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COP17 e as mudanças climáticas: avanços lentos, artigo de Malu Nunes

 

[Valor Econômico] A COP-17 da Convenção do Clima levantou esperanças e dúvidas. Os compromissos acordados serão efetivamente assumidos pelo Brasil e pelas outras nações? E serão colocados em prática a tempo de garantir a estabilidade climática do planeta?

O principal compromisso firmado no evento da África do Sul foi a Plataforma de Durban, um roteiro para um acordo global de redução de gases de efeito estufa, que estabelece um calendário para se criar, até 2015, um instrumento legal vinculante. A grande conquista do novo acordo é que todos os países membros da Convenção do Clima (as chamadas Partes) terão metas obrigatórias a cumprir a partir de 2021 – inclusive o Brasil que, pela primeira vez na história das conferências, aceitou ter metas obrigatórias de redução de suas emissões.

Para amenizar o déficit entre 2012 – quando se encerra o primeiro período de compromisso do Protocolo de Kyoto – e 2021, também foi aprovada na COP -17 a renovação de Kyoto por mais cinco anos, até 2017. Essa foi uma solução paliativa, mas não ideal, uma vez que importantes países ficarão de fora dessa ampliação, como Estados Unidos, Rússia, Japão e Canadá.

Haverá um período longo para que as Partes comecem a ter metas obrigatórias e significativas de redução das suas emissões. O problema é que com essa espera talvez não haja tempo para evitar que o aumento da temperatura média do planeta não ultrapasse os 2º C.

Com a elevação acima desse limiar, os impactos das mudanças climáticas tendem a ser críticos: muitas espécies e ecossistemas poderão ser extintos; populações humanas sofrerão ainda mais com secas, enchentes e furacões; e países inteiros podem vir a desaparecer pela elevação do nível dos oceanos.

Portanto, não é mais possível continuar apenas discutindo, como tem sido feito desde a assinatura da Convenção do Clima, no Rio de Janeiro, em 1992. Os países – incluindo aí governos, iniciativa privada e sociedade civil – não podem apenas aguardar as definições do novo acordo. Eles precisam se antecipar e tomar providências ainda nesta década.

O que nos traz esperança é que alguns países já estão investindo maciçamente em tecnologia, migrando para uma matriz energética mais limpa e realizando outras iniciativas que os colocarão em vantagem no futuro, quando essas questões de mitigação das mudanças climáticas forem regulamentadas e se tornarem obrigatórias.

O Brasil também está caminhando para as mudanças, mas ainda de uma forma contraditória. O País estabeleceu, por meio da Política Nacional sobre Mudança do Clima, metas voluntárias de reduzir entre 36,1% e 38,9% de suas emissões projetadas até 2020, com base nos valores de 2005. Esse é um dos maiores programas do mundo de redução voluntária de emissões.

Contudo, a aprovação do projeto de lei em tramitação no Congresso Nacional que altera o Código Florestal poderá pôr tudo a perder, pois permitirá novos desmatamentos e anistiará aqueles que desmataram ilegalmente no passado. Além da perda de biodiversidade, isso deverá resultar em um aumento absurdo das emissões brasileiras de gases-estufa e na redução da captação de carbono pelas áreas que deixarão de ser restauradas.

Para poder assumir uma posição de liderança perante o mundo na questão climática, é fundamental que o País proteja as suas áreas naturais. Em vez de adaptar o Código Florestal a favor de quem não o cumpriu, é preciso favorecer aqueles que preservam e isso pode ser feito por meio de mecanismos de pagamento por serviços ambientais, a exemplo do Projeto Oásis.

Também é preciso que o país crie e mantenha unidades de conservação. Todas essas áreas naturais protegidas em terras públicas e privadas são estratégicas não só para a manutenção dos estoques de carbono, mas também para a conservação da biodiversidade, o fornecimento de serviços ambientais como produção de água, e a defesa contra os impactos das próprias mudanças climáticas.

A tendência é que conservação das florestas do Brasil e do mundo seja incorporada ao novo acordo da Convenção do Clima, já que o desmate florestal representa cerca de 17% das emissões de gases-estufa, mais do que o volume emitido por todo o transporte no planeta. O que aponta para isso são as negociações em torno dos mecanismos de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação (Redd), cuja proposta é compensar financeiramente os países em desenvolvimento por reduções voluntárias e comprovadas de suas emissões nacionais por meio da conservação de suas florestas.

Na COP-17, o Redd avançou pouco em relação ao ano passado, pois não houve definição de fontes de financiamento, mas pelo menos o tema continuou a ser discutido. Foi uma grande conquista o mundo ter acertado na COP-17 as bases para um novo acordo legalmente vinculante com participação dos Estados Unidos e todos os países que participam da Convenção do Clima. Porém, a conferência de Durban pouco adicionou em ações concretas que possam fazer com que o mundo mantenha a meta de não deixar o planeta aquecer em mais de 2º C.

Se não tomarmos cuidado e esperarmos muito para agir, podemos chegar a níveis de emissões preocupantes nos próximos anos, antes mesmo de o novo acordo entrar em vigor. O Brasil pode e deve se antecipar e fazer sua parte, e uma das principais contribuições que o país pode dar ao mundo é conservar a sua rica biodiversidade.

Malu Nunes é engenheira florestal, mestre em Conservação da Natureza e diretora executiva da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza.

Artigo em Valor Econômico e socializado pelo Jornal da Ciência / SBPC, JC e-mail 4419.

EcoDebate, 20/01/2012

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