O Entorno da Reserva Extrativista da Chapada Limpa, artigo de Mayron Régis
[EcoDebate] Ao se aproximarem, sobrevivia uma impressão de que tudo parara em cima da Chapada. O senhor Manoel do Baturité, do assentamento Baturité e do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Chapadinha, Baixo Parnaiba maranhense, prontamente desfez essa impressão. A visão do homem esbarra em vários bacurizeiros – abraçados com centenas de bacuris ou apenas acobertando o solo da Chapada com seus troncos, suas raízes e com suas folhas que descem aos borbotões quando o inverno desaba.
O Nambum-Perdiz, espécie ameaçada de extinção, gorjeava em algum ponto da Chapada. O senhor Manoel soltou vários comentários sobre essa espécie de ave: que ela é difícil de caçar, que quando se queima a Chapada ela se aquieta para que ninguém a veja e que ela come cupim.
Nessa parte da Chapada, entre os municípios de Chapadinha e Afonso Cunha, as comunidades da Vila Borges, do Veredão e do Guarimã, nos meses de janeiro, fevereiro, março e abril, priorizam a coleta dos bacuris caídos a partir das primeiras grandes chuvas. As comunidades do Caboclo e da Santa Fé desvelavam os bacuris do final da Chapada e ali se apanhava muitos bacuris em todas as safras.
Para onde foram desterrados os bacurizeiros do Caboclo e da Santa Fé? Na área da Vila Borges que desponta para a Mangueira, para o Veredão, para o Leite, para o Guarimã e para a Vila Pandoca,os bacurizeiros espalham seus frutos por todos os galhos e por todas as alturas.
Os bacurizeiros do Caboclo e da Santa Fé desapareceram da Chapada e reduziram-se a meros fragmentos pífios por força do desmatamento realizado por um sojicultor nos anos de 2007 e 2008., também conhecido como o “Japonês”. A monocultura de soja desamparou essa passagem da Chapada e nesse trecho se conclui que a soja, como outras monoculturas, compete com o Cerrado para ver quem pode mais e para ver quem pode menos.
Os plantadores de soja se comprazem nessa prática daquele que pode mais contra aqueles que podem menos como no caso do desmatamento desse trecho da Chapada,
entre as comunidades de Macajuba, Caboclo e Santa Fé. Eles se apoderam de trechos da Chapada com dinheiro dos bancos, com documentação de compra das terras e com a licença do órgão ambiental para o desmatamento.
As histórias de compra ilegal de terras no Baixo Parnaiba são públicas e são notórias. Só mesmo um gênio da lâmpada para prever que nos anos 90 viriam grileiros para arrastar áreas de Chapada e vender para empresas ou agricultores do sul do Brasil.
Quem detinha terras nos anos 70 e anos 80 detinha uma parte do Baixão e uma parte menor da Chapada. Supunha-se que os valores simbólicos e políticos se
sobrepunham aos valores econômicos. Os anos 90 vieram provar o contrário.
Os sojicultores se interessavam pela Chapada. Quanto ao Baixão, eles nem se ligavam. Contudo, não existia um documento para o Baixão e outro para a Chapada. Era um documento só. Por isso eles precisavam e precisam do cartório que separa a parte do Baixão da parte de Chapada e engole as terras devolutas que tiverem por perto. Daí nasce um documento com toda pinta de legal. A documentação de compra da terra só esclarece os valores pagos e a dimensão da área comprada. Os sojicultores não compram as pessoas que moram na propriedade e nem compram os bacurizeiros ou os babaçuais que são percorridos por um mundo de gente durante as suas safras. O espírito do capitalismo moderno do “me largue de mão” ou “me deixe em paz com meus negócios” recende bastante das atitudes e da postura dos plantadores de soja nos Cerrados maranhenses. (Enquanto o espirito moderno do capitalismo vagueia p elas áreas de Chapada, o espirito antiquado do capitalismo na pessoa do senhor Chico Furtado quer expulsar a comunidade de Caboclo e plantar capim. Mesmo que pague uma suposta indenização aos moradores, como valorar a água, os cocos babaçu e os buritizeiros que assistem os moradores da comunidade de Caboclo?)
Na época, ninguém se atentou, mas o desmatamento ocorreu no entorno da reserva extrativista da Chapada Limpa. De posse dessa informação a comunidade de Santa Fé requisita uma vistoria do Instituto Chico Mendes e do Ibama para que estes órgãos averigúem os danos causados pelo desmatamento de espécies protegidas por lei, pela queima dessas espécies nos fornos da Margusa e pelo plantio da soja. As comunidades de Santa Fé, Caboclo, Guarimã e Vila Borges também requerem que esses órgãos realizem ações direcionadas exclusivamente para a área de entorno da reserva da Chapada Limpa.
Mayron Régis, jornalista e Assessor do Fórum Carajás, é articulista do EcoDebate.
EcoDebate, 30/12/2010
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