Produtividade da Agricultura Brasileira e o Código Florestal, artigo de Laura B. Antoniazzi
[EcoDebate] É natural que temas polêmicos como a atual reforma do Código Florestal gere comoção e defesas acaloradas de vários lados. Mesmo sendo um assunto de difícil compreensão em suas especificidades técnicas, todo mundo parece ter uma opinião contra ou a favor da reforma, defendendo as florestas ou a produção agrícola.
De fato, alguns dos principais argumentos a favor de um ou de outro lado, quando levados ao extremo e sem considerar os senões, acabam se tornando extremamente atraentes. Quem seria contra a defesa das nossas florestas, que já foram tão devastadas e que abrigam uma infinidade de funções ecológicas fundamentais? E quem poderia ser contra a produção de alimentos para atender à população brasileira e mundial?
O fato é que para obter o chamado equilíbrio entre produção e conservação é preciso fazer escolhas e passar por um amplo processo de negociação entre diversos grupos de interesse. Entretanto, quase sempre, argumentos radicais pouco contribuem para encontrar uma solução equilibrada. E pior do que argumentos radicais são argumentos falsos e tendenciosos.
Sim, é verdade que o setor agrícola do Brasil quer que o novo Código Florestal: 1- regularize a situação ambiental de grande parte dos produtores e 2-defina regras claras que possibilitem a expansão das atividades agrosilvopastoris, como apontado por Gerson Teixeira em artigo publicado no Ecodebate em 16 de junho. No entanto, o argumento de que a agricultura brasileira é ineficiente e apresenta baixos índices de produtividade comparados ao restante do mundo é uma inverdade. Claro que se isso fosse verdade, ajudaria muito a defesa da não necessidade de reforma do Código e da ocupação de novas áreas, afinal, “apenas” com o aumento da produtividade da agricultura já seria possível aumentar a produção agrícola.
Não é preciso entender muito de agronomia para perceber que a agropecuária brasileira apresenta sim produtividade alta e crescente, mas vale a pena relembrar o conceito base do termo produtividade. O termo é usado popularmente para se referir à produtividade da terra e, assim, pode ser expresso em quantidade produzida por área (por exemplo, kg/ha), mas se refere de uma maneira geral a eficiência produtiva ao usar qualquer fator de produção (terra, insumos, capital, mão-de-obra). Para se obter ganhos de produtividade é necessário uma combinação de práticas de manejo e insumos de qualidade (sementes, defensivos, fertilizantes, maquinário, etc, aliada as condições climáticas).
A alta produtividade da soja no Brasil é resultado de muitos fatores: décadas de pesquisa agronômica que gerou variedades adaptadas ao clima tropical, aplicação de corretivos nos solos ácidos do Cerrado, técnica do plantio direto, defensivos para combater pragas e doenças, entre outros.
Para comparar a produtividade da agricultura brasileira com de outros países, é preciso adotar como parâmetros as principais culturas produzidas e países que também sejam grandes produtores. Isto porque não é relevante para a discussão global de produtividade da agropecuária brasileira o fato de que somos o campeão de produtividade em goiaba (cultura que ocupa míseros 15 mil hectares). Da mesma forma como não faz sentido algum comparar a produtividade do arroz do Brasil com o da Somália, dado que a diferença de área plantada é gritante: 2,8 milhões de ha no Brasil contra menos de 4 mil ha na Somália.
Seguindo essa premissa, as culturas selecionadas deveriam ser soja, milho, arroz, feijão, cana-de-açúcar, algodão e eucalipto que, juntas, ocupam mais de 90% da área agrícola do País. Usando os mesmos dados da FAO para soja, milho, arroz e trigo, como proposto por Gerson Teixeira, calculamos as médias de produtividade dos últimos três anos, para evitar pontos fora da tendência, dado que a produtividade pode ser afetada por clima e outras intempéries. Também foi calculada a taxa de crescimento da produtividade de 1990 até 2009, a fim de avaliar a evolução desta no tempo.
O Brasil é o segundo maior produtor mundial de soja e, entre os 10 maiores produtores, está atrás apenas dos Estados Unidos em produtividade, sendo a diferença praticamente irrisória, 2,76 e 2,81 ton/ha, respectivamente. Entre os principais produtores, o Brasil foi aquele que apresentou maior taxa de crescimento de produtividade, alcançando 2,1% ao ano nos últimos 20 anos.
