Cinco bilhões de habitantes em 70 anos, artigo de José Eustáquio Diniz Alves
[EcoDebate] A humanidade gastou um tempo enorme para chegar a 2,5 bilhões de habitantes, no ano de 1950. Mas chegou a 5 bilhões em 1987 e deve chegar a 7,5 bilhões em 2020, segundo dados da divisão de população das Nações Unidas. Ou seja, em apenas 70 anos, o mundo terá acrescentado 5 bilhões de habitantes, o dobro alcançado em milhões de anos de evolução da raça humana.
Em parte este alto crescimento demográfico pode ser comemorado, pois o aumento do número de habitantes veio acompanhado do aumento da esperança de vida ao nascer (que na média mundial era de 46 anos em 1950 e de 68 anos em 2010), do aumento médio da renda per capita, da redução do percentual da população que passa fome, das melhorias dos níveis educacionais e das condições de moradia, etc. Embora ainda exista muita desigualdade no mundo, houve melhoras nas condições gerais de vida. A taxa de pobreza extrema do mundo deve se reduzir pela metade, entre 1990 e 2015, se os Objetivos do Desenvolvimento do Milênio forem realmente alcançados.
Mas o “sucesso” do crescimento demográfico se deu às custas de uma grande pressão sobre o meio ambiente, com aumento dos gases poluentes, redução das reservas de recursos naturais e a diminuição da biodiversidade. Para que a humanidade aumentasse em tamanho e em nível de consumo, muitas espécies de plantas e animais pagaram com a própria extinção. Mas a poluição e o empobrecimento da biosfera não entram nos cálculos do Produto Interno Bruto.
Além disto, o crescimento da população, da produção e do consumo estão ameaçando a vida no planeta com a redução das florestas e das fontes de água potável, o crescimento da seca e das áreas dessertificadas, a acidez do solo e das águas e o aquecimento global que pode tornar inviável a existência humana na Terra.
A revolução verde (aumento da produção de alimentos) e o avanço tecnológico evitaram que o crescimento populacional fosse acompanhado de aumento das taxas de mortalidade. Por exemplo, a construção da represa de Assuã, na Egito, criou no alto Nilo, um reservatório de 43 milhões de m³ de água, capaz de garantir uma vazão máxima de 11 mil m³ por segundo e de gerar a produção de 2,1 gigawatts de energia.
A represa de Assuã entrou em operação em 1967 e gerava mais de 50% de toda a energia elétrica do Egito e abastecia a produção irrigada de alimentos ao longo do rio, que é a base da vida do país. Em 1967 a população do Egito era de 33 milhões de habitantes. Em 2010, com uma população de 85 milhões de habitantes, a represa produz apenas 10% da energia necessária e a vazão da água do reservatório não é capaz de garantir a irrigação das áreas agricultáveis e atender às necessidades do consumo pessoal e econômico do país. O Egito vive uma grande escassez de água e energia para as suas dimensões demográficas atuais. Considerando as dimensões populacionais para as próximas décadas (130 milhões de habitantes em 2050) o cenário é sombrio, se não forem criados, por exemplo, maneiras de aproveitar a riqueza dos ventos e do sol do deserto.
Bangladesh é outro caso de degradação das condições ambientais devido à alta densidade demográfica. O país do sul da Ásia tem poucas elevações acima do nível do mar e possui uma grande planície cortada pelo delta dos rios Ganges, Brahmaputra e Meghna e seus afluentes. O aproveitamento das terras férteis de aluvião para a plantação de arroz e de outros produtos possibilitou o crescimento da população de 43 milhões em 1950 para 165 milhões em 2010, com projeção para alcançar 222 milhões, em 2050. Este crescimento populacional de 5 vezes, em 100 anos, tem gerado grande inseguraça alimentar. Para piorar a situação, a elevação do nível do mar, em um país com uma das mais altas densidades demográficas do mundo, reduz a disponibilidade de água potável e saliniza as terras agrícolas. Até 2050, cerca de 25 milhões de pessoas poderão ser desalojadas pelos efeitos do aquecimento global, aumentando as estatísticas dos “deslocados e refugiados climáticos”.
Estes e outros exemplos vão ser objetos de discussão na Conferência das Nações Unidas sobre desenvolvimento sustentável, Rio + 20, que acontecerá em maio de 2012. O capítulo 5 da Agenda 21, da Rio/92, já reconhecia que “O crescimento da população mundial e da produção, associado a padrões não sustentáveis de consumo, aplica uma pressão cada vez mais intensa sobre as condições que tem nosso planeta de sustentar a vida”.
Portanto, as questões da dinâmica demográfica não podem ficar de fora da discussão sobre a Economia Verde e Inclusiva que vai ser o tema central da Rio + 20. A humanidade precisa encontrar maneiras de se auto-regular e de reinventar sua organização social e econômica, garantindo a convivência harmônica com todas as formas de vida da Terra.
José Eustáquio Diniz Alves, colunista do EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE. As opiniões deste artigo são do autor e não refletem necessariamente aquelas da instituição. E-mail: jed_alves{at}yahoo.com.br
EcoDebate, 10/01/2011
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