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Dilemas cercam o pagamento por serviços ambientais (PSA) no novo Código Florestal

 

Proposta do novo Código Florestal é bem recebida, mas há dúvidas sobre melhor forma de remunerar agricultores

A proposta de mudança do Código Florestal que saiu do Senado em dezembro e está para ser votada na Câmara trouxe um item, em geral, bem visto por ambientalistas e produtores rurais: o pagamento por serviços ambientais (PSA). O tema costuma ser indicado como um dos caminhos para frear o desmatamento por conter a ideia básica de que a floresta presta uma série de serviços. Logo, mantê-la em pé tem um valor que poderia ser pago por quem se beneficia do serviço e recebido por quem preserva a mata. Reportagem de Giovana Girardi, em O Estado de S.Paulo.

Diversas experiências isoladas no Brasil têm obtido resultados interessantes (mais informações nesta página), em especial quando se consideram os dois benefícios mais claros de ter matas: a proteção a nascentes e rios, que garante o fornecimento de água, e o sequestro de carbono, o principal gás de efeito estufa.

Ao ser contemplada dentro do Código Florestal como um incentivo em escala nacional para os agricultores manterem a vegetação natural em parte das suas terras, porém, a proposta levanta alguns questionamentos: o PSA é viável para ser aplicado em todo o País? Como ele poderia funciona? Como decidir quem tem direito a receber?

O primeiro passo para resolver essas questões, dizem especialistas, é definir as regras do jogo, com, por exemplo, a criação de uma política nacional de PSA. Sem isso, somente a inclusão do tópico no Código Florestal não traz muito avanço. E, na ausência de definições, o que se percebe é que mesmo quem já trabalha com esse mecanismo tem formas diferentes de encará-lo.

Por exemplo, o próprio conceito de pagamento por serviços ambientais é abrangente. Ele significa pagar simplesmente para que um proprietário mantenha o que por lei ele já é obrigado a fazer – como a Reserva Legal e as Áreas de Preservação Permanente (APPs) – ou ele tem de oferecer algo a mais para merecer isso?

Para Sergius Gandolfi, pesquisador que trabalha com restauração florestal na Esalq/USP, há um problema no primeiro caso. “É parte do ônus do negócio que o produtor não cause dano ambiental. Por outro lado, a ideia de que ao preservar está se prestando um serviço, ele passa a ser um direito, o proprietário poderia optar se quer prestá-lo ou não. Se a cana parecer mais interessante, ele pode não fazer.”

Proteção. A própria revisão do código, no entanto, expõe o fato de que a lei não garante essa proteção. “Temos esses instrumentos de comando e controle, com multas e punições, desde d. João VI. Mas em boa medida eles nunca pegaram”, pondera Virgilio Viana, superintendente-geral da Fundação Amazonas Sustentável (FAS), que coordena o programa Bolsa Floresta na reservas extrativistas do Estado.

“Temos de ir além da abordagem legalista e mudar o ‘paradigma do mato’. O brasileiro tende a ver o mato como sinônimo de sujeira. Isso faz com que às vezes os proprietários deixem pegar fogo, desmatar clandestinamente”, diz. Para ele, ao ganhar um valor, o mato pode ser olhado de outra forma. “Mesmo que um grande proprietário não vá depender disso para ficar mais rico, com a precificação, ele pode começar a olhar para aquilo com bons olhos, não vai ser um estorvo que poderia ser degradado. Ele vai cuidar desse ativo.”

A ideia é válida, opina José Maria Cardoso da Silva, da ONG Conservação Internacional, porque historicamente se usou os serviços que a natureza oferece, com custo zero. “Mas uma coisa é fornecer incentivos para a regularização das propriedades perante a lei, outra é o PSA. Para configurar o mercado, o fazendeiro teria de ir além da lei.”

Por enquanto, a parte de PSA que já pode ser explorada imediatamente por meio do Código Florestal é a compensação de RL (veja quadro ao lado), pela qual um proprietário em déficit com sua obrigação de manter uma parte de sua terra preservada paga para que outro proprietário faça isso.

A prática não vem sendo adotada e, em uma tentativa de ampliá-la, o substitutivo do código propôs que a compensação poderia ser feita em qualquer ponto do bioma, mesmo que seja a milhares de quilômetros de distância.

“Essa escala não é adequada como um mecanismo de mercado”, afirma o pesquisador Gerd Sparovek, da Esalq/USP. Ele acredita que haverá excesso de oferta (agricultores querendo negociar suas florestas em pé) e falta de compradores (os que querem compensar seu déficit fora de suas propriedades).

“Isso tende a reduzir o preço da compensação, fazendo com que ela seja atraente apenas em regiões remotas nas quais o interesse pelo desmatamento é pequeno. No final, será protegido apenas o que nem estava ameaçado, por um preço muito baixo para ter alguma relevância no desenvolvimento da região que cede as áreas para conservação.”

EcoDebate, 01/03/2012

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