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Coleta e acesso à biodiversidade: ainda em busca de agilidade

 

Há cerca de uma década, o Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGEN) era o principal órgão de autorização a coleta e acesso à biodiversidade. Ainda concentra a maior parte dos pedidos, mas, a partir de 2003, começou a ganhar braços auxiliares. Primeiro foi o Ibama, que naquele ano passou a autorizar pesquisas científicas. Em seguida, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), em 2007, começou a analisar pedidos de coleta por meio do Sistema de Autorização e Informação em Biodiversidade (Sisbio).

Em setembro de 2011, foi aprovado o credenciamento do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) para dar autorizações a pesquisas científicas com acesso a conhecimento tradicional associado (CTA) a recursos genéticos. E agora, em janeiro de 2012, terminaram os testes que caracterizaram a nova fase de autorizações de acesso a recursos genéticos do CNPq, instituição já cadastrada para analisar pedidos de pesquisas científicas, e que acaba de aumentar seu escopo de autorizações.

Digitalização – “Por enquanto, o CGEN é o único que pode autorizar uma solicitação que envolva as duas coisas juntas: recurso genético [bioprospecção e desenvolvimento tecnológico] e conhecimento tradicional associado (CTA)”, resume Eliana Fontes, diretora do Departamento de Patrimônio Genético da Secretaria de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente (MMA).

A pesquisa científica não é mais autorizada pelo CGEN, ficando a cargo apenas do Iphan (com CTA) e Ibama ou CNPq (sem CTA). Ao ICMBio cabe a tarefa de autorizar a coleta de recursos genéticos. Rodrigo Silva Pinto Jorge, coordenador do Sisbio no ICMBio, afirma que a criação do Sisbio melhorou o relacionamento dos órgãos ambientais (em especial do próprio ICMBio) com a comunidade científica. “Antes, o processo de solicitação e emissão de autorizações ocorriam por tramitação em papel, tendo que passar por todas as unidades de conservação onde o pesquisador quisesse atuar. Hoje, com a solicitação on-line, o pedido é distribuído automaticamente para cada unidade”, compara, lembrando que os prazos de análise, de 45 dias úteis, “têm sido respeitados em mais de 90% dos casos”.

Jorge revela que, de 2007, quando o ICMBio começou a emitir autorizações de coleta, até hoje, cerca de 10.900 pedidos receberam uma resposta positiva. Apenas 3,3% das solicitações foram negadas. “Um avanço que a gente obteve no ano passado é que o Sisbio disponibilizou o modo de relatórios. Até então, era um sistema meramente autorizativo. Agora, existe a obrigação de os pesquisadores informarem o que foi obtido com os projetos”, conta.

Desde 2009, o CNPq analisava solicitações de pesquisa científica sem acesso ao CTA (este feito pelo Iphan). A partir de 2012, pedidos de bioprospecção e desenvolvimento tecnológico também poderão ser contemplados por meio do CNPq. “Mais do que queimar uma etapa, nós vamos dar uma qualidade a essa análise”, afirma Paulo Beirão, diretor de Ciências Agrárias, Biológicas e da Saúde do CNPq. Beirão conta que, nessa nova fase, será usado o mesmo tipo de sistema para análise de pesquisa, que é o formulário com submissão eletrônica na plataforma Carlos Chagas, ferramenta que dá “muito mais agilidade nas análises e nas respostas”.

Beirão conta que o CNPq está adaptando o atual sistema de submissão para algumas peculiaridades que a Lei exige no caso do interesse tecnológico. “Por exemplo, o formulário tem que informar quem é o provedor do material genético, algo que para pesquisa pura não há necessidade”, detalha, acrescentando que, entretanto, o sistema ainda não pode realizar um processo completamente sigiloso. “Alguns tipos de pesquisa envolvendo interesse comercial têm que ser submetidos à clausura de sigilo. Então, as pessoas que vão analisar têm que assinar um termo de sigilo, têm que se responsabilizar, diante da Lei, de que não vão divulgar. Para isso, estamos criando um dispositivo dentro do nosso sistema para a análise daqueles projetos em que seja necessário obedecer essa cláusula. Essa é a principal adaptação que estamos fazendo”, ressalta o diretor do CNPq.

O CGEN também pretende digitalizar suas operações em breve. “O usuário, e em particular a comunidade científica, agora tem um ambiente digitalizado muito familiar que os ajuda a compreender melhor os procedimentos e a solicitar autorizações de forma mais eficiente. Aqui no CGEN tudo ainda tem que ser mandado em papel”, relata Eliana Fontes. De acordo com a diretora, em breve o Iphan também terá um sistema digitalizado. “O que estava acontecendo com o CGEN era um acúmulo de pedidos, de processos, e acredito que a vinda do Iphan vai ajudar bastante porque vai simplificar também, principalmente para os pesquisadores, que vão conseguir uma avaliação mais rápida”, opina Giselle Dupin, conselheira do CGEN.

Divulgação e entraves – Contudo, segundo Eliana Fontes, o impacto da entrada dessas instituições no processo “ainda não é significativamente perceptível”. “Está faltando uma campanha de conscientização e de informação sobre essas oportunidades. Eu acredito que ao longo deste ano é que vamos sentir em números os resultados”, aposta.

No caso de acesso ao conhecimento tradicional, Giselle Dupin alerta para o fato de que a maioria das comunidades obtém informação sobre os benefícios somente quando as empresas as contatam. “O MMA está fazendo um processo de divulgação dessas questões com oficinas de preparação da sociedade civil, principalmente a ligada a comunidades tradicionais, para que possam participar do debate, que é internacional”, relata, lembrando que algumas comunidades indígenas estão mais adiantadas e têm representantes que acompanham a discussão. “Mas em comunidades tradicionais, como as quilombolas, por exemplo, muito pouca gente está capacitada. Temos que avançar nessa divulgação”, ressalta.

Eliana Fontes informa que em 2011 o CGEN teve pedidos de 120 solicitações para bioprospecção e desenvolvimento tecnológico, incluindo pedidos de regularizações, já que existem instituições e empresas que iniciaram as atividades sem autorização prévia de um dos órgãos competentes. Em 2007, o CGEN tomou a decisão de parar de tramitar os processos de regularização, o que gerou um passivo, e esse acúmulo se junta aos novos pedidos de regulamentação.

Giselle Dupin completa que alguns desses processos sobrestados geraram repercussão, pois em certos casos o acesso foi realizado antes da Medida Provisória 2186-16/01 [legislação atual sobre gestão da biodiversidade] e o CGEN não tinha uma regulamentação para agir nessas situações. “Lidamos durante um tempo com essa repercussão negativa e estamos trabalhando para melhorar os procedimentos e torná-los mais eficiente. Mas o sistema instalado por meio da MP é naturalmente moroso, pois o CGEN se reúne uma vez por mês e são dois dias de reunião, então, nossa capacidade de emitir as autorizações é pequena”, argumenta Eliana Fontes, lembrando que, mesmo com o escoamento de pedidos para o CNPq e Iphan, produtos que vão para o mercado e contratos de repartição de benefícios ainda têm que ser anuídos pelo CGEN. “O CGEN tem passado por um amadurecimento grande e por discussões importantes, com câmaras temáticas, buscando ter mais embasamento jurídico para ter mais tranquilidade para tomar decisões”, conclui.

Reportagem de Clarissa Vasconcellos, no Jornal da Ciência/SBPC, JC e-mail 4431, publicada pelo EcoDebate, 07/02/2012

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