Calamidade, artigo de Nelson Tembra
[EcoDebate] O pior é que essas catástrofes estão se tornando rotina, considerando que não é a primeira vez que ocorrem, pois, dentre outros, temos o exemplo recente de Angra dos Reis, quando as fortes chuvas dos últimos dias de 2009 transformaram num cenário trágico um dos principais paraísos turísticos do Estado do Rio. O deslizamento de uma encosta atingiu uma pousada e sete casas na Ilha Grande, na baía de Angra dos Reis, matando pelo menos dezenove pessoas. No continente, outras onze pessoas morreram em outro desmoronamento de terra, no Morro da Carioca, no centro histórico da cidade, totalizando em pelo menos trinta o número de vítimas fatais da tragédia. Como a omissão e o pouco caso do poder público persistem, hoje temos esse número multiplicado por mais de dez vezes. Provavelmente, no ano de 2012, teremos mais de quatro mil vítimas fatais.
É lógico que o Estado e os municípios do Rio de Janeiro atingidos pelas enchentes e desmoronamentos possuem legislação específica, como lei de parcelamento do solo, código de postura e legislação ambiental, etc, que, se fossem devidamente cumpridas, tal catástrofe não traria como resultado tantas mortes.
Não é novidade que o desmoronamento é um fenômeno provocado pelo escorregamento de materiais sólidos, como solos, rochas, vegetação e/ou material de construção ao longo de terrenos inclinados, denominados de “encostas”, “pendentes” ou “escarpas”.
Os deslizamentos em encostas e morros urbanos vêm ocorrendo com uma freqüência alarmante nestes últimos anos, devido ao crescimento desordenado das cidades, com a ocupação de novas áreas de risco, principalmente pela população mais carente.
Há que considerar três fatores de influência na ocorrência dos deslizamentos: 1) tipo de solo – sua constituição, granulometria e nível de coesão; 2) declividade da encosta – cujo grau define o ângulo de repouso, em função do peso das camadas, da granulometria e nível de coesão; 3) água de embebição – que contribui para aumentar o peso específico das camadas e reduzir o nível de coesão e o atrito, responsáveis pela consistência do solo, e lubrificar as superfícies de deslizamento.
A época de ocorrência dos deslizamentos coincide com o período das chuvas intensas e prolongadas, visto que as águas escoadas e infiltradas vão desestabilizar as encostas. Nos morros, os terrenos são sempre inclinados e, quando a água entra na terra, pode acontecer um deslizamento e destruir as casas e tudo que estiver embaixo.
Depois da “porta arrombada” as autoridades aparecem, fazem sobrevôos nas áreas afetadas e alocam recursos para “curar” aquilo que deveria ter sido prevenido. A grande questão é que, para remover as pessoas instaladas em edificações nestas áreas de risco, haveria necessidade de indenizar tais benfeitorias, e quando a solução mexe nos bolsos ou nos cofres é que a coisa pega, pois os políticos sempre irão dizer que não existe recurso para isso. E nem espaço físico no Instituto Médico Legal para comportar tantos cadáveres.
* Nelson Tembra, Eng. Agrônomo, é colaborador do EcoDebate.
EcoDebate, 14/01/2011
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