Obra da Transnordestina esbarra em protesto de quilombolas
Foto: Reprodução TV Globo
É que uma igreja de Custódia, com mais de 300 anos, está no caminho onde vai passar a ferrovia; moradores dizem que ossadas de antepassados estão enterradas no local
Uma comunidade descendente de escravos no Sertão do Estado se mobiliza para evitar que uma igreja seja destruída. É que ela está no caminho onde vai passar a ferrovia Transnordestina.
As obras, executadas pela construtora Odebrecht, já mudam a paisagem de Custódia, município localizado a 340 quilômetros do Recife. As máquinas estão preparando o terreno por onde passarão os trilhos.
No trecho que cruza a comunidade pobre, onde muitos são quilombolas, ou seja, descendentes de escravos, o trabalho esbarrou numa história com mais de três séculos. Uma pequena igreja que serve aos moradores terá de sair do local.
O traçado da ferrovia prevê que os trilhos passem exatamente no local onde hoje existe a igreja. O que os engenheiros não esperavam era encontrar tanta resistência por parte dos moradores do lugar.
Mas existe uma razão forte para isso. No entorno da igreja, mesmo sem haver a sinalização com cruzes, estão enterrados antepassados dos moradores. O agricultor José Roberto Né nasceu no lugar.
“Acho que eles deviam arrumar um jeito de desviar a linha e respeitar os nossos direitos e
tradições”, disse. Ele reconhece que a Transnordestina pode trazer progresso, mas, como sabe que os restos mortais dos bisavôs dele estão no local, não quer que o progresso chegue destruindo a memória da comunidade.
Seu Estácio tem 81 anos. É um dos mais velhos da comunidade conhecida também como
fazendinha. Os avôs dele foram enterrados perto da igreja. Para ele, a solução é simples. “É só desviar o caminho da ferrovia”, falou.
Arqueólogos da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) fizeram um trabalho no local. Eles escavaram junto á igreja e encontraram 19 ossadas, o que confirma a informação dos moradores.
Outra igreja, a um quilômetro de distância, foi erguida para substituir a antiga. Mas quem nasceu no local, como Marinês Veras, diz que a igreja nova não terá nunca a mesma importância. “Aqui está todo o nosso antepassado, meus filhos foram batizados aqui. Também quero que minhas filhas casem aqui. Quando estou na igreja eu me sinto em casa. A outra não vai significar nada para a gente”, contou.
A assessoria de comunicação da Transnordestina informou que quando foi identificada a
interferência do traçado da ferrovia com a igreja, foram levantados dados sobre a importância da capela para a comunidade e que os moradores não fizeram objeção a relocação da capela, assinando inclusive autorização para isso.
Em nota, a assessoria ressaltou ainda que não vai pôr abaixo a antiga igreja até que todo o processo sobre o caso esteja concluído. A primeira missa da nova igreja está programada para o próximo domingo, dia 22 de agosto.
PE360 GRAUS
Notícia do Blog Racismo Ambiental, socializada por Ruben Siqueira, CPT/BA
EcoDebate, 25/08/2010
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