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População: uma comparação África e Américas, artigo de José Eustáquio Diniz Alves

 

População: uma comparação África e Américas, artigo de José Eustáquio Diniz Alves

[EcoDebate] As evidências arqueológicas mostram que o ser humano – homo sapiens – surgiu na África há cerca de 200 mil anos. De lá se espalhou pelo mundo. A África foi o primeiro continente ocupado pela humanidade e as Américas o último. Mas em 1950, as Américas com 340 milhões de habitantes (sendo 168 milhões na América Latina e 172 milhões na América do Norte) tinham uma população superior à da África que era de 230 milhões de habitantes.

A área total das Américas é de 42,2 milhões de km² e da África de 30,2 milhões de km². Assim, a África tinha uma densidade demográfica de 7,6 habitantes por km² e as Américas tinham 8 habitantes por km².

Ao longo da segunda metade do século XX houve um grande crescimento populacional em ambos os continentes. A população da África chegou a 811 milhões de pessoas, com densidade demográfica de 27 habitantes por km², no ano 2000. A população das Américas, ainda maior, chegou a 835 milhões, com densidade de 20 habitantes por km² (sendo 522 milhões de habitantes na América Latina e 313 milhões na América do Norte). Em 50 anos, a população da África multiplicou-se por 3,5 vezes, da América Latina por 3,1 vezes e da América do Norte por 1,8 vezes (no continente americano o crescimento foi de 2,5 vezes).

No ano de 2003, a população da África, de 870 milhões de habitantes, ultapassou a população das Américas, de 866 milhões de habitantes. Em 2012, estima-se a população da África em 1,07 bilhão de habitantes e das Américas em 954 milhões de habitantes (sendo 603 milhões da América Latina e de 351 milhões de habitantes da América do Norte).

As projeções da divisão de população da ONU indicam que, em 2050, o continente africano terá uma população de 2,2 bilhões de habitantes e o continente americano terá 1,2 bilhão de habitantes (751 milhões da América Latina e 449 milhões da América do Norte). A densidade demográfica será de 73 habitantes por km² na África e de 28 habitantes por km² nas Américas. Portanto, em meados do século XXI, a África terá cerca de 1 bilhão de habitantes a mais do que as Américas e terá uma densidade demográfica cerca de 2,5 vezes maior.

Para 2100, as projeções médias da ONU indicam uma população de 3,57 bilhões de habitantes na África e de 1,21 bilhão de habitantes nas Américas, com densidades demográficas de 118 e 29 habitantes por km², respectivamente. Ou seja, o continente africano deverá ter uma população de 2,36 bilhões de habitantes a mais do que as Américas e uma densidade demográfica 4 vezes maior. A população das Américas deverá crescer em torno de 370 milhões de habitantes na primeira metade do século XXI e depois se estabilizar, enquanto a população da África deverá passar de 811 milhões de habitantes em 2000 para 3,57 bilhões em 2100, ficando, demograficamente, 3 vezes maior do que as Américas.

O grande crescimento populacional da África acontece devido às altas taxas de fecundidade e ao elevado número de nascimentos anuais.
Ná década de 1950 a Taxa de Fecundidade Total (TFT) era de 6,6 filhos por mulher na África, em torno de 6 filhos na América Latina e de 3,5 filhos na América do Norte. No quinquênio 1995-2000 as TFT tinham caido para 5,2 filhos na África, 2,7 filhos na América Latina e 1,9 filhos na América do Norte. No quinquênio 2010-15 estima-se a TFT em 4,4 filhos na África, 2,1 filhos na América Latina e 2 filhos na América do Norte. As projeções da ONU indicam taxas de fecundidade, no quinquênio 2045-50, de 2,9 filhos por mulher na África, de 1,8 filhos na América Latina e de 2 filhos na América do Norte. Portanto, a fecundidade deve cair bastante na África, mas vai continuar acima do nível de reposição (ao contrário da América Latina) e, portanto, isto vai possibilitar a continuidade do crescimento populacional.