Na produção de milho, o Brasil se situa na terceira posição mundial, mas bem atrás de Estados Unidos e China. E se a produtividade brasileira ocupa apenas a 8ª posição entre os 10 principais produtores, está em 3º na taxa de crescimento da produtividade, que apresentou incremento anual médio de 3,6%. Com certeza, muito avanço em termos de ganho de produtividade de milho é desejado – e previsto- no País, e nesse sentido vale mencionar que grande parte da sua produção é conduzida por agricultores pouco tecnificados que ainda precisam incorporar tecnologia e ter acesso a recursos para investir em produção eficiente. A partir dos dados do ultimo Censo Agropecuário, verifica-se que enquanto a produtividade média do milho nas propriedades de até 20 ha é de 2,8 ton/ha, esse número atinge 4,5 ton/ha nas propriedades acima de 500 ha.
Quanto à produtividade do arroz, base da alimentação no Brasil e em grande parte dos países em desenvolvimento, estamos posicionados em 5º lugar entre os principais produtores mundiais e, dentre estes, apresentamos a maior taxa de crescimento de produtividade nos últimos 20 anos. Aqui vale destacar o brilhante trabalho de pesquisa e extensão rural do Instituto Riograndense do Arroz (IRGA), principal estado produtor, que vem conseguindo obter ganhos expressivos de produtividade, com perspectivas de manter a tendência de crescimento nos próximos anos.
Por fim, o Brasil não está entre os maiores produtores de trigo, mas sua produtividade é próxima a vários desses, 2,3 ton/ha. E merece destaque a taxa de crescimento da produtividade, de 2,7% ao ano nos últimos 20 anos, maior que a taxa de todos os principais produtores. Outro ponto fundamental é que o trigo no Brasil é uma cultura de inverno, ou segunda safra, assim como grande parte da produção de milho. Isso significa que a produtividade nesses casos deveria ser considerada somando a produção da primeira safra.
A agricultura brasileira é eficiente e tem muitas vantagens comparativas, não só pelo clima tropical como pelo sistema produtivo e gestão empresarial. Não seria a toa que o País ganha espaço no mercado internacional e é consagrado por diversos artigos de renome na imprensa e de organizações internacionais. Negar a eficiência produtiva da agricultura brasileira é fechar os olhos para os fatos.
Se não fosse o forte incremento de produtividade nos últimos 20 anos, certamente a área plantada seria muito maior. E a busca para incrementar a produtividade é uma meta constante no agro brasileiro. Mesmo aqueles que lutam por mudanças estruturais nos sistemas produtivos agrícolas do País deveriam reconhecer sua eficiência e buscar outros pontos fracos para combatê-los.
Laura B Antoniazzi é Pesquisadora da área de sustentabilidade do ICONE e da RedeAgro
Nota do EcoDebate: Este artigo debate os conceitos apresentados em ‘Código Florestal e a ineficiência do agronegócio, artigo de Gerson Teixeira‘
EcoDebate, 27/06/2011
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Por favor, não utilizem o argumento de que vai faltar comida se não avançarmos sobre o meio ambiente. Muito antes disso temos que parar de plantar comida para alimentar tanques de combustível. A discussão real no novo código é sobre dinheiro.
A verdade é que o momento atual representa uma glória para o GRANDE CAPITAL do HEMISFÉRIO NORTE. Eles tiveram êxito na implantação da polêmica ruralista x ambientalista.
Até agora nenhum “especialista” entendeu ou comentou que a estratégia de subsídios e barreiras tarifárias agrícolas dos yankees encontra ameaças no próprio liberalismo (lei da oferta/procura): não há mais produto para “ESPREMER” do hemisfério sul, fato que já está encarecendo muito suas políticas protecionistas e nacionalistas. Mesmo dispositivos de deflação de preços, tais como Bolsa de Chicago, não estão funcionando mais a contento.
Os burgueses e pequenos burgueses ruralistas do hemisfério sul caíram na falsa polêmica ambiental “plantada”: ao invés aproveitarem a questão para lutarem contra o subsídios e barreiras de importação de forma enérgica, apoiando-se na falta de terras e nas restrições ambientais, polarizam com ambientalistas, que poderiam ser ferramenta útil na argumentação da “sustentável” contra o subsídio.
Um capital poderoso, aliado a lideranças teatrais, como Kátia Abreu e Aldo Rebelo – um representando a direita e outro a esquerda, completam a construção do sofisma.
Enquanto isso, o estado brasileiro, através de sua OMISSÃO DECLARADA, aproveita os assassinatos causados pela falsa polêmica para HIGIENIZAR o norte do país da presença de proletárias ambientalistas, já que são um entrave a seus projetos energéticos e desenvolvimentistas.