Contaminação ao longo da cadeia de produção compromete qualidade do leite
Conhecer os pontos críticos de contaminação é importante para controle da qualidade e segurança alimentar
Pesquisa realizada com cinco laticínios do interior do Estado de São Paulo demonstra que ao longo da cadeia de produção do leite pasteurizado ainda existem pontos críticos de contaminação por microrganismos patogênicos, apesar de uma série de normas e cuidados para higienização e qualidade. O estudo apresenta uma visão geral da qualidade do leite, levando em conta normas e programas de qualidade adotados no Brasil, em especial a Instrução Normativa (IN) nº 62, em vigor desde o fim de 2011 e que exige a redução gradual da contaminação do leite, para chegar a níveis internacionais em 2014.
O estudo Rastreabilidade de micro-organismos patogênicos ao longo da produção de leite pasteurizado: ferramenta potencial para a segurança alimentar, da pesquisadora Natali Knorr Valadão, foi apresentado na Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos (FZEA) da USP, em Pirassununga, em fevereiro de 2012. , A pesquisa teve orientação do professor Carlos Augusto Fernandes de Oliveira e auxílio da Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
O objetivo da pesquisa, coordenada pela professora Marta Mitsui Kushida e financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), foi verificar em diversos pontos da cadeia produtiva do leite a ocorrência de patógenos causadores de doenças, como a Escherichia coli, Listeria monocytogenes, Listeria sp. e Staphylococcus aureus, e outros microrganismos indicadores de contaminação, entre eles as bactérias mesófilas aeróbias.
“A ideia do trabalho foi fazer uma rastreabilidade microbiológica do leite. Se estava contaminado, nossa proposta foi identificar possíveis pontos em que esta contaminação poderia ter acontecido”, explica Natali. Segundo a pesquisadora, o leite proveniente de vacas sadias possui baixa contagem microbiológica e por isso é necessário analisar toda a cadeia produtiva, a partir da ordenha, para identificar possíveis fontes de contaminação.
A obtenção de dados para a pesquisa aconteceu entre novembro de 2010 e setembro de 2011. Cada laticínio foi visitado duas vezes e foram coletadas 236 amostras tanto de leite (36) quanto de superficíes com (38) e sem contato (162) com o produto, nos ambientes de ordenha e processamento. Dos cinco latícinios, 2 produziam leite do tipo A. Nos restantes, a produção era do tipo pasteurizado.
Contaminação durante a cadeia produtiva
Entre os resultados da pesquisa, um dos que mais chamam a atenção é o número de ocorrências de contaminação por E. coli: estavam contaminadas 61,1 % das amostras de leite, 50% das amostras que fazem contato com o leite, como teteiras e superfícies internas de equipamentos, e 25,9% das amostras sem contato com o produto, como pisos e mãos de manipuladores. Os dados são alarmantes, uma vez que bactérias desse grupo podem desencadear patologias graves, por exemplo diarreia hemorrágica e falha em órgãos vitais, como aconteceu durante o surto que atingiu a Europa, em 2011, a partir de brotos de feijão contaminados com cepas da bactéria resistentes a alguns antibióticos.
Foi alta também a contagem de microrganismos indicadores de contaminação. “Mais de 40% do leite cru destinado à produção de leite pasteurizado e 70% do leite cru designado à produção de leite tipo A estavam acima do permitido pelas legislações pertinentes, o que demostra uma grande dificuldade dos produtos em se adequar a legislação”, relata Natali.
Além disso, os resultados da pesquisa também demonstram uma diferença muito pequena entre os pontos de contaminação, entre os sistemas de produção de leite pasteurizado e de leite do tipo A, apesar deste possuir normas mais exigentes quanto à sua qualidade microbiológica. Os pontos críticos de contaminação são a pasteurização, as embalagens primárias e, em um dos laticínios, o tanque de armazenamento do leite pasteurizado, cuja tampa era facilmente removível e aberta com frequência. Esses resultados foram obtidos a partir da Árvore Decisória do sistema de gestão de qualidade Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle (APPCC).
Há ainda outros dois pontos que, apesar de não serem críticos, merecem atenção pela quantidade de micorganismos patogênicos encontrados. Um deles corresponde aos silos de armazenamento ou tanques de expansão, em que o leite cru fica armazenado por cerca de 48 horas até o processamento. “Mesmo o leite sendo mantido sob refrigeração, este tempo é muito elevado, fazendo com que haja multiplicação das bactérias psicrotróficas, auxiliando na degradação do leite”, conta Natali. O outro é o próprio ambiente de processamento, em que foi constatada alta contaminação pelos microrganismos patogenicos, o que pode favorecer a contaminação cruzada.
O estudo ressalta a importância da adoção de medidas eficientes de gestão de qualidade e segurança alimentar na produção do leite pasteurizado, para que sejam atingidos os padrões determinados legalmente. “As diversas ferramentas de gestão da qualidade auxiliam as indústrias para que tenham um maior cuidado com o processo de higienização bem como uma produção mais eficiente e com menor risco”, afirma a pesquisadora.
Imagem 1: Marcos Santos / USP Imagens
Imagem 2: cedida por Natali Knorr Valadão
Mais informações: e-mail natyknorr@yahoo.com.br, com Natali Knorr Valadão
Matéria de Bruna Romão, da Agência USP de Notícias, publicada pelo EcoDebate, 27/07/2012
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