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A Caatinga é o bioma semiárido mais biodiverso do mundo. Entrevista com João Arthur Seyffarth

 

Trata-se de um bioma adaptado às condições semiáridas e se localiza nos nove estados do Nordeste e no norte de Minas Gerais, ocupando 11% do território nacional

Por: Thamiris Magalhães

“A Caatinga é o bioma semiárido mais biodiverso do mundo, sendo extremamente distinto em espécies animais, vegetais, em paisagens e sob o ponto de vista genético”, frisa o biólogo João Arthur Seyffarth, em entrevista concedida por e-mail à IHU On-Line. E continua: “também muito rico é o conhecimento tradicional associado a esta biodiversidade, que pode ser explorado para seu uso sustentável e para o desenvolvimento sustentável do país”. Segundo Seyffarth, a Caatinga tem identificadas 932 espécies vegetais, “sendo 318 endêmicas, que só ocorrem no bioma. Existem 12 tipos de vegetações na Caatinga, que vão das mais abertas, como as caatingas arbustivas e arbustivo-arbóreas, até as mais florestais, como as florestas estacionais”.

João Arthur Seyffarth é biólogo, mestre em ecologia e coordenador do Núcleo do Bioma Caatinga da Secretaria de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente – MMA.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – Como pode ser definido sistematicamente o bioma Caatinga? Quais áreas ele abrange? Equivale a quantos por cento do território nacional?

João Arthur Seyffarth – A Caatinga é o único bioma exclusivamente brasileiro. Ela é composta por oito ecorregiões e vários tipos de vegetação de savana e florestais. É um bioma adaptado às condições semiáridas e se localiza nos nove estados do Nordeste e no norte de Minas Gerais, ocupando 11% do território nacional (844.453 km²).

IHU On-Line – Como pode ser caracterizado o clima no bioma?

João Arthur Seyffarth – O clima da Caatinga é semiárido, com temperaturas anualmente entre 25°C e 29°C, em média. A estação de seca é em geral de 7 a 10 meses, podendo ficar até 12 meses sem chover em certas regiões, sendo que as estiagens podem durar mais do que dois anos em algumas regiões. Em geral, a precipitação anual não passa de 800 mm em áreas de planície e fica entre 800 e 1.200 mm nas áreas mais elevadas.

IHU On-Line – Que tipos de biodiversidades a Caatinga oferece?

João Arthur Seyffarth – A Caatinga é o bioma semiárido mais biodiverso do mundo, sendo extremamente diverso em espécies animais, vegetais, em paisagens e sob o ponto de vista genético. Também muito rico é o conhecimento tradicional associado a esta biodiversidade, que pode ser explorado para seu uso sustentável e para o desenvolvimento sustentável do país.

IHU On-Line – Por que motivo a Caatinga é um dos biomas menos conhecidos do país?

João Arthur Seyffarth – O bioma Pampa é ainda menos conhecido do que a Caatinga. O desconhecimento da Caatinga e do seu potencial para o desenvolvimento do país decorre de vários fatores. Dentre eles estã o menosprezo por biomas que não sejam florestais, vistos como pobres em biodiversidade e potencial econômico; o fato de a Caatinga estar situada longe dos principais centros do país, em termos econômicos e populacionais; e o pouco conhecimento científico sobre sua biodiversidade, que resulta dos poucos centros de pesquisa e universidades instaladas em seu território. Tudo isso também gera pouco interesse da mídia em divulgar o bioma, o que só começou a mudar nos últimos anos.

IHU On-Line – Quais são as riquezas vegetais que o bioma oferece?

João Arthur Seyffarth – A Caatinga tem identificadas 932 espécies vegetais, sendo 318 endêmicas, que só ocorrem no bioma. Existem 12 tipos de vegetações na Caatinga, que vão das mais abertas, como as Caatingas arbustivas e arbustivo-arbóreas, até as mais florestais, como as florestas estacionais.