O número absoluto de nascimentos vai aumentar muito na África, pois o continente tem estrutura etária jovem e fecundidade mais elevada (mesmo que em declínio). Os dados da divisão de população da ONU mostram que em 1950 nasceram 11,6 milhões de crianças na África e 12,1 milhões nas Américas. No ano 2000, os nascimentos da África passaram para 32 milhões contra apenas 16 milhões nas Américas. Em 2012, estima-se que houve uma queda dos nascimentos anuais nas Américas para 15,5 milhões de crianças e um aumento na África para 37 milhões. Para o ano de 2050, as projeções são de 49 milhões de nascimentos na África e de 14 milhões nas Américas. Ou seja, em 1950 nasciam mais crianças nas Américas e em 2050 estarão nascendo cerca de 3,5 vezes mais crianças na África.

Os números mostram que a América Latina ultrapassou a América do Norte na segunda metade do século XX, mas já atingiu uma fecundidade ao nível de reposição e deve apresentar um decrescimento populacional na segunda metade do século XXI. A América do Norte vai continuar crescendo, principalmente pele efeito da imigração, mas deve apresentar uma estabilização da população após 2050.

Já a África vai ser o continente com maior crescimento do atual século, podendo ter um aumento de 4 vezes no volume da população (de 811 milhões, em 2000, para 3,5 bilhões, em 2100). Mesmo que o número de nascimentos no continente africano estabilize em 50 milhões de crianças ao ano, em 2050, isto daria uma população de 3,0 bilhões de habitantes, se a esperança de vida ao nascer ficar em 60 anos (50 milhões vezes 60 = 3,0 bilhões de pessoas) ou 3,5 bilhões de habitantes se a esperança de vida chegar a 70 anos (50 milhões vezes 70 = 3,5 bilhões).

Portanto, mesmo com a queda das taxas de fecundidade, a população da África vai continuar crescendo e pode atingir um volume 3 vezes maior do que a população das Américas até o final do corrente século. Mas o continente americano possui 45% do total mundial de disponibilidade de água doce, enquanto a África possui apenas 9% (segundo dados da FAO). Neste ritmo, não será fácil reduzir a pobreza, melhorar o bem-estar da população, proteger a biodiversidade e evitar uma maior degradação ambiental.

Por tudo isto, a África vai ter que enfrentar um grande problema político e econômico para lidar com o grande crescimento demográfico. Mas não se trata de repetir nem o discurso colonialista e nem a velha fórmula do controle da natalidade impositivo. Ao contrário, trata-se de empoderar as mulheres e universalizar os direitos de cidadania, para que a autodeterminação reprodutiva de homens e mulheres, especialmente dos jovens, possa ser colocada em prática.

Depois de décadas de aumento da pobreza absoluta e relativa, pela primeira vez, o relatório do Banco Mundial (de 2012) mostrou que o número de pessoas vivendo na pobreza extrema (abaixo de US$ 1,25 por dia) se reduziu entre 2003 e 2010. A pequena queda nas taxas de fecundidade já permitem o início do bônus demográfico no continente. Trata-se, pois, de saber administrar um círculo virtuoso que permita que a África siga os caminhos demográficos das Américas, mas com especial atenção à implantação dos direitos humanos e ambientais: inalienáveis, indivisíveis e universais

José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

EcoDebate, 27/04/2012

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2 thoughts on “População: uma comparação África e Américas, artigo de José Eustáquio Diniz Alves

  • Sabemos que esse controle impositivo da natalidade não será praticado pelos Estados capitalistas, uma vez que contraria seus interesses, e, pelo mesmo motivo, nem mesmo campanhas educativas são desenvolvidas. Ao contrário, as pessoas são incentivadas, pelos meios de comunicação, a, mais e mais, se reproduzirem.

    Essa “auto determinação reprodutiva de homens e mulheres, especialmente dos jovens,”, juntamente com as práticas e crenças religiosas são de grande importância para o desenvolvimento do capitalismo. Mas, esse desenvolvimento tem como precípuas consequências a destruíção do meio ambiente e a impossibilidade de sobrevivência das especies e de qualidade de vida para os seres humanos.

    O processo destrutivo se encontra, já, bastante avançado.

    Ou a autodeterminação reprodutiva de homens e mulheres é jogada às favas, ou tudo que a natureza, em milhões de anos, construiu, será em cinzas transformado.

    Se formoss esperar pelo controle natural do crescimento populacional da humanidade, conforme destrito no artigo, certamente o planeta Terra já estará impossibilitado de se recuperar, e, aí, senhores defensores dos ditames do capitalismo, nenhuma medida preventiva poderá dar bons resultados, e, não adiantará chorar o leite derramado.

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