Os donos do planeta, artigo de Lya Ramos
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[EcoDebate] Não é de hoje nem de ontem que existem debates e conferências tendo como assunto meio ambiente e sustentabilidade. Em 1972 foi realizada a Conferência de Estolcomo, um grande evento que já abordava a temática da degradação ambiental.
Vinte anos após, o Brasil sediou a Eco 92, um evento onde foram levantados os problemas ambientais existentes, e de onde saíram sem sombra de dúvidas, documentos que ainda hoje servem como alicerce para muitas discussões ambientais. Sim, houve proveito nisso tudo, mas não houve engajamento nas soluções encontradas para conter a destruição do planeta. Tanto é que após vinte anos, estamos novamente discutindo algo que agora está bem pior.
Na Eco 92 foram aprovadas duas grandes convenções, uma sobre biodiversidade e outra sobre mudanças climáticas, nesta última, como resultado de seu aprofundamento foi elaborado o Protocolo de Quioto, um documento com o objetivo de reduzir os gases emitidos pelo efeito estufa, através da execução de metas específicas para diminuir a emissão dos principais gases causadores desse efeito: dióxido de carbono (CO), metano (CH), óxido nitroso (N2O), hexafluoreto de enxofre (SF6), hidro-fluorcarbonos (HFCs) e perfluorcarbonos (PFCs.
Outro fruto da Eco 92 foi a Agenda 21, um plano elaborado pelo Brasil com objetivo de desenvolver sua própria sustentabilidade, tendo como temas: a agricultura sustentável, as cidades sustentáveis, gestão de recursos naturais, redução das desigualdades sociais, infraestrutura e integração regional e ciência e tecnologia. Vinte e uma ações foram definidas com o intuito de atingir os objetivos da Agenda.
Muito pôde ser visto e até executado, mas tendo em vista a necessidade emergencial que o mundo e têm em relação ao socorro do qual o planeta precisa, esse muito ainda é pouco. Houve um considerável avanço no que diz respeito a algumas ações da Agenda 21, como exemplo, as campanhas nacionais para evitar o desperdício, a produção de recicláveis, o incentivo de certificações ambientais nas empresas, o investimento em energias alternativas como a eólica, o acesso a terra, o incentivo a agricultura familiar, a recomposição da vegetação nativa, a promoção da agricultura sustentável, a discussão sobre transgênicos, o incentivo ao ecoturismo, que eu vejo como uma estrada de retorno para o resgate da natureza, uma vez que gera renda ao mesmo tempo em que preserva e/ou reestabelece o meio, e a educação moral, que traz ao homem o respeito à natureza e consequentemente à vida.
Enquanto o PIB, o capital humano e o capital manufaturado crescem, o capital natural cai devido o avanço do desmatamento das florestas e o aumento das atividades agropecuárias no período, ou seja, grande parte do material para manufatura, que consequentemente aumenta o capital humano e o crescimento do PIB, foi e é proveniente da prática do desmatamento ilegal e do aumento da atividade agropecuária provavelmente instalada em locais de florestas. O que foi, é e sempre será importante é reflorestar, pois quando uma floresta é queimada e o solo é usado para o estabelecimento de pastagem, agricultura ou outra atividade, ocorre a liberação do carbono da vegetação para a atmosfera na forma de CO2 contribuindo, assim, com o aumento da concentração de gases de efeito estufa, logo, com a intensificação do aquecimento global.
As atividades de reflorestamento promovem a remoção ou “sequestro” de CO2 da atmosfera, diminui a concentração deste gás de efeito estufa e combate o aumento desse efeito, através da remoção do gás carbônico da atmosfera, no processo realizado pela fotossíntese, que permite a fixação do carbono na biomassa da vegetação e nos solos, na medida em que a vegetação cresce e o carbono vai sendo incorporado nos troncos, galhos, folhas e raízes.