IHU On-Line – Tem dados de quantas espécies de animais vivem no bioma? O que isso representa para o país?

João Arthur Seyffarth – Em torno de 1.487 espécies nativas de animais vivem na Caatinga, sendo 178 de mamíferos, 591 de aves, 177 de répteis, 79 de anfíbios, 241 de peixes e 221 de abelhas. Essa diversidade ajuda a preservar uma série de serviços ambientais importantes para a região e o país, como a polinização, sem a qual não existe agricultura, e mantém a diversidade das plantas, já que elas dependem da fauna para se reproduzirem, dispersarem suas sementes e para a ciclagem de nutrientes. As abelhas nativas são uma fonte de rendimentos para um grande número de pessoas e são utilizadas em produtos industriais. Tal diversidade também pode ser explorada, com grandes benefícios econômicos para o país, na utilização de seus recursos genéticos, desde que devidamente autorizados, para os mais diversos fins, tanto na indústria farmacêutica como na alimentícia, dentre outros.

IHU On-Line – Tem dados de quantos por cento da área do bioma já foi alterada?

João Arthur Seyffarth – Em torno de 46% do bioma já foram desmatados, segundo dados do Projeto de Monitoramento dos Biomas Brasileiros, do Ministério do Meio Ambiente – MMA/Ibama, sendo que grande parte dos remanescentes foram alterados e são utilizados para várias atividades humanas, como criação de bovinos, caprinos e ovinos, bem como para a retirada de lenha para fogões domésticos e fornos industriais, principalmente nos polos gesse iro (Chapada do Araripe –CE/PI/PE) e cerâmicos (por exemplo, as regiões do Seridó-RN e Baixo Jaguaribe-CE).

IHU On-Line – Qual a situação social e econômica das pessoas que residem na área da Caatinga?

João Arthur Seyffarth – O semiárido brasileiro ainda apresenta os piores índices de desenvolvimento humano do país. Em geral, isso se repete para os demais índices sociais e econômicos. No entanto, a região vem nos últimos anos crescendo mais do que a média nacional e os índices sociais vêm melhorando, fruto do maior investimento público na região e das políticas sociais destinadas aos menos favorecidos.

IHU On-Line – Em que sentido a conservação da Caatinga está intimamente associada ao combate da desertificação?

João Arthur Seyffarth – Cerca de 60% das áreas susceptíveis à desertificação no país estão na Caatinga, incluindo três núcleos de desertificação (regiões do Seridó-RN, Cabrobó-PE e Irauçuba-CE), que são as áreas mais afetadas pelo processo. Além dessas, existem muitas áreas do bioma já afetadas de forma grave ou muito grave por esse processo. Dessa forma, promover a conservação, por meio de ações de conservação de paisagem (por exemplo, criação e consolidação de Unidades de Conservação) e de espécies (conservação de espécies ameaçadas, controle de invasoras) bem como o uso sustentável (manejo madeireiro e não madeireiro, manejo agrosilvopastoril) e a recuperação de áreas degradadas neste bioma é o mesmo que combater a desertificação, a mitigação e adaptação às mudanças climáticas.

IHU On-Line – Gostaria de acrescentar algo?

João Arthur Seyffarth – É importante destacar as ações que vêm sendo realizadas pelos governos estaduais e federal bem como por inúmeras organizações da sociedade civil em prol do bioma, o que tem aumentado a área protegida por unidades de conservação, e os projetos voltados para o manejo sustentável da sua biodiversidade para diversos usos. Destaca-se que alguns fundos têm investido no bioma, como o Fundo Socioambiental da Caixa Econômica, o Fundo de Conversão da Dívida Americana e o Fundo Clima. Esses últimos sob a responsabilidade do MMA.

(Ecodebate, 27/04/2012) publicado pela IHU On-line, parceira estratégica do EcoDebate na socialização da informação.

[IHU On-line é publicada pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]

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