Relatório da ONU alerta para a pressão crescente sobre os recursos naturais
O relatório [Resilient People, Resilient Planet: A Future Worth Choosing] entregue na segunda-feira (30/1) ao secretário-geral da ONU já está sendo apresentado com o sucessor do famoso relatório Brundtland que, em 1987, se tornou um marco ao introduzir a noção de desenvolvimento sustentável no debate internacional.
Redigido a pedido de Ban Ki-moon por um grupo de 22 personalidades de “alto nível” e de diferentes esferas – entre as quais o ministro indiano do Desenvolvimento Rural, Jairam Ramesh, a ministra brasileira do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, a comissária europeia para o Clima, Connie Hedegaard, e a própria Gro Harlem Brundtland – , o documento deve colocar sob pressão política a cúpula Rio+20, que reunirá chefes de Estado e de governo entre os dias 20 e 22 de junho na cidade brasileira, e que custa a se fazer visível em uma atualidade dominada pela crise econômica e financeira. Matéria de Laurence Caramel, Le Monde
Os fatos enumerados por esse relatório de aproximadamente cem páginas deverão bastar para convencer que um desenvolvimento sustentável não é mais um ideal de contornos difusos, como era 25 anos atrás, mas sim uma necessidade urgente. Todos os anos, nas cidades da Ásia, da América do Sul e, em uma menor proporção, na África, 70 milhões de pessoas entram para a classe média – ou seja, dois bilhões até 2030 – e aspiram a um modo de vida e de consumo “ocidentalizado”.
Ao mesmo tempo, embora a pobreza tenha recuado em todo o mundo ao longo das últimas décadas, a fome continua sendo uma realidade para quase 1 bilhão de pessoas. Para satisfazer todas as necessidades, seria preciso aumentar a produção agrícola em 50% até 2030, a produção de energia em 45% e melhorar a disponibilidade de água em 30%.
Nossos modelos de desenvolvimento simplesmente não são compatíveis com os “limites” do planeta, afirma o relatório, referindo-se aos trabalhos conduzidos pelo Stockholm Resilience Center. Esse instituto de pesquisa dirigido por um especialista em recursos marinhos, Johan Rockström, propôs em 2009 um quadro que estabelece as fronteiras que não devem ser ultrapassadas para não colocar em risco o equilíbrio físico do planeta e as capacidades de renovação dos recursos naturais.
Ele estabelecia assim “um espaço de segurança” dentro do qual deveriam ser inscritas as estratégias de desenvolvimento em escala mundial. Nove limites foram definidos, entre eles: a mudança climática, a erosão da biodiversidade, a poluição química, a diminuição da camada de ozônio, o desmatamento, a disponibilidade de água potável ou ainda a acidificação dos oceanos.
Ora, para três deles – a mudança climática, a erosão da biodiversidade e a perturbação do ciclo do nitrogênio que influi, entre outras coisas, na fertilidade dos solos e na produtividade dos oceanos – , os pesquisadores acreditavam que os limites já haviam sido ultrapassados.
Em 25 anos, esses perigosos limites já mencionados pelo relatório Brundtland se tornaram uma realidade com a qual era preciso lidar. Sem isso, alertou o relatório, “corremos o risco de condenar até 3 bilhões de pessoas à pobreza”. Três vezes mais do que hoje.
Essa constatação, mais preocupante ainda quando se antecipam suas possíveis consequências, mereceria toda a atenção dos governantes. No entanto, constatam os membros do grupo de trabalho dentre os quais quase todos tiveram cargos políticos, “é difícil ser contra o princípio de desenvolvimento sustentável, mas na verdade existem poucos incentivos para colocá-lo em prática”. Isso porque “as políticas e as instituições são recompensadas por objetivos de curto prazo (…) e, para os próprios políticos, o tempo que conta é o presente.” O futuro das próximas gerações continua sendo secundário, portanto.
Então a audácia dos relatores é ainda maior, uma vez que eles propõem que a partir de 2014 seja mudado o programa de pilotagem da economia mundial, trocando aos poucos o velho produto interno bruto (PIB) por um índice de desenvolvimento sustentável levando em consideração o esgotamento dos recursos.
“A maioria dos bens e dos serviços vendidos hoje não integram corretamente o custo social e ambiental associados à sua produção”, explicam. O crescimento da forma como é definido pelo PIB não diz se esse desempenho material é obtido com a destruição ambiental ou prejudicando os funcionários, explica o relatório, citando o trabalho da Comissão sobre a Medida do Crescimento e do Progresso Social, criada em 2009 por Nicolas Sarkozy e presidido pelos economistas Joseph Stiglitz, Amartya Sen e Jean-Paul Fitoussi.
Estaria a comunidade internacional pronta para dar esse salto? Entre as 56 recomendações feitas pelo relatório, a mudança concreta de paradigma aparece como uma das grandes questões sobre as quais os governos deverão se pronunciar na Rio +20. A única que pode enfim dar uma tradução concreta para o desenvolvimento sustentável.
Tradutor: Lana Lim
Nota do EcoDebate: O relatório, no formato PDF e no original em ingês, está disponível em www.un.org/gsp
Matéria do Le Monde, no UOL Notícias.
EcoDebate, 06/02/2012
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Desenvolvimento sustentável? rararararara.