IBGE: 42,3% dos índios vivem fora de terras reconhecidas e mais de 30 mil não índios vivem em aldeias
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelou que 57,7% dos 896 mil índios no país vivem em 505 terras indígenas reconhecidas pelo governo até 2010, o equivalente a 516,9 mil índios. Porém, 379 mil estão fora dessas terras, o que indica a necessidade de ampliação e criação de novas terras, mas também aponta para a migração em busca de educação e de renda, segundo especialistas.
Dos 42,3% índios que não estão nas terras originais, 78,7% habitam áreas urbanas. Dentre as regiões do país, a situação é mais comum no Sudeste, onde 84% dos 99,1 mil índios na região estão fora de suas terras, principalmente em São Paulo (93%) e no Rio de Janeiro (97%). Outros estados como Goiás (96%), Sergipe (94%) e Ceará (86%) também têm percentuais elevados.
No Rio, a busca por uma vida na cidade trouxe índios migrantes para o antigo Museu do Índio, na zona norte da capital. Lá, um grupo de cerca de 20 pessoas – de etnias como Guajajara (MA), Apurinã (AM) e Fulni-Ô (PE) – acabou se fixando. Enquanto as reivindicações por habitação e educação não são atendidas, sobrevivem do artesanato e de apresentações culturais.
No Sudeste, no entanto, também há casos de índios que deixam suas terras por falta de espaço. Se sentindo apertados devido ao pequeno território, os guaranis, do sul fluminense, se desmembraram em aldeias menores. Parte foi para um antigo sítio indígena em Niterói e os demais permanecem próximos às terras Guarani Araponga, Guarani de Bracuí e Parati Mirim, somando 2,8% dos índios no estado.
Para o professor de antropologia da Universidade de Campinas (Unicamp), José Maurício Arruti, a migração econômica é uma das explicações para a quantidade de índios fora das aldeias reconhecidas, mas não o único fator. “Tem a ver também com o estabelecimento de núcleos antigos de migração [nas cidades] e com problemas territoriais na origem, que expulsam, principalmente novas gerações”, afirmou.
Outra razão que pode explicar o aumento de índios fora da área original é um fenômeno chamado etnogênese, quando há “reconstrução das comunidades indígenas” que supostamente teriam desaparecido. Há indícios de que seja o caso da Região Nordeste, onde 54% dos índios vivem fora de suas terras, segundo o professor de antropologia da Unicamp.
“Observando o aumento de grupos indígenas no Ceará, por exemplo, nos últimos 20 anos, é de se imaginar que o aumento da autoatribuição tem a ver com a ampliação de grupo indígenas no estado, estejam eles em terras indígenas ou não”, avaliou Arruti, mas sem descartar que mais pesquisas e dados são necessários para apontar as razões para o número de índios fora das terras.
A presidenta da Fundação Nacional do Índio (Funai), Maria Azevedo, diz que situações diversas explicam o fato de mais de 40% dos índios estarem fora das terras originais. “Eles podem estar em áreas urbanas por vontade própria, ou porque são da quarta ou quinta geração vivendo fora das aldeias indígenas. Isso tudo a gente ainda não sabe, mas vai poder estudar.”
Em três unidades da federação, os índios encontrados vivem fora de aldeias – Distrito Federal (6 mil), Piauí (2,9 mil) e Rio Grande do Norte (2,5 mil). Nesses locais, não há território indígena reconhecido.
Mais de 30 mil não índios vivem em aldeias, mostram dados do IBGE
Dados do Censo 2010 divulgados hoje (10) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que mais de 30 mil pessoas declaradas não índias habitam 505 terras indígenas que foram reconhecidas pelo governo até 31 de dezembro de 2010. Ao todo, nessas áreas vivem 517 mil índios de 250 etnias.
Em números absolutos, a maioria dos não índios está concentrada na Região Nordeste. Somente em Pernambuco, 18,6 mil pessoas não índias ocupam as terras da etnia Fulni-Ô, de 23,8 mil indivíduos. Segundo a organização não governamental Instituto Socioambiental (ISA), que disponibiliza uma enciclopédia sobre os índios no país, a área de 12 quilômetros quadrados da aldeia da etnia Fulni-Ô circunda a cidade de Águas Belas, o que explica o elevado número de não índios no local.
Estudioso dos povos indígenas, o professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, João Pacheco, explica que essa etnia se originou de uma missão religiosa instalada no local para proteger índios de serem dizimados no século 18. Mais tarde, do aldeamento foi aproximando pecuaristas e agricultores e até não índios, que se casaram com índios.
“A Igreja deu origem ao povoado, a tudo. Isso quer dizer que eles são o pilar do município. A terra indígena lá é um bairro da cidade e, por isso, as pessoas entram e saem”, afirmou, ao destacar que os Fulni-Ô mantém tradições como a língua e um ritual anual no qual a população sai para a zona rural, no chamado Uricuri.
Em Mato Grosso, das 46,5 mil pessoas vivendo em terras indígenas, 2,1 mil também não se declararam indígenas e podem ser tanto agricultores como pessoas que trabalham nas aldeias, na avaliação da pesquisadora do IBGE, Nilza Pereira, responsável pela pesquisa.
No estado, o número mais alto foi verificado na Terra Indígena (TI) Maraiwatsede, onde 1,8 mil índios convivem com 407 não índios, em 165 quilômetros quadrados (km²), no leste de Mato Grosso, segundo o censo.
Também chama a atenção na pesquisa do IBGE a quantidade de pessoas que não se consideravam índios na TI São Domingos do Jacapari e Estação, de 135 km², no Amazonas. Lá, mais metade dos 2,12 mil habitantes não são índios. Os povos originais na área somam 623.
A presidenta da Fundação Nacional do Índio (Funai), Maria Azevedo, concorda que várias situações podem explicar a presença de não índios nas terras indígenas e reforça que cada situação deve ser analisada caso a caso. “Agora [de posse dos dados] vamos ver qual o problema em cada área”, declarou.
Para fazer o levantamento, o IBGE considerou dados cartográficos da Fundação Nacional do Índio (Funai), com 505 terras indígenas reconhecidas pelo governo, somando 106,7 milhões de hectares.
Reportagens de Isabela Vieira, da Agência Brasil, publicadas pelo EcoDebate, 13/08/2012
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