Prostituição, escravidão e morte marcam brasileiras vítimas do tráfico de pessoas
Infográfico no Correio Braziliense
Cerca de 30% dos assassinatos de brasileiros fora do país estão relacionados ao tráfico de pessoas, orquestrado basicamente por organizações vinculadas à prostituição. Em vários casos, há a simulação de suicídio
O convite chegou por uma amiga. Viver no exterior, ganhar em euros, mudar de vida… Quem sabe até se casar. Toparam Fátima, Socorro, Verônica, Iulsa e milhares de brasileiras recrutadas anualmente pelas máfias especializadas em tráfico de pessoas. Não há uma estimativa do número de mulheres levadas ao exterior para fins de exploração sexual. O que se sabe é que as organizações estão cada vez mais violentas. E fazendo cada vez mais vítimas. Reportagem de Alana Rizzo, no Correio Braziliense.
Vinte brasileiras estão desaparecidas em países europeus. A principal suspeita é de que tenham sido assassinadas pelos grupos organizados. O paradeiro delas é totalmente desconhecido há pelo menos quatro anos. Diversas tentativas de localização, inclusive das polícias brasileiras e internacionais, foram feitas sem sucesso.
Em média, 30% das mortes de brasileiros no exterior estão relacionadas ao tráfico de pessoas. A maioria das vítimas são mulheres que, fora do país, trabalham como prostitutas. Têm entre 18 e 35 anos e não passaram do ensino fundamental. São de famílias de baixa renda e já desembarcam endividadas com os patrões. Precisam se submeter a uma rotina exaustiva de violência sexual e psicológica para pagar a viagem, a hospedagem e a alimentação.
“As investigações mostram que as quadrilhas estão se aprimorando. Algumas mulheres não aguentam a escravidão a que são submetidas. Tentam fugir e são mortas. Outras são assassinadas como uma espécie de queima de arquivo mesmo. Sabem como funcionam aquela rede e estão dispostas a denunciar”, explica o assessor de Relações Internacionais do estado de Goiás, Elie Chidiac, estado de origem das vítimas e da maioria das mulheres traficadas no país.
Para despistar, as organizações criminosas tentam maquiar os crimes levantando hipóteses de suicídio e de assassinato cometido por companheiros das vítimas. Isso ocorreu no início do ano com Magda Silva, morta no interior de São Paulo, e com uma goiana encontrada sem vida em Portugal há duas semanas. A família, que preferiu não se identificar, não acredita que a mulher de 35 anos e mãe de dois filhos no Brasil tenha se enforcado.
No ano passado, quatro brasileiras foram mortas no exterior. Uma delas, Veronica Crosati, foi esfaqueada dentro de casa na Itália. A garota de programa já tinha procurado organizações não governamentais que prestam assistência às mulheres vítimas da prostituição no exterior. Depois de anos de escravidão, queria denunciar seus algozes.
Monitoradas
No Brasil, os aliciadores, além de identificarem o potencial das mulheres, têm entre suas atribuições o monitoramento das garotas que retornam ao país. Letícia Peres Mourão saiu de Goiás rumo à Espanha. Dividiu oito anos em pelo menos três cidades — Barcelona, Vilanova y La Geltrú e Tarragona. Ela denunciou o horror enfrentado nos bordéis e voltou ao Brasil em dezembro de 2008. Mudou-se para o Guará (DF), onde foi assassinada. Ficou comprovado nas investigações que o crime ocorreu a mando de uma organização criminosa dona de seis prostíbulos na Espanha.
Apesar do número de brasileiras vivendo em outros países, a Secretaria de Políticas para Mulheres não mantém canal de denúncia ou mesmo um programa de atendimento a esse público. Segundo o órgão, o Ministério das Relações Exteriores é responsável pelas brasileiras no exterior, inclusive pelos casos de morte ou desaparecimento. No ano passado, a Polícia Federal abriu 76 inquéritos para investigar o tráfico de pessoas no Brasil.
EcoDebate, 20/04/2011
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