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Financial Times afirma que avanço do biocombustível de segunda geração ainda é ‘cenário distante’

As dificuldades no processo de desenvolvimento de tecnologias para novos tipos de combustíveis e as dúvidas sobre quando serão comercialmente viáveis motivaram mais uma reportagem na imprensa internacional, em seguida ao texto da revista Science que Inovação destacou na edição passada.

Desta vez, o desapontamento com a demora na chegada ao mercado dos biocombustíveis de segunda geração — como o etanol celulósico — apareceu em “Biofuels: Alternative fuels fail to live up to the hype” (Biocombustíveis: combustíveis alternativos decepcionam no cumprimento de expectativas geradas pela propaganda exagerada, em tradução livre) do jornal britânico Financial Times. O texto de autoria de Ed Crooks, publicado em 12 de setembro, destaca a procura por diferentes matérias-primas — até mesmo fraldas usadas convertidas em diesel — para a produção de combustíveis para o futuro.

[Leia na íntegra]Por muitas décadas, afirma o texto, a demanda por combustíveis líquidos continuará sendo uma realidade, principalmente nos transportes. Grande parte dos derivados de origem fóssil será substituída pelos biocombustíveis, afirma o jornalista do FT, já que as reservas de óleo são finitas e há uma pressão pela redução na emissão de dióxido de carbono. No entanto, prossegue o argumento do jornal econômico, para desempenharem um papel importante na matriz energética do futuro, os biocombustíveis terão de ser diferentes dos disponíveis atualmente. “Biocombustíveis de primeira geração, como etanol de milho e açúcar, e biodiesel de óleos vegetais são bem aceitos atualmente em muitos países desenvolvidos, frequentemente apoiados por generosos subsídios e regulamentos incentivadores, mas suas desvantagens têm se tornado cada vez mais evidentes”, escreve Crooks.

Pressão dos biocombustíveis sobre preços de alimentos

O periódico britânico cita as “preocupações persistentes” sobre o redirecionamento do investimento agrícola da produção de alimentos para a produção de combustíveis, apesar de o Banco Mundial ter publicado um estudo em julho dizendo que os biocombustíveis exerceram um impacto reduzido na elevação dos preços de alimentos entre 2006 e 2008. A consequência disso é a intensificação das pesquisas por novas matérias-primas e processos; nos últimos anos, observa o texto, grandes grupos petrolíferos, como ExxonMobil, Royal Dutch Shell e BP, passaram a investir mais em P&D de biocombustíveis avançados.

Mesmo apostando mais em P&D de biocombustíveis de segunda geração, aponta Crooks, a Shell e a BP formaram parcerias com empresas brasileiras para explorar e aprimorar a produção de etanol de cana-de-açúcar. O jornal reconhece que, entre os biocombustíveis de primeira geração, o etanol de cana é o “mais barato e provavelmente o de menor impacto ambiental”.

O principal problema para a substituição de parte da matriz energética reside no fato de que as tecnologias de segunda geração ainda levarão anos para estar amplamente disponíveis no mercado, prevê o FT. Essa é a estimativa realista, pondera o jornal, apesar de muitas das empresas que desenvolvem biocombustíveis de segunda geração alegarem estar próximas do lançamento comercial de seus produtos. Para o jornal, previsões que pareciam confiáveis sobre a produção comercial frequentemente têm se mostrado otimistas em excesso. Um exemplo disso foi a recente redução das metas de consumo de biocombustíveis avançados por parte do governo dos Estados Unidos.

Revisão da meta de consumo nos EUA

Em 2007, os EUA adotaram uma série de metas para o consumo de etanol celulósico — feito a partir da gramínea switchgrass (nativa da América do Norte), de palha ou de resíduos de madeira — para os próximos anos. A oferta menor que a esperada, entretanto, obrigou o governo a diminuir a previsão: dos 100 milhões de galões (378,5 milhões de litros) estimados para 2010, os EUA esperam consumir neste ano apenas 6,5 milhões de galões (24,6 milhões de litros); dos 250 milhões de galões (946,2 milhões de litros) calculados para 2011, a expectativa caiu para no máximo 17,1 milhões (64,7 milhões de litros), destaca o Financial Times. Mesmo que o volume máximo para 2011 seja alcançado, calcula o repórter, ele representará apenas 0,1% do total de consumo de biocombustíveis do país, menos de 8% do total utilizado em transportes.

O jornal informa que poucas empresas devem fornecer etanol celulósico nos EUA a partir do próximo ano: a maior deverá ser a Fiberight, baseada em Maryland, seguida pela Agresti Biofuels, de Indiana, e AE Biofuels, da Califórnia. Para o jornal, a demora para a execução desses projetos, que há três anos representavam uma grande expectativa para o setor, demonstra o grau de dificuldade de se produzir biocombustíveis avançados em larga escala.

Nos EUA, a indústria de etanol de primeira geração também tem enfrentado dificuldades recentemente, em meio à volatilidade dos preços dos combustíveis e a cotação do milho, que em meados de 2010 alcançou o maior nível em mais de um ano, destaca a reportagem. Com isso, refinarias como a Valero aproveitaram a fraqueza do setor para comprar usinas de etanol por valores muito abaixo do custo.

Decisões nos próximos meses afetarão a indústria

Apesar de ainda contar com um “forte” apoio político nos EUA, a indústria de biocombustíveis vê seu futuro em jogo na expectativa de duas decisões que devem ser anunciadas nos próximos meses, afirma Crooks. São elas: a ampliação da mistura de etanol na gasolina, atualmente limitada a 10%, e a renovação do subsídio oferecido pelo governo de 45 centavos de dólar por galão de etanol. “Se essas decisões forem no sentido que a indústria quer, o consumo de biocombustíveis nos EUA continuará a crescer”, escreve o jornalista. No entanto, prossegue o texto, os novos combustíveis que substituirão o etanol de primeira geração e suprirão a demanda em longo prazo e com volume suficiente continuam sendo um “cenário distante”.

Fraldas

O FT informa que uma das mais novas ideias para criar combustíveis alternativos vem de uma empresa de engenharia baseada no Reino Unido, a Amec. A companhia está desenvolvendo um processo para transformar fraldas usadas e outros tipos de plásticos atualmente não reciclados em um tipo de diesel sintético. O projeto, que ainda está em fase inicial, além de fornecer uma alternativa para a geração de energia, ainda ajudaria a reduzir a produção desse tipo de lixo. Segundo o jornal, a Agência de Proteção Ambiental dos EUA calcula que 3,8 milhões de toneladas de fraldas foram descartadas em 2008, o que significa 1,5% do total de lixo produzido pelo país. “Infelizmente, o processo ainda está no estágio de testes, e histórias de outras tecnologias similares mostram que revelar possibilidades técnicas é muito diferente de provar sua viabilidade comercial”, conclui Crooks. (G.G.)

Reportagem do Portal Inovação Unicamp, publicada pelo EcoDebate, 23/09/2010

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