Percebe-se claramente que houve algum avanço em prol as questões ambientais, mas esse avanço não foi o suficiente, e continua irrelevante em comparação com a gravidade do caso em discussão. Enquanto várias autoridades e pessoas comuns que se dizem interessadas no assunto, estão discutindo e quem sabe avaliando a situação em que o planeta se encontra, muitas outras autoridades e pessoas comuns, até mesmo algumas que podem estar participando dessa conferência, estão poluindo, desmatando, e fechando os olhos para o que para elas não é emergencial, ou pode ficar para ser discutido daqui a 20 anos.
Talvez as crianças de hoje estejam realmente mais interadas sobre os assuntos ambientais, afinal, considero que este também seja um fruto da Eco 92. Acho que não houve ninguém que nada fizesse, pois as crianças de hoje são frutos de jovens e crianças que há 20 anos participavam de forma direta ou indireta de todo aquele debate, e que talvez por falta de oportunidades não conseguiram abraçar a causa, mas puseram em seus filhos a esperança de ações diferentes, conscientizando-os sobre a importância do meio ambiente e sua preservação. Por outro lado, outras crianças estão seguindo o exemplo de seus pais, aqueles que foram em frente, que tiveram oportunidade e conscientizaram seus filhos através de suas próprias ações, mostrando como é que tudo deve ser feito e estimulando-os a continuar a preservação dos recursos naturais do planeta, bem como o uso sustentável dos mesmos.
Na verdade, acredito que muito não foi feito porque crianças e jovens apesar de terem a chance de opinar e expor ideias, ainda não tinham e nem têm o poder de ação e execução. O poder de mandar e desmandar, de assinar, de instituir. Hoje a consciência de que tanto os jovens como as crianças são importantes nesse debate e em qualquer outro, está reforçada. Isso graças a importante contribuição que os jovens deram para o processo de desenvolvimento sustentável com a adoção da Agenda 21. Afinal, é o futuro deles e de seus descendestes que está em jogo. Talvez muitos não pensem dessa forma, mas há quem diga que daqui a 30, 40 ou 50 anos não esteja mais vivo pra se importar com o pode acontecer com o planeta.
Infelizmente algumas pessoas pensam assim, ou pela própria filosofia de vida, se é que podemos dizer que isso seja uma filosofia, ou por serem influenciadas. Talvez alguns jovens e crianças que há 20 anos participaram da Eco 92, hoje adultas, não façam ou não fizeram nada para ajudar o planeta. Algumas podem até ter optado por profissões ligadas ao meio ambiente, mas, será que elas estão realmente ligadas as questões ambientais, ou já foram corrompidas pelo sistema capitalista e aplicam seus estudos e suas experiências a favor daqueles que exploram, desmatam, e poluem?
Porque o medidor da economia que é a soma todos os bens e serviços produzidos por um país, ou seja, o Produto Interno Bruto (PIB), não inclui componentes ambientais em seus cálculos, já que o capital natural é peça importante e essencial no desenvolvimento econômico de um país?
E por que o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) também utiliza da mesma prática? Talvez essa prática tivesse que ser repensada, pois é importante termos dados do capital natural nessa avaliação, talvez assim, a natureza tivesse a devida importância a qual não lhe é tirada, mas é ignorada, porque muitos pensam que os recursos naturais são inesgotáveis, ou mesmo não estão incomodados com o amanhã, este, resolva quem por aqui estiver.
São perguntas que para mim continuam sem respostas concretas, mas que com certeza daqui a um dia, uma hora ou que sabe daqui a 20 anos, as respostas poderão surgir trazendo boas expectativas e quem sabe soluções e extinção de dúvidas. Porque muito é pensado, muito é colocado no papel, mas, pouco é concretizado, pouco se quer é tentativa de execução.
