Cimento ecológico é capaz capaz de “sequestrar” do ar as moléculas de dióxido de carbono (CO2)
O dióxido de carbono (CO2) é considerado um dos maiores vilões do aquecimento global. O aumento da emissão deste gás, especialmente pela ação do homem, vem intensificando o efeito estufa – processo que retém parte da radiação solar refletida pela superfície terrestre, fazendo com que o calor fique preso na atmosfera. Para ajudar a minimizar a emissão de CO2, uma pesquisa desenvolvida na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) propõe uma alternativa inusitada, a partir da construção civil: a fabricação de um cimento ecológico capaz de “sequestrar” do ar as moléculas de dióxido de carbono.
A ideia é desenvolver um produto que possa reduzir os impactos da indústria de cimento, que apesar de fundamental para o setor da construção civil, gera impactos ambientais negativos. “A indústria de cimento, que é um dos constituintes mais importantes do concreto, é responsável pela emissão de cerca de 5 a 7% da emissão mundial de dióxido de carbono. Só no Brasil, para cada tonelada de clínquer produzido, que é como se chama a massa crua utilizada durante a fabricação do cimento, são liberados na atmosfera pelo menos 700 kg de CO2”, justifica o Cientista do Nosso Estado da FAPERJ Romildo Dias Toledo Filho, que é coordenador do estudo e professor do Programa de Engenharia Civil da Coppe/UFRJ – o Instituto Luiz Alberto Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Para encontrar a melhor rota de aplicação da tecnologia de “sequestro” de CO2 pelo cimento ecológico, Toledo está investigando as condições físico-químicas do material cimentício durante o processo de fabricação, em testes que estão em curso no Laboratório de Estruturas e Materiais (Labest/Coppe/UFRJ). Em vez do tradicional processo de “cura” utilizado pelos fabricantes de cimento, em que o concreto, inicialmente pastoso, endurece a partir de reações químicas com a água, o professor vem aproveitando o dióxido de carbono presente no ar para causar ao endurecimento controlado do material, em uma reação química de carbonatação. “Fazemos a ‘cura’ do cimento em uma câmara com CO2, para que o gás se combine com o hidróxido de cálcio [Ca(OH)2] do material cimentício, ‘seqüestre’ o CO2 e forme carbonato de cálcio [CaCO3]”, detalha.
A próxima etapa dos experimentos, de acordo com o professor, é quantificar os benefícios da tecnologia verde. “Estamos empenhados em medir a quantidade total de CO2 que o cimento ecológico é capaz de resgatar do ar nos testes laboratoriais. Essa quantidade depende dos vários fatores que estamos analisando, como a composição do cimento e o melhor momento para promover o processo de ‘cura’ durante a fabricação”, explica Toledo, acrescentando que o “sequestro” de CO2 começa assim que a pasta de cimento é colocada na câmara de gás, que tem um metro cúbico de volume interno, e pode levar algumas horas ou mesmo alguns dias, dependendo da composição.
Cimento feito com fibras naturais
Outro objetivo do projeto é aproveitar fibras naturais para a fabricação do cimento ecológico. Além de desenvolver cimentos capazes de ‘sequestrar’ o CO2 do ar, o professor Romildo Dias Toledo Filho pesquisa processos de fabricação de cimentos reforçados por fibras curtas de coco, sisal, juta e curauá. “Algumas fibras são mais resistentes que outras devido a composições químicas diferentes, por isso estamos testando aquelas que podem gerar, no futuro, melhores produtos”, destaca. Para Toledo, o uso de fibras naturais como matéria-prima para a produção do cimento pode elevar o potencial de sustentabilidade do material. “Ao optar pelo uso de fibras naturais, a quantidade de cimento que seria originalmente utilizada na composição do material é reduzida, o que pode ajudar a diminuir a emissão de CO2 durante a fabricação do produto”, diz.
Ao lado dos benefícios para o meio ambiente, o uso de fibras naturais no cimento teria impactos sociais positivos para o estado do Rio de Janeiro. O uso de fibras de coco na indústria de cimento, por exemplo, poderia movimentar a economia da região de Quissamã, no norte fluminense, reconhecida como a maior produtora de coco do estado. “O uso racional da fibra de coco como reforço ao cimento pode gerar renda e também contribuir para minimizar o problema ambiental da deposição de casca do fruto em aterros sanitários, que gera metano, outro gás responsável pelo aquecimento global”, destaca.
Segundo o professor, o concreto é, de longe, o material de construção mais utilizado no planeta. O desafio é agregar valor ao produto, criando concretos para o desenvolvimento sustentável. “Em países emergentes, como o Brasil, Rússia, China e Índia, com forte crescimento econômico, a demanda pelo uso de concreto é grande. Nenhum outro material poderá, tão cedo, substituí-lo. Daí a necessidade de criar alternativas sustentáveis para o produto”, conclui. O estudo rendeu a publicação de artigos em revistas científicas internacionais, como a Cement and concrete composites e Cement and concret research.
Sobre o cimento
Uma das mais antigas evidências de uso do cimento está nas pirâmides do Egito. Para erguer as suntuosas pirâmides, os egípcios desenvolveram um tipo de cimento fabricado através de uma mistura de gesso calcinado. Já na Roma Antiga, há cerca de dois mil anos, surgiu o termo latino caementu, palavra que deu origem ao termo “cimento” utilizado hoje. O químico e pedreiro britânico Joseph Aspdin foi o primeiro a fabricar o cimento artificial, produzido com metodologia científica. Ele o batizou como “cimento Portland”, em referência à Portlandstone, pedra arenosa usada em construções na região de Portland, Inglaterra. Em geral, a fabricação do produto leva em conta quatro matérias-primas: argila, calcário (tipo de rocha sedimentar encontrada abundantemente na crosta terrestre), minério de ferro e gesso.
Reportagem de Débora Motta, da FAPERJ, publicada pelo EcoDebate, 31/10/2011
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