Agricultura mundial vai consumir 19% mais água até 2050
A agricultura mundial necessitará de 19% a mais de água até 2050, se quiser atender à demanda crescente por alimentos de um mundo em rápida expansão. O problema, segundo o novo relatório da Organização das Nações Unidas (ONU), é que a maior parte dela será requisitada em bolsões agrícolas que já sofrem com uma oferta apertada ou com a escassez desse bem natural. Por Bettina Barros, Valor Econômico.
Divulgado ontem, o quarto “Relatório Mundial sobre o Desenvolvimento da Água” é categórico: a situação vai piorar. “A escala desses problemas aumentará, sem dúvidas”, disse Olcay Unver, coordenador do estudo lançado na abertura do Fórum Mundial de Águas, um evento internacional realizado a cada três anos e que desta vez é sediado na cidade de Marselha, na França.
De acordo com dados da ONU, pelo menos 12 países no Oriente Médio e no Sudeste Asiático vivem em “absoluta escassez” de água. O Oriente Médio chama atenção ainda por outra razão: dois terços do seu suprimento já vem de fora da região.
Grandes exportadores de commodities agrícolas, como os EUA, enfrentam seus próprios pesadelos. O Texas, conhecido como “cinturão agrícola” do país, registrou nesta safra uma forte seca que afetou lavouras e pecuária e provocou perdas da ordem de US$ 5,2 bilhões, segundo estimativa da Texas A&M University. Por diversos parâmetros, a falta de chuva nas Grandes Planícies está sendo considerada a pior desde a “Dust Bowl”, a tempestade de areia que ocorreu na década de 1930 e causou sérios prejuízos econômicos e ambientais.
Influenciada pelo agravamento do fenômeno climático La Niña, a situação chegou a tal ponto que o órgão que administra o fornecimento de água para a maior região de cultivo no Texas, busca permissão para interromper a irrigação para agricultores.
Aqui no Brasil os prejuízos não são diferentes. Também agravado pelo La Niña, produtores de grãos do Sul e parte do Centro-Oeste devem amargar perdas de mais de R$ 10 bilhões na atual safra, segundo estimativas oficiais.
A premissa para os alarmes tocados ontem pela ONU é a mesma que tem provocado nos últimos anos: a fragilidade da segurança alimentar do planeta que se aproxima dos 9,3 bilhões de habitantes que, por sua vez, puxarão o consumo de matérias-primas da soja à carne. Para atender a demanda, a produção de alimentos deverá crescer em 60% até 2050, indicam dados revisados da FAO, agência para Agricultura e Alimentação da ONU. No entanto, a entidade adverte que um quarto das áreas agrícolas mundiais tornaram-se degradadas pelo uso da agricultura intensiva que depauperou recursos hídricos, reduziu a qualidade dos solos e aumentou a erosão.
“A falta crescente de água é uma situação inaceitável”, afirmou o primeiro-ministro francês, François Fillon, que inaugurou o fórum deste ano com o lema “É hora de solução”. Ao considerar inaceitável, Fillon engrossou o coro de economistas que passaram a criticar a principal forma de medição econômica – o Produto Interno Bruto (PIB) – por não refletir problemas sérios como a saúde das economias.
A agricultura representa cerca de 70% do consumo de água do planeta. Mas pode chegar a 90% em algumas economias, caso do Iraque, Omã, Síria e Iêmen que agora importam boa parte do consumo necessário para a produção de grãos, diz o relatório.
A Arábia Saudita, por sua vez, está em processo de redução da sua produção de grãos para preservar águas subterrâneas utilizadas de forma insustentável. “As águas dos lençóis freáticos podem ser extraídas à exaustão e, em algumas regiões, atingiu limites críticos”, afirma a ONU.
A aquisição de terras por companhias estrangeiras é outro fator que ganhou ressalva no relatório. Essa estratégia de ampliação dos negócios tem sido comum em países da África com empresas estatais chinesas. “Mas adquirir direitos do uso de terra para o plantio em outros países implica também no direito de usar a água desses países”, lembrou Unver. “Países que podem arcar com melhor tecnologia podem impor um estresse de água adicional ao já existente”.
Segundo a Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), sem novas políticas de manejo de água, mais de 40% da população mundial viverá em áreas consideradas de alto estresse hídrico até 2050.
O Fórum Mundial de Água acontecerá até o final desta semana e conta com uma plateia de ministros, representantes da indústria e organizações não governamentais de 140 países. O Brasil enviou a Marselha uma comitiva recorde de 200 pessoas. Além da Rio+20, que abordará a água como um dos temas centrais, o alto número de representantes do país se explica pela possibilidade de o Brasil sediar o próximo evento, em 2015.
Matéria no Valor Econômico, socializada pelo ClippingMP.
EcoDebate, 14/03/2012
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