Mulheres e líderes, artigo de Montserrat Martins
[EcoDebate] “Ganhei uma mangueira da minha filha e fiquei entusiasmada, temos de estar sempre cultivando coisas boas na vida, como as plantas“, disse recentemente Dercy Furtado em uma entrevista de rádio. Frase singela mas repleta de sentidos, de quem nunca esqueceu o valor das coisas simples para a felicidade, mesmo tendo ocupado posições de destaque. Dercy hoje é conhecida como mãe do Jorge (Furtado, o cineasta), mas marcou época como deputada estadual, décadas atrás, ao tempo em que política era assunto para homens. Sem esquecer sua origem humilde, foi uma das primeiras defensoras da regulamentação da profissão de doméstica, trabalho que até então era marginalizado no país, sem quaisquer direitos.
Apenas algumas poucas pioneiras, décadas atrás, precederam a lei que hoje obriga os partidos a terem um percentual mínimo de candidatas mulheres. Para os que costumam dizer que o mundo não muda, a liderança feminina é um dos fatores mais visíveis de evolução social, considerando que um século atrás nem votar as mulheres podiam. Cabe a pergunta agora se há diferença, afinal, entre o modo masculino e o feminino de participação política. Será uma nova forma de preconceito tentar identificar diferenças de gênero no exercício do poder?
No debate infindável sobre as diferenças entre os universos feminino e masculino, há dois campos ideológicos: biologia ou cultura. Nascemos diferentes por fatores corporais, tais como os hormônios que produzimos, ou foram os fatores históricos que criaram as especificidades milenares que conhecemos hoje? Dizer que as mulheres são mais “sensíveis e intuitivas” e os homens mais “agressivos e racionais” são constatações ou rótulos, chavões culturais?
No “yin e yang” chinês e em quase todas as culturas contemporâneas, uma evolução filosófica que vem ocorrendo neste terceiro milênio é o conceito de “complementariedade”, que reconhece a presença de elementos opostos em cada um de nós, mesmo que em doses diferentes e com diferentes graus de permissão (própria ou social) para que exerçamos tais características na prática. Homens se permitindo ser mais sensíveis e mulheres mais agressivas socialmente (você sabe, não se confunde o conceito de agressividade com o de violência) são necessidades evolutivas, portanto.
Neste início de 2013, uma notícia auspiciosa sobre esse tema é que na pesquisa presidencial para 2014 as intenções de voto no país são lideradas por duas mulheres, Dilma e Marina, fato inédito. Mais consagrador da liderança feminina que o próprio fato de termos a primeira mulher presidente é que sua alternativa atual, a segunda colocada nas pesquisas, também é uma mulher. Em janeiro outra liderança histórica da política nacional, Heloísa Helena, causou frisson ao defender publicamente a criação de uma nova legenda, onde ela se associará a Marina e outras lideranças por um projeto socioambiental para o país. As mulheres, decididamente, vão “causar” em 2013.
Montserrat Martins, Colunista do Portal EcoDebate, é Psiquiatra.
EcoDebate, 21/01/2013
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