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RJ: Viveiros de mudas de Mata Atlântica produzem metade do que podem

Um estudo que acaba de ser concluído mostra que a indústria da restauração florestal do Estado do Rio funciona de maneira precária, quase uma abstração em comparação com a situação de estados vizinhos, como São Paulo e Minas Gerais. Os 92 municípios fluminenses contam hoje com 70 viveiros de mudas de Mata Atlântica que produzem metade do que poderiam -cerca de 5 milhões de mudas anuais, quando a capacidade instalada é de 10 milhões. E para que o Rio cumpra a meta de plantar 24 milhões de mudas até os Jogos de 2016, seriam necessários investimentos de R$ 22 milhões por ano na cadeia produtiva do reflorestamento, segundo levantamento da ONG Instituto Terra de Preservação Ambiental (ITPA). Reportagem em O Globo.

Estas são algumas das informações que têm como base o documento recém-concluído “Diagnóstico da rede de viveiros e coletores de sementes do Estado do Rio de Janeiro”, uma realização da Secretaria Estadual do Ambiente (SEA), do Instituto Terra, do Instituto Bio Atlântica (IBio) e da Flora Jr., empresa que presta serviços de consultoria, ligada à Universidade Federal Rural Fluminense (UFRRJ). Durante dois meses, engenheiros florestais e técnicos ambientais percorreram todo o estado com o objetivo de mapear a situação dos viveiros. O resultado não foi animador. O documento deve estar à disposição do público em breve, no site da secretaria.

É na hora de transformar a escassa produção em plantio que a fragilidade da cadeia verde fica evidente: foram plantadas 1,1 milhão de mudas no estado em 2010, de acordo com o Programa Contador de Árvores da Mata Atlântica, uma parceria entre a Secretaria do Ambiente e o Instituto Terra. A conta é tão simples quanto dramática: se o estado seguir nesse ritmo de plantar cerca de 1 milhão de mudas por ano, será impossível cumprir a meta de 24 milhões nos próximos seis anos. O Contador de Árvores trabalha com base em formulários que são enviados para prefeituras, empresas e ONGs, que assinam e se comprometem com a veracidade do dado de plantio apresentado.

Secretário executivo do Instituto Terra, Maurício Ruiz acredita que,para além da questão quantitativa, o maior desafio é aumentar a biodiversidade das espécies produzidas nos viveiros flumineses. Com uma cadeia mais estruturada, ele acredita, o preço médio das mudas deve despencar. No Rio, mostra o diagnóstico, o custo de restauração por hectare é mais elevado do que em São Paulo, por exemplo. O relatório informa ainda que uma muda no Rio custa, em média, R$ 1,70. A mesma muda sai por R$ 0,80 em São Paulo.

– Há uma má distribuição e falta de biodiversidade de mudas. Só um viveiro, da Biovert, em Silva Jardim, tem capacidade para 3 milhões de mudas por ano, respondendo por mais da metade da produção estadual. Só que o empreendimento não tem o perfil de restauração, produz mais para finalidades paisagísticas – ressalta Ruiz. – Temos uma demanda muito maior que a oferta. E uma oferta de baixa qualidade – resume.

Para Ruiz, o mercado de restauração florestal precisa se estruturar com mais rapidez. Ele elogia a posição dos atuais do-nos de viveiros de mudas:

– Uma mudança de paradigma vai demandar um planejamento muito grande e investimentos pesados. Os R$ 22 milhões anuais são um cálculo nosso, com base na demanda por hectare. Mas tudo depende de vontade política. O estado e as prefeituras têm de investir mais em restauração florestal. Os atuais produtores fazem quase que um milagre diante da falta de informações e incentivo.

O engenheiro ambiental Beto Mesquita, diretor-executivo do IBio, concorda que o maior gargalo ambiental fluminense está na falta diversidade e qualidade de mudas.

– Não adianta um viveiro ter 70 ou 80 espécies diferentes se 60% destas mudas forem de um mesmo grupo.

Também precisamos evoluir no controle fitossanitário das mudas. Todos os cuidados no plantio não significarão nada se trabalharmos com mudas doentes ou com estado nutricional debilitado – ob-serva Mesquita. O estudo mostra que, em média, um viveiro produz 30 espécies de mudas diferentes, quando o ideal é entre 50 e 70.

Outra questão preocupante: apenas cinco dos 70 hortos contam com o Registro Nacional de Sementes e Mudas (Renasem), conferido pelo Ministério da Agricultura. São eles:

Biovert Florestal Agrícola LTDA (Silva Jardim); Mudas Katsumoto (Petrópolis); Rio Mudas (Cachoeira de Macacu); Fazenda Queira Deus (Miracema); e Viveiro Ita Mudas (Bom Jesus de Itabapoana). Nas visitas as hortos, os fiscais detectaram que muitos donos sequer conheciam a lei federal de sementes, que estabelece a obrigatoriedade do registro.

A colheita de sementes, acrescenta o diagnóstico,é concentrada em alguns fragmentos de Mata Atlântica e comprada de outros estados. Por trás dessa questão está um problema de difícil solução: setores do ambientalismo defendem que as unidades de conservação de preservação integral são intocáveis, não podendo coexistir com a presença humana. E essas áreas não podem ser desprezadas, uma vez que abrigam as sementes e espécies de maior qualidade.

– Existem no Rio unidades de conservação integral onde não pode haver coleta de sementes. Há normas legais que impedem. Sou contrária a essa proibição – diz a secretária estadual do Ambiente, Marilene Ramos.

De acordo com a secretária, que deve assumir a presidência do Instituto Estadual do Ambiente (Inea) com a volta de Carlos Minc ao comando da SEA, o trabalho recém-concluído é um preparatório para o planejamento de como o Rio conseguirá cumprir a meta olímpica. Segundo ela, dinheiro não será problema: o governo já tem à disposição mais de R$ 200 milhões, vindos de empreendimentos com obrigações de compensações ambientais. Além disso, o Fundo Mata Atlântica, criado no início do ano pelo governo estadual, dispõe de R$ 37 milhões.

– O diagnóstico mostrou que temos um número razoável de hortos, mas a grande parte deles tem problemas sérios de estrutura e baixa qualidade de produção. O inventário jogou luz sobre uma série de entraves burocráticos e legais que temos – afirma Marilene. -Os nossos cinco hortos estaduais têm uma capacidade de produção baixa, de 500 mil mudas por ano. A ideia é que eles produzam, ao fim de 2011, 4 milhões de mudas/ano. Estamos trabalhando para isso.

Marilene Ramos critica o que chama de “sistema de regulamentação extremamente burocrático”, ao se referir ao baixo número de viveiros registrados pelo governo federal.

– Temos que remover esse entulho burocrático -diz. – Há muito a ser feito,mas esse mapeamento é o pontapé inicial.

A bióloga Alba Simon, que reassume a Superintendência de Biodiversidade da SEA em janeiro, alerta que é preciso formatar uma política ampla, que abarque todos os setores da cadeia produtiva das mudas:

-Hoje o estado do Rio tem uma demanda absurda por reflorestamento. O gargalo só vai ser resolvido quando houver uma política florestal de fato, que pense a cadeia como um todo. Desde a capacitação de coletores de mudas até a estruturação dos viveiros. Enquanto pensarmos em setores isolados, não vai funcionar – afirma Alba, acrescentando que o Rio prepara seu próprio inventário florestal.

EcoDebate, 30/12/2010


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