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Seminário debate a captura e estoque de gás carbônico em reservatórios geológicos

 

Seminário debate a captura e estoque de gás carbônico em reservatórios geológicos

 

Capturar e estocar gás carbônico no interior da Terra pode ser uma saída para reduzir as emissões do principal causador do aquecimento global, dizem especialistas em encontro sobre clima e energia

No início de maio, a Terra atingiu a concentração histórica de cerca de 400 partes por milhão (ppm) de gás carbônico (CO2) na atmosfera. Essa é uma marca limite nas metas globais estabelecidas para o clima. Segundo os cientistas, ao ultrapassar a concentração de 350 ppm de CO2, não seria possível atingir a estabilização da temperatura em 2º Celsius acima dos níveis pré-industriais ainda neste século. Portanto, além da promoção da eficiência energética e do uso de fontes alternativas de energia, algumas soluções tecnológicas seriam necessárias para evitar os piores cenários de aquecimento num futuro muito próximo. Nesse quadro, a captura e o armazenamento de carbono (Capture and Carbon Storage – CCS, na sigla em inglês) são uma das opções tecnológicas que vêm ganhando destaque entre os especialistas em energia e clima.

A coisa parece estranha, mas se trata de uma tecnologia de amplo domínio de muitos países, inclusive o Brasil. O bombeamento do carbono para reservatórios geológicos teve início na exploração de petróleo. Serve para pressurizar o poço e estimular a saída do óleo especialmente quando o recurso está chegando ao fim. O que a comunidade científica discute agora são as possibilidades de capturar o CO2 das chaminés industriais e as maneiras de armazená-lo em poços exauridos de petróleo e gás e em bacias salinas no fundo do mar.

Esse foi o tema discutido no seminário internacional “Bio-energy and CCS (BECCS): Options for Brazil”, promovido nos dias 13 e 14 pelo Núcleo de Pesquisa em Políticas e Regulação de Emissões de Carbono (Nupprec) do Instituto de Energia e Ambiente (IEE) da USP. BECCS é a sigla em inglês para captura e armazenamento de carbono de biomassa. Dentro desse ciclo de debates promovido pelo Nupprec, o professor da Vienna University of Technology e diretor do Global Energy Assessment (GEA), Nebojsa Nakicenovic, apresentou, no dia 12, os principais resultados do relatório do GEA. Com mais de 1.500 páginas, o relatório discute cenários para o clima a partir de um levantamento mundial empreendido por mais de 2.000 cientistas do mundo todo.

Os debates contaram com a presença de alguns dos maiores especialistas em energia e clima, entre eles o ex-reitor da USP, José Goldemberg, José Roberto Moreira (IEE) e Joaquim Seabra (Unicamp), além de Florian Kraxner, do International Institute for Applied Systems Analysis (IIASA, Áustria), Jessica Morton, do Global CCS Institute (Austrália), e Robert H. Williams, da Princeton University (Estados Unidos).

Estimativas – Estimativas do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas e da Agência Internacional de Energia apontam que até 2050 a captura e armazenamento de carbono poderão contribuir com uma redução de 20% nas emissões mundiais de gases de efeito estufa (GEE).

“Capturar e armazenar o carbono associado à biomassa pode ser uma política particularmente interessante para o Brasil, em usinas e refinarias de biocombustíveis, especialmente devido aos baixos custos para capturar o CO2 a partir do processo de fermentação do açúcar”, afirma o professor da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP Sérgio Pacca, coordenador do Nupprec.

Segundo Pacca, as discussões do grupo resultarão numa força-tarefa para promover a ideia do BECCS no Brasil. “Também se falou numa cooperação Sul-Sul entre Brasil e Indonésia como países com potenciais e recursos consideráveis para se engajar nesse tipo de tecnologia. O grupo produzirá um relatório final que estará acessível on-line possivelmente na página do IIASA.”

Nos processos industriais tradicionais, em que predomina a queima de combustíveis fósseis, o CO2 geralmente sai com outros efluentes, e separar esse gás pode demandar tecnologias delicadas e caras. Por outro lado, a fermentação do açúcar na produção de etanol libera um CO2 limpo, porque feito por organismos vivos altamente seletivos. É tão limpo que parte desse CO2 é utilizada para a gaseificação de águas e refrigerantes, sem necessidade de qualquer tratamento.

“Para cada quilo de etanol produzido, praticamente um quilo de CO2 vai para a atmosfera. Se esse gás fosse capturado e armazenado, teríamos setorialmente emissões negativas significativas desse poluente. E, o mais importante, a um custo relativamente baixo”, afirma o professor José Roberto Moreira, do IEE.

Levantamento do Global CCS Institute contabiliza até o momento nove projetos de CCS em operação, a maioria deles ligada a indústrias de processamento de gás natural. Entre os oito projetos de CCS e BECCS em construção, dois estão ligados ao setor de geração de eletricidade, dois a usinas de processamento de gás natural e o restante, a usina de hidrogênio, fábrica de fertilizantes, usina de etanol e refinaria de petróleo.

“Os poços onde havia petróleo e as cavernas onde o gás estava depositado poderiam ser utilizados para armazenar o CO2. Há preocupações de que o gás escape. Os ambientalistas exigem que só escape 1% em 100 anos do gás estocado. Mas escapar é uma possibilidade pequena, pois são cavernas bem isoladas no interior da Terra”, afirma Goldemberg.
Da mesma forma, o gás pode ser estocado em aquíferos, isto é, em depósitos de água em grandes profundidades. Na Alemanha, o depósito de CO2 em aquíferos tem gerado preocupações, porque o gás poderia perturbar o sabor da água usada para fazer cerveja, afirma Goldemberg.

O ex-reitor da USP considera o CCS e BECCS “ideias razoáveis”. “Acho particularmente interessante introduzir unidades piloto de BECCS no Brasil, onde ainda não existe nenhuma”, afirma.

“Os riscos para o CCS são similares aos encontrados na indústria da exploração de petróleo, ou seja, tendem a crescer quando não há os cuidados necessários no planejamento e execução de um projeto. As principais opções para armazenar o CO2 de forma segura e em quantidade suficiente são formações geológicas de rochas sedimentares, que possuem porosidade suficiente para conter líquidos nesses espaços porosos”, afirma o professor Rodrigo Sebastian Iglesias, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.

Para Henrik Karsson, da Biorecro, uma rede de projetos de captura de carbono, “o maior risco do CCS é que não seja implantado a tempo, uma vez que precisamos agir agora para cumprir as metas de mitigação das mudanças climáticas”.

O grupo discutiu que os custos das tecnologias para estocar carbono devem ser distribuídos entre toda a sociedade. “Isso é o que o futuro nos aguarda. Salvar o mundo, afinal, custa algum dinheiro. O que pode fazer os agentes sociais investir nesse tipo de tecnologia são justamente as regras proibindo emissões. Nos Estados Unidos, por exemplo, existem cotas de emissão e quem não cumpre é multado. Esse poderia ser um incentivo para se investir nessas tecnologias”, afirma Goldemberg.

“Retirar o CO2 da atmosfera e armazenar é a única forma de andar para trás no processo de poluição da atmosfera. Com um acréscimo de um ou dois centavos no preço final do combustível, seria possível capturar e armazenar o carbono produzido no processo de fermentação de etanol”, afirma o professor Moreira.

Matéria de Sylvia Miguel, no Jornal da USP, publicada pelo EcoDebate, 03/07/2013


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