Pesquisadores debatem economia ‘verde’ e a compatibilização do crescimento econômico com o meio ambiente
Economia verde em xeque – “Economia verde” costuma ser usada para descrever a compatibilização do crescimento econômico com o meio ambiente, um dos blocos do crescimento sustentável. Segundo a Green Economy Initiative, iniciativa do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) lançada em 2008, a economia verde resulta em melhoria do bem-estar humano e da igualdade social, enquanto reduz os riscos ambientais e a escassez ecológica.
Apesar de ser usada há mais de 20 anos, a expressão “economia verde” ainda é controversa, assim como seu próprio conceito. Enquanto para alguns é perfeitamente possível, para os mais críticos ela seria uma tentativa de viabilizar a sociedade de consumo e adiar mudanças estruturais.
Essa foi a tônica de um painel que reuniu cientistas de diversos países no Rio de Janeiro durante as discussões para a RIO+20. No encontro, os pesquisadores debateram as possibilidades de uma economia verde, se esse modelo requer uma mudança de paradigma nos padrões econômicos ou se é compatível com os mercados competitivos, com a mercantilização de recursos e com a expansão do consumo.
A economista Elizabeth Stanton, do Instituto do Meio Ambiente de Estocolmo, Suécia, pontuou que é preciso analisar para quem os benefícios desse novo paradigma econômico seriam distribuídos. “A tendência é fazer os pobres ficarem mais ricos ou os ricos ainda mais ricos?”, questionou.
Tim Jackson, professor de desenvolvimento sustentável da Universidade de Surrey, na Inglaterra, e autor do livro Prosperity without growth (“Prosperidade sem crescimento”), defendeu uma mudança de valores, com menos consumismo e individualismos.
“O crescimento econômico tem distribuído seus benefícios de maneira desigual. Longe de elevar o padrão de vida dos pobres, o crescimento piorou a situação de boa parte da população mundial. A riqueza favoreceu uma minoria”, disse.
“À medida que a economia se expande, crescem as implicações nos recursos naturais envolvidos, com impactos globais que já são insustentáveis. No último meio século, enquanto a economia global crescia, 60% dos ecossistemas mundiais foram degradados. Uma escassez de recursos naturais básicos – como o petróleo – pode estar a menos de uma década de nós”, afirmou Jackson.
“A economia verde é uma forma de negar evidências como a de que a concentração de dióxido de carbono está crescendo a 2 partes por milhão (ppm) ao ano”, disse o espanhol Joan Martinez Alier, da Universidade de Barcelona, à Agência FAPESP.
Segundo o economista catalão, a base do acordo deveria ser o hemisfério Norte global renunciar ao crescimento econômico em favor do crescimento do Sul.
“Creio que o Norte deveria ter economias sem crescimento e o Sul deveria reduzir suas extrações naturais para a metade e passar a exportar menos seus produtos. O que o Sul também poderia fazer era aumentar os impostos sobre a exportação. No caso brasileiro, por exemplo, quem pagaria por um possível acidente ecológico na extração do petróleo do fundo do mar, com o pré-sal?”, disse.
Para Alier, a proposta de sustentabilidade mundial baseada em ajudas financeiras multilaterais não é o caminho. “Emprestar dinheiro, como historicamente se tem feito, não é a saída, pois preservar o meio ambiente não é uma questão de milhões, mas sim de controlar a mudança climática e manter a biodiversidade”, disse.
“Em relação aos países do hemisfério Sul, há um pensamento de que eles são demasiados pobres para serem ecológicos. Mas do que morreram pessoas como Chico Mendes se não para defender a ecologia? Ecologia não é um luxo, é uma necessidade para todos”, afirmou Alier.
Recursos naturais
Lidia Brito, diretora da divisão de Políticas Científicas da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), rejeita a expressão “economia verde”.
“Para ser honesta, na Unesco não falamos em economia verde. Falamos de sociedade verde. Penso que o ceticismo dos investigadores vem daí: a discussão não é sobre economia. O que temos certeza é que não é possível falar apenas de um dos blocos do desenvolvimento sustentável”, disse.
“A economia não pode ser discutida sem as questões sociais, culturais e ambientais. Elas estão interligadas e não podem ser tratadas de forma independente. Fico satisfeita com os cientistas brasileiros, que não querem falar apenas em economia. Temos que falar em sociedade verde, para destacar essa força de mudança”, disse Brito.
Na opinião de Ronaldo Seroa da Motta, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e professor de Economia Ambiental do Ibmec no Rio de Janeiro, não há outra saída a não ser tentar uma economia que seja restritiva no uso de recursos naturais.
“Sou a favor da precificação dos recursos naturais. Enquanto tivermos água barata, por exemplo, vamos consumir mais. Devemos nos preocupar com o produto líquido, quer dizer, o quanto que de capital natural perdemos para gerar uma determinada produção. Era isso que deveríamos estar medindo”, disse.
“Se aumentarmos o preço dos serviços ambientais, teremos uma perda de crescimento econômico em curto prazo, mas depois isso será revertido. Um exemplo: devido ao alto índice de desmatamento das florestas, o cerceamento à extração de madeiras fez com que passássemos a usar derivados de petróleo, e hoje vemos muitos produtos de plástico e quase nada de madeira. Mas se tivermos uma política agressiva na área ambiental, a primeira coisa a ser feita é reflorestar, opção mais barata e urgente”, afirmou.
Segundo Motta, ex-diretor da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), é preciso reflorestar 10% da superfície do planeta para capturar carbono. “Isso impulsionaria enormemente o setor produtivo da madeira, uma vez que vamos extrair madeira e mobilizá-la em artigos como móveis, para poder fazer a madeira crescer novamente e continuar capturando carbono”, disse.
“Então, daqui a 30 anos, por exemplo, o fato de colocarmos o preço do carbono alto e todo mundo ter que plantar para poder continuar a produzi-lo, implicará em crescimento econômico impulsionado pelo setor produtivo da madeira, mais competitivo, sem degradação do meio ambiente”, disse.
De acordo com Motta, a saída não é aumentar o preço do que não é sustentável por meio de impostos, mas sim incentivar iniciativas sustentáveis cujos produtos sejam mais baratos.
Matéria de Washington Castilhos, na Agência FAPESP, publicada pelo EcoDebate, 22/06/2012
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