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O fracasso do Protocolo de Kyoto

 

O fracasso do Protocolo de Kyoto

emissões de CO2

 

Protocolo de Kyoto.  Série de artigos publicados na revista Nature aponta que o protocolo internacional criado para combater o aquecimento global falhou.

Além de não ter sido possível implementar um mercado de carbono eficiente, as emissões de gases do efeito estufa aumentaram nos últimos anos. Análise no Correio Braziliense, socializada pelo Jornal da Ciência / SBPC, JC e-mail 4633.

“O aquecedor está ligado.” A frase estampada na capa da edição de hoje da revista Nature anuncia, com base em uma série de artigos, o fracasso do Protocolo de Kyoto em conseguir reduzir as emissões globais de gases causadores do efeito estufa, apesar de todo o esforço empregado em sucessivas reuniões de cúpula dedicadas ao tema. O alerta de uma das mais respeitadas publicações científicas do mundo é feito no momento em que, mais uma vez, líderes políticos tentam chegar a um acordo para prorrogar a validade do protocolo, previsto para expirar no próximo mês, durante a 18ª Conferência das Partes sobre Mudanças Climáticas (COP18), em Doha, no Catar.

Segundo Dieter Helm, professor de Políticas Energéticas da Universidade de Oxford, no Reino Unido, embora o principal alvo de Kyoto tenha sido reduzir os níveis de CO2 e demais gases que agravam o aquecimento global, as emissões permanecem em uma curva ascendente. “Elas passaram de quase 2 partes por milhão (ppm) por ano, no início de 1990, para quase 3ppm atualmente”, informa o especialista, para quem a situação deve piorar ainda mais.

“O grande problema de Kyoto é que ele leva em consideração apenas a produção de carbono, e não a emissão”, afirma o britânico. A distorção nos cálculos favorece o lançamento de uma quantidade maior de carbono na atmosfera. “O aquecimento global não leva em conta as fronteiras nacionais. Se um consumidor dos Estados Unidos compra um carro, pouco importa se o aço dentro dele é feito lá ou na China”, prossegue. “A diferença entre a produção de carbono e o consumo de carbono não é trivial. Veja o Reino Unido: de 1990 a 2005, a sua produção de carbono caiu cerca de 15%, mas o consumo subiu aproximadamente 19%, quando se leva em conta o carbono embutido nas importações.” O que ocorreu, portanto, segundo o especialista, foi uma transferência das emissões, desvirtuando a intenção do protocolo.

Se o atual acordo é falho, a elaboração de um substituto é ainda mais problemática. “Na COP de Durban, em dezembro de 2011, o máximo que se conseguiu foi que os países participantes concordassem que até 2015 haverá um acordo sobre o que eles podem fazer depois de 2020”, lamenta o britânico.

Mercado – Outro aspecto do protocolo que falhou em seus objetivos e deve criar um panorama tenebroso para o mundo nos próximos anos é o mercado global de carbono. Segundo o que foi projetado em 1997, os países poderiam colocar um preço nas emissões – ou em seus cortes – e negociá-las entre si. Até o início dos anos 2000, o mercado estava prestes a se tornar uma realidade, mas uma sequência de acontecimentos minou o projeto.

O primeiro deles foi a eleição de George W. Bush, um forte crítico do protocolo, que presidiu os EUA entre 2001 e 2009. Contudo, outros fatores, além da resistência da maior economia e maior poluidor do mundo, outros pontos contribuíram para o fracasso. “A crise de crédito colocou instrumentos de negociação complexos em descrédito. A European Union Emissions Trading Scheme (EU ETS) se viu envolta em escândalos, como o roubo de licenças de emissão e fraudes fiscais”, enumera Michael Grubb, pesquisador da Universidade de Cambridge, também no Reino Unido. Assim, questões financeiras e políticas formaram um gargalo para o crescimento do mercado mesmo na Europa, região que tem se mostrado mais flexível à adoção de mecanismos de redução das emissões.

Em um dos artigos que compõem o especial da Nature, Grubb explica que, embora a questão tenha ganhado novo fôlego nos EUA, no período pós-Bush, a crise econômica atuou como freio na região. “Criou-se o consenso de que os Estados Unidos não teriam estômago para precificação do carbono – o público nunca aceitaria uma tributação”, conta. Sem um mercado grande, o comércio de carbono viu seus preços despencarem. Atualmente, o certificado para emissão de 1t de carbono custa tão pouco que é mais barato pagar por ele do que investir em tecnologias verdes.

Apesar do pessimismo generalizado, Grubb elenca três passos necessários para colocar as medidas de combate às mudanças climáticas de volta nos trilhos. O primeiro seria a inclusão dos Estados Unidos nos esforços globais para a redução das mudanças climáticas. Outro ponto seria o fortalecimento do comércio global de carbono. Por fim, o britânico defende que as nações mais pobres passem a investir em economia verde. “Os países em desenvolvimento devem parar de apontar a responsabilidade das mudanças climáticas para os países ricos e focar seu desenvolvimento em tecnologias limpas”, completa.

Polêmica – A adoção de metas por países em desenvolvimento é uma das questões mais polêmicas das negociações ambientais. Os países desenvolvidos afirmam que a fatura ambiental deve ser paga por todos, independentemente da condição econômica. Por outro lado, o grupo de países em desenvolvimento, liderados pelo Brasil, defende que a questão da pobreza seja levada em consideração. Segundo o grupo, os países ricos devem focar a solução do problema ambiental, enquanto os emergentes precisam se desenvolver e retirar sua população da miséria.

EcoDebate, 30/11/2012

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