do Zoneamento Ecológico-Econômico (CCZEE), ligada à Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (SAEE/PR).
Em 1995, tal proposta foi traduzida na Política Nacional Integrada para Amazônia Legal, elaborada na tentativa de dar uma resposta às pressões internacionais e nacionais quanto ao destino da Amazônia (Malato, 1997).
Observa-se que essa ferramenta, é parte necessária à aplicação do apesar de existir diversas instituições públicas e privadas que dispõem de tecnologias para elaboração desses diagnósticos, como a SECTAM-PA, Embrapa, SIPAM, SIVAM, INPE, dentre outras.
- Concluindo:
Esses elementos exemplificam uma lógica de desenvolvimento na qual a gestão pública está subordinada às dinâmicas do mercado. O grande desafio colocado para administrações comprometidas com a melhoria das condições de vida da população e com a democratização do Estado juntamente com os movimentos sociais, é a de garantir a construção de políticas de desenvolvimento que consigam gerar mecanismos de articulação com o projeto local e global, e, que, sobretudo, garantam processos participativos como democracia, transparência e controle social, equidade, redistribuição, eficácia, eficiência e efetividade dos negócios públicos.
- Bibliografia consultada e referenciada:
MALATO, O.R. In Zoneamento Ecológico-Econômico e Gestão Ambiental: propostas alternativas ou novas retóricas, UFPA-NAEA-PLADES – Dissertação de Mestrado, 1997;
CENSO AGROPECUÀRIO, Rio de Janeiro: IBGE, 1995.
CENSO DEMOGRÁFICO, Rio de Janeiro: IBGE, 1991.
DESER. Departamento Sindical de Estudos Sociais. Cadernos de Subsídios para eleições municipais. Curitiba. 1996.
NUNES, e. Poder Local, descentralização e Democratização: um encontro difícil. Revista São Paulo em Perspectiva, São Paulo, 1996.
SALGADO, S.R. da C. Experiências municipais e desenvolvimento local. Revista São Paulo em Perspectiva, São Paulo, 1996.
BRAGA, R. – Plano Diretor Municipal: três questões para discussão. Departamento de Planejamento Territorial e Geoprocessamento da UNESP – SP – Campus de Rio Claro, SP.
PFEIFFER, P. Planejamento estratégico no Brasil. ENAP, 37, 2000, Brasília-DF.
1
Analista A da Embrapa Amazônia Oriental, MSc em Planejamento do Desenvolvimento Local, joaodeus@cpatu.embrapa.br, Travessa Enéas Pinheiro, S/Nº, Marco, Belém, PA, CEP: 66095-100.
2
Estado mínimo, teoria estruturalista funcionalista que prevê uma redução paulatina da participação do Estado nas decisões de caráter político institucional, no planejamento das ações municipais.
EcoDebate, 03/07/2013
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