Vários são os profissionais na área ambiental, mas poucos estão ligados às questões propriamente ditas. Falta a pergunta: Eu sou um profissional de pesca para o peixe, o mar e aqueles que deles vivem de forma sustentável, ou para as grandes empresas que exploram esses recursos de forma predatória? Eu sou um profissional para a terra e seus nutrientes e aqueles que dela vive de forma sustentável, ou para as empresas de defensivos agrícolas? Eu sou profissional para a floresta, seus habitantes, suas riquezas e o que dela vive de forma sustentável, ou para as madeireiras ilegais que exploram, desmatam e destroem? Falta esse tipo de questionamento, falta o comprometimento de alguns profissionais que por algum motivo abriu ou abrirá mão das questões ambientais e se entregou ou se entregará ao sistema financeiro capitalista, colocando de lado os recursos dos quais dependem a humanidade.
Não basta pensar, planejar e discutir. Pensamentos, planejamentos e discussões só são importantes se transformadas em ações concretas. Grandes reuniões, mega eventos, mega estruturas, feirinhas, campanha do abraço, nem pavilhões personalizados não trarão a solução dos problemas se não houver mãos que peguem na massa e faça realmente o que tem que ser feito. O planeta precisa ser tratado com terapia intensiva, não em doses homeopáticas, não há mais tempo para isso.
Acho um exagero dizer que a Rio + 20 e a Eco 92 não serviram para nada. Qualquer interesse por mínimo que seja em discutir a preservação dos recursos naturais tem a sua importância. O que não pode acontecer é que uns fiquem esperando os outros, e ninguém não faça nada porque alguém não faz. O planeta não pertence a A nem a B, mas a todos que nele vive. Uns exploram mais, outros menos, mas todos nós querendo ou não, consumimos os produtos dessa exploração. Falta a humildade em cada pessoa, empresário e governante, para que cada um comece a fazer a sua parte sendo eles ou não os mais exploradores ou poluidores. Somente os grandes empresários, as classes sociais mais favorecidas, nem as nações mais ricas não darão jeito no problema. As classes sociais menos favorecidas, as nações menos ricas e os pequenos e médios empresários tem que participar dessa luta, a eles tem que ser dado as armas para lutar, ou seja, os subsídios para que cada pessoa, principalmente a grande maioria possa escolher o que consumir, o que utilizar, o que comprar de forma consciente e sustentável e o que oferecer, pois muitos se veem obrigados a consumir, utilizar e ofertar produtos provenientes da exploração não sustentável e produtos poluentes, são até obrigados a contribuir de forma direta com isso, porque não tem chance e muito menos recurso para acessar o que é correto ambientalmente mas que financeiramente para eles é impossível.
Não esquecendo a fauna, pois muitas espécies estão sendo extintas e desconsideradas, acarretando um desequilíbrio ambiental, uma desarmonia no ciclo da natureza, um deslocamento injusto e muitas vezes desnecessários dos animais das florestas para a cidade. Cobras, jacarés e até onças já estão sendo convidadas e confirmando a presença no convívio com os homens, não de forma harmoniosa como seria se cada um estivesse em seu habitat natural fazendo o seu papel na natureza, mas, de forma quase que obrigatória por não terem nem o alimento nem seu habitat natural.
O ser humano se acha tão superior a tudo, que tem o direito de retirar indevidamente tudo o que acha pela frente, que tem o direito de desmatar e de poluir. O homem até já começou a procurar em outros planetas novos recursos passiveis de exploração. Quem sabe fazer de um ônibus espacial a nova arca de Noé, para partir e explorar uma nova terra, ou melhor, um novo habitat, e assim viver como o macaco que ele mesmo está pondo em extinção, pulando de galho em galho, ou melhor, de planeta em planeta. Homem! O planeta é de todos, das plantas, dos animais, dos minerais, de tudo que nele existe e de todos que nele habita. Cada um tem o seu papel para que o ciclo evolua de forma harmoniosa e que os recursos dos quais homens, animais e plantas precisam para sobreviver nunca se acabem. Será que o papel do homem é o de esgotar esses recursos e destruir o planeta? Ou será que isso foi apenas uma longa e grande fase do ser humano?
*Lya Ramos é ambientalista e escritora
EcoDebate, 22/06/2012
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