Pequenos produtores estão cientes de riscos dos agrotóxicos
Apesar de terem consciência dos malefícios, eles continuam usando os produtos, como mostra pesquisa da EESC
A maior parte dos pequenos agricultores que utiliza agrotóxicos em suas plantações tem consciência dos riscos causados pelo uso dos produtos, mas ainda assim negligencia o perigo que eles representam, segundo pesquisa da Escola de Engenharia de São Carlos (EESC) da USP. O estudo trabalhou com a população rural do município de Bom Repouso, em Minas Gerais.
A pesquisa Análise da percepção de risco do uso de agrotóxicos em áreas rurais: um estudo junto aos agricultores no município de Bom Repouso (MG), que pretendia fazer um levantamento para saber se os produtores tinham noção dos riscos à saúde e ao meio ambiente trazidos pelo uso intensivo de agrotóxicos, constatou que cerca de 50% dos entrevistados classificava o manuseio de agrotóxicos como “muito perigoso”, e 40% deles diziam não receber nenhuma orientação técnica, mas somente a de amigos, vizinhos ou parentes, o que faz com que determinadas práticas de aplicação dos produtos químicos sejam perpetuadas. A autora da pesquisa, a assistente social Evellyn Espíndola, utilizou uma Planilha de Percepção de Riscos a Saúde e ao Meio Ambiente em uma mostra de 50 pessoas. Para responder à planilha, o próprio entrevistado ou alguém de sua família já deveria tinha sofrido intoxicações em decorrência do uso de agrotóxicos. Por este método, eles indicaram o grau de perigo para determinadas situações (como “nada perigoso”, “pouco perigoso” e “muito perigoso”).
Quando perguntados se conseguiam entender a indicação de toxicidade do produto e o que está escrito na bula, grande parte dos produtores disse que não consegue, o que se deve principalmente à sua baixa escolaridade. “A maioria deles cursou até o ensino fundamental, então mesmo que saibam ler, não conseguem entender a bula, que é cheia de termos técnicos”, diz Evellyn. Dos entrevistados por ela, 70% admitiram ser extremamente perigoso o fato de não conseguirem entender a bula. Para a pesquisadora, a dificuldade na interpretação da bula reafirma a necessidade de intervenção de um técnico ou agrônomo.
Segundo a assistente social, os agricultores sabem que manuseiam um produto perigoso, mas ignoram esse perigo por três fatores principais: a ausência de informações, a baixa escolaridade e a perpetuação de antigas práticas de cultivo. Fora isso, ainda há o sentimento de imunidade ao perigo e a questão financeira. A agricultura orgânica (que não usa agrotóxicos), por exemplo, foi uma das alternativas propostas por pesquisadores de um projeto anterior, mas os produtores a consideram mais cara, com menos retorno e com exigência de mais cuidados. Em seu-dia-a-dia, os agricultores costumam usar roupas comuns para a aplicação dos tóxicos (a pesquisa constatou que 86% deles não usam os Equipamentos de Proteção Individual [EPIs] no momento da aplicação), além de muitas vezes misturá-los com outros produtos de forma inadequada.
Projeto Mogi-Guaçu
Entre 2004 e 2006, o projeto Mogi-Guaçu, da Petrobras Ambiental, fez estudos na área e detectou elevado índice de utilização dos agrotóxicos e de intoxicações decorrentes desse uso na região. Os agricultores relataram 81 tipos diferentes de compostos químicos usados em suas plantações. O estudo de Evellyn Espíndola, orientado por Evaldo Luiz Gaeta Espindola, deriva desse projeto, que na época entrevistou 160 pessoas. A mostra selecionada pela pesquisadora se refere somente àqueles que se declararam intoxicados pelos agrotóxicos. “As conclusões que o Mogi-Guaçu e outros projetos da época trouxeram já sugeriam um resultado como o encontrado, então não foi uma surpresa para nós quando verificamos que os agricultores sabiam do risco que corriam, mas não faziam nada a respeito”, afirma a pesquisadora. Para ela, os agricultores são os agentes e as próprias vítimas de sua prática.
Bom Repouso
A cidade de Bom Repouso tem como principais produtos cultivados a batata e o morango. O alto uso de agrotóxicos nesses cultivos pode contaminar, além dos próprios hortifruti, o solo e a água da região, o que implica em problemas de saúde mais sérios e abrangentes.
Cerca de 50% da população de Bom Repouso reside em áreas rurais, e dada a importância e o peso da agricultura para o município, é ainda mais importante atentar para o manuseio dos agrotóxicos na região, já que práticas intervencionistas podem ter impactos na economia da cidade. “Ações como desenvolvimento de projetos comunitários com ênfase social, econômica e ambiental são sempre boas alternativas, pois podem contribuir para a formação das novas gerações”, acredita Evellyn.
A pesquisadora acredita que, justamente por isso, sua pesquisa é importante para a comunidade, já que dá informações a respeito da opinião e dos costumes da população, e o que pensam sobre o uso de agrotóxicos, o que pode facilitar ações futuras. “É necessária uma mudança de hábitos”, completa.
Mais informações: email ev.espindola@gmail.com, com Evellyn Espíndola
Reportagem de Mariana Soares, da Agência USP de Notícias, publicada pelo EcoDebate, 20/02/2012
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